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Vale do Anhangabaú
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¨ RASUL

Manoel da Nóbrega realizou a primeira missa num local próximo da aldeia de Inhapambuçu, chefiada por Tibiriçá fazendo cerca de 50 catecúmenos "entregues à doutrinação do irmão Antonio Rodrigues"
29/08/1553
2 fontes

1° fonte: “São Paulo foi fundada a 29 de agosto de 1553?”, Benedito Carneiro Bastos Barreto "Belmonte", jornal Folha de São Paulo
São Paulo, domingo, 24 de janeiro de 1943

A História do Brasil ainda está inçada de lacunas e obscuridades que, não poucas vezes, levam os próprios historiadores a cair no terreno arenoso das conjeturas e probabilidades. O enorme acervo documental, ainda inédito, existente nos arquivos brasileiros, portugueses, espanhóis, assim como o que se encontra em poder dos jesuítas — inacessível aos leigos— tem feito da nossa História uma obra inacabada e constantemente sujeita a corrigendas e alterações, algumas de caráter tão profundo que, muitas vezes, modificam radicalmente episódios tidos até então como incontestáveis e definitivos.

Acontece então que, pela ausência de uma documentação idônea, existente mas ignorada, surgem opiniões individuais perfilhadas por este ou aquele historiador a respeito de tais e tais acontecimentos mais ou menos importantes. E daí, como é fácil imaginar, se desencadeiam as controvérsias, em torneios que empolgam e que fascinam mas que, apesar de tudo, não resolvem nada. E, sobre o panorama impreciso de nossa História, permanecem as neblinas, que o calor das discussões não diluem, nem afasta.

Por exemplo: quando se fundou S. Paulo? Quem a fundou? Na escola nos ensinaram que foi a 25 de janeiro de 1554, pelo padre José de Anchieta.

Isso é o que se sabia nos tempos amáveis em que ainda íamos à escola. Mas, depois, surgiram da poeira dos arquivos, documentos que vieram alterar aquilo que se estabeleceu como coisa certa, definitiva e indiscutível. E viemos a saber, então, novidades sensacionais, entre as quais esta: Quem fundou S. Paulo foi Martim Afonso de Sousa.

Isto é, Martim Afonso fundou um povoado que foi uma espécie de prefácio de S. Paulo. Ou, explicando melhor: S. Paulo foi um prolongamento, uma continuação do burgo de Martim Afonso.

Depois de ter fundado S. Vicente, o fidalgo português subiu ao planalto e veio fundar, entre os índios que se situavam às margens do Tietê, em local onde hoje se acha o Bom Retiro, a povoação de Piratininga. Nos meus tempos de escola ninguém falava nesta Piratininga.

Nem hoje os livros escolares falam nela. E, todavia, Piratininga já existia em fins de 1532, pois a sesmaria de Pero Góes, lavrada por Pero Capico, é datada de Piratininga, a 12 de outubro daquele ano. E o famoso "Diário" de Pero Lopes, dedicado a D. João III, acentua categoricamente, narrando as façanhas do seu irmão Martim Afonso: "Fez vila na ilha de S. Vicente e outra nove léguas dentro pelo sertão, que se chama Piratininga". E acrescenta: "Aí foi a primeira povoação que nesta terra houve a tempo de Martim Afonso de Sousa".

Estas afirmações, como se vê, são definitivas.

Mas Manuel da Nóbrega, que aí também esteve, confirma, numa de suas famosas cartas: "... e do mar dez léguas pouco mais ou menos duas léguas de uma povoação de João Ramalho, que se chama Piratinim, onde Martim Afonso primeiros povoou"...

Parece não haver a menor dúvida sobre a existência de Piratininga antes da chegada dos doze loiolanos que vieram construir um centro de catequese na confluência do Anhangabaú e do Tamanduatí. Alí esteve Nóbrega doutrinando. Alí esteve João Ramalho comandando. E, ao contrário do que afirma Batista Pereira, Piratininga não mangrou. Depois de erguido o colégio e multiplicado o casario da colina, Piratininga ainda existia. Consultem-se as "Atas" da Câmara de S. Paulo, nos fins do Século XVI e princípios do XVII e lá se encontrarão referências a um "caminho de Piratininga".

Até aí está tudo muito bem. Martim Afonso fundou Piratininga ou, se preferem, povoou Piratininga. Porque, segundo a afirmação de Nóbrega, parte dos povoadores desceu para o litoral e parte ficou em Piratininga. O próprio Leonardo Nunes, escrevendo de S. Vicente em 24 de agosto de 1550, afirma: "... os cristãos que deixei derramados naquele lugar entre os índios"...

Todavia, o que aconteceu depois foi que Leonardo Nunes tirou esses cristãos de Piratininga e levou-os para a Borda do Campo, fundando aí a povoação de Santo André — segundo a afirmação de Tomé de Sousa. O que veio desfazer a ilusão de que fora João Ramalho o fundador da vila famosa. Ora, se os cristãos abandonaram Piratininga, deixando-a entregue aos índios, ficou decidido não mais se tomar conhecimento dela para efeitos históricos, a não ser como curiosidade para distração dos historiadores.

Mas o padre Serafim Leite, da Companhia de Jesus, historiador consencioso, a quem se deve a divulgação de notáveis documentos portugueses sobre a História de S.Paulo, divulga, na sua maravilhosa "História da Companhia de Jesús no Brasil", (tomo I, Livro III, cap. VI, 1º) uma carta de Manuel da Nóbrega, datada de 30 de agosto de 1553:

"Ontem, que foi dia da Degolação de S. João Batista, vindo a uma Aldeia onde se ajuntam novamente e apartam os que convertem e onde pus dois Irmãos para os doutrinar, fiz solenemente uns 50 catecúmenos, dos quais tenho boa esperança de que serão bons cristãos e merecerão o batismo e será mostrada por obras a fé que recebem agora. Eu vou adiante buscar alguns escolhidos, que Nosso Senhor terá entre este gentio; lá andarei até ter novas da Baía, dos Padres que creio serão vindos. Pero Correia foi adiante a denunciar penitência em remissão dos seus pecados".

E Serafim Leite acrescenta:

"Esta carta de Nóbrega é a certidão de idade de São Paulo".

Falando com a dupla responsabilidade de historiador e de jesuíta, Serafim Leite entende que a fundação de S. Paulo foi feita em Piratininga. Em verdade, quando Martim Afonso povoou a margem do Tietê, no campo de Piratininga, deu ao seu ato todas as solenidades essenciais. Pero Lopes de Sousa, irmão de Martim Afonso, faz da fundação um relato breve mas sugestivo:

"... fez vila na ilha de S. Vicente e outra, 9 léguas dentro pelo sertão, à borda de um rio, que se chama Piratininga; e repartiu a gente nestas duas vilas e fez nelas oficiais; e pôs tudo em boa ordem e justiça, de que a gente toda tomou muita consolação, com verem povoar vilas e ter leis e sacrifícios e celebrar matrimônios e viverem em comunicação das artes; e ser cada um senhor seu; e (in) vestir as injúrias particulares; e ter todos os outros bens da vida segura e conversável".

Como se vê, Piratininga foi fundada por Martim Afonso de Sousa, em 1532. Dia e mês continuam ignorados, sabendo-se apenas que o foi logo após a fundação de São Vicente. Nóbrega, na carta citada, passou a "certidão de idade" no dia 30 de agosto de 1553 e Serafim Leite dá a entender que a fundação data de 29 de agosto, com a conversão de 50 catecúmenos.

É forçoso não esquecer, todavia, que, antes desses 50 cristãos de Nóbrega, já existiam lá os cristãos de Martim Afonso ("... parte dos povoadores lá se deixou ficar"...) e os de Leonardo Nunes ("... os cristãos que deixei derramados naquele lugar"...). Não é possível, portanto, deixar de reconhecer a primazia de Martim Afonso na fundação de S. Paulo, embora com o nome de Piratininga. E como dissemos, embora Leonardo Nunes tivesse transportado os cristãos dessa aldeia para a Borda do Campo (outro problema: quem fundou Santo André? Leonardo Nunes ou João Ramalho?), apesar disso Piratininga continuou existindo. Nas "Atas" e no "Registro Geral" da Câmara de São Paulo encontram-se, até os princípios do século XVII referências ao povoado de Martim Afonso, onde, naturalmente, já não existiam oficiais, nem Câmara, nem pelourinho —pois tudo isso se achava então na colina do colégio— mas onde ainda moravam cristãos, como se prova, por exemplo, com uma dada de terras a Antonio Camacho, junto a João Maciel, em 1601.

Todavia, apesar de tudo isso, é difícil aceitar como "certidão de idade" a carta de Manuel da Nóbrega, e datar a fundação de São Paulo de 29 de agosto de 1553, pois S. Paulo só pode sobreviver e triunfalmente continuar, depois que a muralha da colina a salvou do arrasamento pelos bárbaros, que os mamelucos do planalto contra-atacaram e venceram. E se isso foi possível, devem-lo à visão de Nóbrega que situou a nova Piratininga em lugar estratégico e fez erguer a primeira casa da vila, a casa de doutrina, num ponto de onde nunca mais saiu, porque ela ainda hoje ali permanece, nos alicerces dos paredões que, até há 50 anos, eram a torre da igreja do Colégio. Para mim, pois, a "certidão de idade" de S. Paulo ainda está naquela carta de Anchieta, que diz assim:

"Aqui se fez uma casinha de palha com uma esteira de canas por portas...".

Texto originalmente publicado em suplemente da "Folha da Manhã": São Paulo, domingo, 24 de janeiro de 1943 - 2ª seção. Pesquisa: Banco de Dados da Folha de S. Paulo.



2° fonte: “O nascimento de São Paulo”, 02.05.2018. Eduardo Bueno
Não é o nascimento de São Paulo, são os nascimentos de São Paulo. São Paulo nasceu muitas vezes. Piratininga, a São Paulo dos tupiniquins, a São Paulo de Tibiriçá, pai de Bartira, esposa de João Ramalho.

Mas a cidade que ele criou, não deu em nada, a cidade que realmente viraria a São Paulo que não pode parar É a São Paulo dos jesuítas, né, foi fundada quando? 25 de janeiro de 1554. Porém, tudo se inicia antes, se inicia em 29 de agosto de 1553. Que é o dia da degolação de São João Batista, e por que São João Batista? E por que São Paulo?

Porque São Paulo cara, nasceu com mapa astral Os jesuítas calcularam cada minuto, cada instante que eles iriam criar aquela cidade. E além de tudo calcularam não só o momento, calcularam o local Por que São Paulo nasceu em um lugar de poder, Fân Shuei, que tu deve chamar de Feng Shui É a geomancia, são as linhas mágicas da natureza.

E o triângulo histórico onde São Paulo nasceu, era um lugar totalmente sacralizado pelos nativos que moravam lá, que era realmente um local de poder. E acima de tudo cara, era um ponto de convergência ou de divergência. De 5 incríveis trilhas históricas, trilhas pré-históricas Né, percorridas pelos indígenas.






Carta de Manoel da Nóbrega á Luís Gonçalves da Câmara: “Vou em frente procurar alguns escolhidos que Nosso Senhor terá entre esses gentios”
31/08/1553
1 fontes

1° fonte: Revista do Instituto Histórico e Geográfico de SP. Vol. LXXXVII
O rio terá sido, no entender de pesquisadores, a justificativa para a fundação do colégio jesuíta embrião da cidade anchietana. Ou seja, o começo do desbravamento. Está lá, na carta dirigida por Nóbrega ao Provincial da Ordem, o conselho para que insista junto a Martim Afonso quanto a transferência dos colonos deperecendo na Borda do Campo "aonde não havia peixe nem farinha" para que "se achegassem ao rio, (onde) teriam tudo a sossegariam".

Julgam alguns que tal rio fosse o Anhangabaú mas como pensar que um riacho na verdade fornecesse alimento para toda a população a ser transferida e mais a já existente? Antes de existir a vila paulistana, o Tietê levava e trazia os devassadores do sertão. É de 1551 a carta do irmão Pero Correia, descrevendo a viagem rio abaixo, com outros cinco irmãos a procura de um cristão asselvajado, indianizado.

E é de 31 de agosto de 1553 a carta de Nóbrega salientando a descida até Maniçoba, comboiado por um filho de João Ramalho. Abalou-se até para além de Araritaguaba.

Depois dessas, sabemos da ida do padre Anchieta em 1568 em missão muito simpática. Foi levar, em mãos, como exigia o favorecido, o perdão da justiça ao régulo Domingos Luiz Grou que a vila de São Paulo desejava ter dentro de seus muros para ajudar na sua defesa. Somente voltaria se o padre Anchieta fosse buscá-lo. Como se vê, já naquele tempo, poderosos usufruindo de prestígio gozavam de fortes regalias! Mas impõe-se-nos uma pergunta: se Grou fora homiziar-se naquelas paragens o fizera porque já, por ali, se navegava e morava. Mas, viagem mesmo, fazendo do leito do rio uma estrada, a primeira parece ser. [Página 29]






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