1° fonte: "O Romance do Prata" de Paulo Setúbal (Sabarabuçu, serra Sabarabussú)
Lopo de Albuquerque, estando a varar as cabeceiras do S. Francisco,
mandou erguer uma cruz de madeira no alto de certa lomba. Aconteceu que, ao
galgarem a serra, os escravos deram inopinadamente — "com hum grande e
alevantado padrão de pedra; derrubaram este padrão e se vio que debaicho delle
havia huma lage de pedra com esta inscripçào: Minas de prata que se descobrio
neste Logar no anno de 1614, que a seo tempo saberà S. Magestade dellas".
Minas de prata! As encantadas minas de Melchior Dias! Lopo de
Albuquerque, mais os negros, botou-se a romper alvoroçadamente aqueles chãos. E
eis que topa, aos primeiros golpes, com uma caixa de tijolos chapeada de ferro.
Arromba a tampa da caixa. Dentro, com o maior espanto, depara o sertanista um
velho papel embolorado. Nesse papel se declarava que, não longe dali, ficava uma
grande serra alterosa, coberta de matos copadissimos, onde estavam as minas. A
serra onde estavam as minas! Até que enfim, por obra daquele estonteante acaso,
iam surgir à luz do sol as escondidas riquezas do Caramuru. Lopo de Albuquerque
parte com ânsia em busca à serra alterosa. Alcança-a. Descobre o sítio indicado no
papel. Escava-o. E — deslumbrante realidade! — acha na entranha do morro os
primeiros veios da tão sonhada prata...
"Lopo de Albuquerque tirou então as amostras da prata; deu conta dellas a
S. Magestade; e S. Magestade lhe respondeo, pello seo secretàrio, Mendo de
Forjaz, que rompesse as minas". E acrescenta o cronista, textualmente, esta
afirmativa categórica: "D. João de Alencastro vyu essa prata; e eu a vy tambem..."
Lopo de Albuquerque, com alguns escravos de confiança, saiu a romper as
minas como determinara o Rei. Mas...— Cuidado, Lopo Albuquerque, cuidado! Todos os que, até hoje, tentaram
desvendar a prata que o mato esconde, morreram. Não escapou um só!
... mas o feliz achador das minas, ao atravessar um cerradão de aroeiras, é
subitamente picado por estranho bicho. Picada funesta! De nada valeram sangrias,
nem mezinhas, nem ervas de bugre. "... dous dias antes de chegar, Lopo de
Albuquerque falleceu da mordedura daquelle bicho pessonhento".
Outra morte! Outra desgraça! Outra vítima da malfadada prata! E quem
poderia, jà agora, topar de novo, na serra alterosa, com os escondidos veios?
Um filho de Lopo, Francisco de Albuquerque, rapazola verdolengo, ainda
nas primícias da adolescência, tomou corajosamente a peito o levar avante o
desvendamento das minas. Decisão inútil! O destino, aquele destino implacàvel que
perseguia com tamanha fereza os profanadores da prata, cortou-lhe cerce o ímpeto
animoso: Francisco, num assomo de cólera, assassinou desastradamente o escravo
que lhe servia de guia. Era este escravo, por fatalidade, o único vivente que sabia do sitio onde ficavam as minas. "... tinha Francisco um crioulo seo escravo, que havia acompanhado o Pay e sabia a Serra e o buraco da prata. Pretendeo Francisco que o crioulo lhe foce mostrar; mas duvidou o negro fazello sem que o senhor primeiro lhe desse a promessa de libertar. Apaixonou-se tanto Francisco Albuquerque que, inconsideradamente, lhe atirou a espingarda e o mattou; ficou assim sem aquelle escravo, e, o que é o mais, sem guia para aquella empreza..." [p.19]