1° fonte: Fisionomia da cidade: Sorocaba – cotidiano e desenvolvimento urbano – 1890-1943, 2008. Rogério Lopes Pinheiro de Carvalho
Porém, todos esses projetos acabaram não se realizando e a cidade ainda teria que esperar alguns anos por esses melhoramentos. O fiasco teve até um episódio pitoresco protagonizado, é claro, por Labourdenne, quando este para não perder a concessão da construção das linhas de bondes, monta uma verdadeira mise-en-scène, simulando o início das obras e a colocação dos primeiros trilhos para os bondes. Apesar de não ficar claro, certamente tratava-se de um linha de bondes a tração animal. A imprensa local, sem suspeitar de nada, registrava o episódio:
Ante hontem, as 9 horas da manhã, o dr. Pierre Labourdenne de Saint Julian, concessionário das linhas de bondes, neste município, procedeu á inauguração das mesmas começando pelo fim da rua do Hospital [atual Álvaro Soares], em frente á oficina da Sorocabana, o assentamento de trilhos, cujo primeiro cravo, foi batido pelo sr. Tenente João Batista Fontoura, vice presidente em exercício da presidência da Intendência Municipal, colocando-se também nessa ocasião o primeiro poste da linha
telefônica.
Achavam-se presentes muitos cavalheiros e o trabalho foi dirigido pelo hábil engenheiro dr. Ernesto Rodrigues Chaves, Presidente da Cooperativa de Industria e Comercio.
A bitola adaptada para os bondes é de um metro entre trilhos, o que trará, já para a condução de cargas, já para a de passageiros, grandes vantagens e comodidades.
Disse-nos, o sr. Dr. Labourdenne que já estão dadas as providencias para que continuem as obras no maior curto praso.
Finda a cerimônia, o sr, dr. Labourdenne fez servir aos seus convidados um laito e bem servido almoço no conhecido Hotel Brasileiro, manifestando-se então mais uma vez a sincera e franca jovialidade de caracter daquele amável cavalheiro.
Ao champanhe ergueram-se diversos brindes, entre os quais do diretor desta folha ao sr. Labourdenne pelo progresso desta cidade.
(…) Concluindo, felicitamos ao ilustre concessionário, fazendo votos pela prosperidade da empreza, que será também a de Sorocaba. [Diário de Sorocaba, 12/07/1891. Apud: GASPAR, Antonio Francisco. Sorocaba de ontem: crônicas da cidade. 1954. pp. 225-226.]
Como se pode depreender, Labourdenne engabelou não apenas o redator do Diário como também autoridades gradas da cidade. Não é sem razão que o historiador Aluísio de Almeida arremate todo o ocorrido de maneira irônica: “e houve gente para tomar um regabofe com ele.” [ALMEIDA, Aluísio. História de Sorocaba. Folha Popular, 01/04/1954.]
Interessante notar a defesa que o jornal de Maneco Januário faz em favor de toda essa movimentação de capitais e construção de novas empresas que marcaram o período do Encilhamento. Em julho de 1890, num artigo de fundo intitulado “Emprego de capitais”, um colaborador do jornal pondera a opinião daqueles que criticam a “febre de emprezas” e pedem mais prudência, mas coloca:
Até quando nos está reservada a posição de espectativa que, por demorada, torna-se ridícula? O Brazil já não é um paiz de hontem; depois o conjuncto de acontecimentos dos últimos tempos, e sobre tudo o golpe decisivo mudou os destinos da pátria, mostram claramente que já não vivemos nos tempos em que as responsabilidades contrahidas por partes interessados, não passavam de meras ficções para caçar o compromettimento de uns em proveito de outros.
Sem exagerar no excesso de otimismo, o articulista, salienta que se tratava de uma nova era que se abria a todas as atividades, mas especificamente das indústrias. Assim, “Derivada, pois, de um acontecimento ainda maior, a evolução da industria, do trabalho e da iniciativa, que actualmente se nota, não é mais que a reacção contra a inactividade em que sempre sepultou-se uma nação tam rica de elementos de vida e prosperidade.” [ Diário de Sorocaba, 19/07/1890;]