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Cassiano Ricardo Leite
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Antepassados - Descendentes


Análise do discurso geográfico (representações espaciais) nas obras Martim Cererê (1928) e Marcha para oeste (1940) de Cassiano Ricardo; O Estrangeiro (1926) e Geografia sentimental (1937) de Plínio Salgado
01/01/201809/09/2025 12:31:39

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      2018
Análise do discurso geográfico (representações espaciais) nas obras Ma...
Atualizado em 09/09/2025 12:31:39
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preenchido por pressupostos ideológicos do autor enquanto indivíduo, mas tambémpertencente a um grupo social que almejava pensar o nacional. Entendemos o discursocientífico também como uma forma ideológica de enxergar o mundo, compartilhada porum grupo em comum.A imagem e o conceito concernem num sentido mais amplo. A geografiaamorosa e a geografia punitiva têm seu sentido apenas no interior da lógica discursivado autor. Formam um signo que utilizam a mesma imagem (o espaço geográfico),porém com conceitos diferentes. Assim sendo, jamais podemos separar o signo da suaprodução e contexto social, do contrário estaríamos modificando sua natureza semiótica.E isso seria cometer um erro analítico terrível, afinal, entendemos que os sentidos se dãoatravés da interação social e não de maneira arbitrária.São Paulo como espaço central no Brasil: HinterlandO uso de certas palavras para definir uma situação, um lugar ou uma cidade érecorrente na literatura de Salgado. Dentro dessa lógica, percebemos várias referênciasdo autor a São Paulo como a hinterland do Brasil. Antes de prosseguirmos com aanálise, precisamos entender o significado desse termo.A palavra hinterland é conhecida desde o início do século XX. Sua definiçãonão é padronizada e, tanto na literatura acadêmica quanto em estudos dos profissionaisdo mercado financeiro, ela sofre modificações essenciais de sentido. Em geografiaurbana, é uma área portuária interligada por várias redes de transporte, concentrandouma grande atividade comercial. No entanto, também podemos dizer que a palavra éusada para as cidades não portuárias, mas com um grande potencial econômico que selocalizam no interior dos países. Débora Assumpção e Lima (2015, p.99) definihinterland,[...] primeiramente como sertão: um espaço para a expansão, incorporaçãoaos fluxos econômicos ou a uma esfera de poder que ainda lhe escapa. Emmovimento do (des) conhecido foge a própria expansão da fronteira, já queos movimentos de incorporação são planejados, seguindo dialogicamente osmovimentos da franja pioneira, do movimento de incorporação econsolidação do mercado de terras como descrito por Monbeig. A marchapara oeste foi um marco para a expansão da fronteira agrícola [...] [p. 88]Para Plínio o sertão (oeste) do Brasil deveria ser cultivado como a unidade purado verdadeiro espírito nacional. São Paulo teria o papel de convergir para si o “melhordo país” (os costumes, os modos de vida, as crenças) e transformá-lo no nacionalismobandeirante. Ele usa a figura histórica do bandeirante paulista para canalizar seudiscurso racial em torno de uma aura mítica, “foi, de certo, escutando o saci que osbandeirantes caminharam. E o panorama foi se desdobrando, desdobrando [...] era ummistério sem fim.” (1937, p.16). O espaço geográfico de São Paulo criaria um culto aoherói, vinculado e adaptado ao meio no qual está inserido. Este personagem aparece noensaio como um ser encarnado nas forças da natureza, sua narrativa confronta o mundoreal e o mundo fantástico. A interiorização do país teria sido através do pensamentomágico42.Ora, se no ensaio Salgado buscava uma comunhão entre as “geografias” doBrasil, por que ele ainda colocava São Paulo como a principal unidade cultural do país?E nesse momento que destacamos duas contradições em seu discurso: a primeira, decaráter narrativo, em que ele descreve várias regiões usando aspectos sentimentais parainterpretá-las, afirmando ser essencial conhecer os espaços geográficos nacionais. Noentanto, ele anula as junções históricas na construção desta identidade. Já o segundocontrassenso diz respeito à valorização do sul, em especial São Paulo, na formação daunidade nacional. Embora o autor fosse contra o cosmopolitismo, enobrece a forteeconomia da cidade e de seu poder transformador de raças,No Brasil é tudo instável. Em São Paulo, por exemplo, a Pátria Brasileiramistura-se na confusão unificadora do tipo futuro. Por isso, em nossasviagens por estradas de ferro, as diferenciações evidenciadas são feiçõesapenas econômicas no tocante aos agrupamentos, porém, são profundas noconfronto dos homens. (1937, p.49, grifo nosso).O termo sublinhado acima nos permite pensar muita coisa. Esse “tipo futuro”poderia ser os novos brasileiros, produto da interação entre todas as regiões e, inclusive,dos estrangeiros, na nova dinâmica nacional. As tradições seriam preservadas, mas ainevitável miscigenação dos povos favoreceria o surgimento de uma nova população.Só uma cidade teria força para sustentar essa ideia, no caso, São Paulo.42 Em Visão do Paraíso, Sergio Buarque de Holanda reconstrói a história do território mítico brasileiro aodemonstrar o mito da conquista como fator imagético a uma “Geografia Fantástica”, afirmando que aexpansão territorial brasileira se deu pela procura do Éden perdido. (HOLANDA, 1994, p.108). [p. 89]A confluência dos comboios na estação da luz [...] Quem quiser ter aimpressão de São Paulo, avizinhe-se dos trens que chegam do seu tumultuosointerior. A algaravia dos colonos: italianos, espanhóis, portugueses, lituanos,balcânicos; a prosa dos nossos caboclos; tipos queimados do sol que vieramda terra virgem de poeira fina, que enodoa, pregando-se a epiderme, fixandose nos cabelos endurecidos, porque a terra brasileira se agarra com a volúpiaagressiva de um amor de mulher. (SALGADO, 1937, p.51)Novamente o trem é usado como metáfora do progresso. Agora ele carregaria asnovas culturas que se mesclariam com a brasileira, novos povos, todos direcionados ahinterland nacional, “[...] o percurso do trem pelo nosso hinterland. Nas estações osesperam em festas. As moças vêm ver o comboio que leva rapazes; os rapazes vêm veras moças.” (SALGADO, 1937, p.55).O paulista teria força enquanto descendente do bandeirante que se miscigenou ese adaptou ao peculiar meio físico do planalto. Esse tipo social carregaria um idioma,entretanto, não na maneira de falar, mas sim no tipo de trabalho que exerce. Porexemplo, para os paulistas de Ribeirão Preto, ou das zonas dos cafezais em Sorocabanaaté o Paranapanema, o idioma seria o café. Já outras regiões falariam o idioma doalgodão, do gado e do fumo. Essas atividades estariam relacionadas à cultura dasdiversas regiões de São Paulo, não apenas da capital, e todas têm um ponto em comum:são atividades econômicas. A dimensão ideológica de Salgado estaria no personagemprincipal de sua narrativa, e na principal ação econômica que ele considerava basilarpara a sociedade brasileira: o fazendeiro e a fazenda.Como consequência histórica do bandeirante, o fazendeiro seria o indivíduoorganicamente moldado ao espaço geográfico paulista. E dentro das funções exercidaspor alguns grupos na unidade nacional, Plínio proporcionaria a esse protagonista umafunção, “plantador de cidades”.A mentalidade, a consciência, a sensibilidade do fazendeiro de café divergemdas características do estancieiro criador, ou o homem das pequenas glebasde policultura. [...] ele é o desbravador de sertões, do plantador de cidadesnos extremos limites de Mato Grosso ou Paraná. (1937, p.50).Logo, em uma espécie de cronologia determinada, o paulista se formaria comotipo humano regional a partir,Do caboclo que pegou o machado e foi ver o bugre. O italiano foi no rastro ecultivou as cidades que estavam plantadas. O paulista inventou umaagricultura, plantador de cidades. As sementes de cidades estão embornal. [p. 90]Derruba-se o mato, faz uma cova, joga-se a semente: a cidade nasce. Depoisé só cuidar dela. As locomotivas, vagões, gondolas, fios telegráficos, autocaminhões, carroças, carroceiros, carregadores, gente suada, formigas quevem da fazenda até Santos, nos braços líquidos de Bertioga, abertos para aHinterland. (SALGADO, 1937, p.82-83).A paisagem que se vai tecendo no imaginário do leitor é a de que São Paulo seencarregaria além de expandir o país para oeste, também de produzir uma novasociedade, modelo a ser seguido pelas outras regiões. Recontaria a história do Brasil apartir da sua própria.Nesse contexto, para o autor a Hinterland brasileira conteria em si a contradiçãoe a mudança necessárias para consolidar a nação. A narrativa do ensaio sugere umaviagem pelas diversas “geografias” do país, tendo como parada final a cidade de SãoPaulo. O discurso do autor na obra analisada transfigura-se na autoconsciência dosproblemas sociais que estavam ocorrendo na década de 1930 e subjuga a história comoconstrutora de sentidos nacionais. O espaço geográfico é representado como sujeito nodiálogo com os personagens, porém vazio de teor crítico.A visão harmônica salgadiana da geografia se transformou em pressupostosirracionais e ilegítimos, uma vez que recortou o Brasil a partir de estruturas físicas ehumanas. A natureza romantizada preservaria a imobilidade de alguns valores sociaisintrínsecos ao modo de vida: o paulista conquista, o nordestino protege, o cariocafesteja, etc. Segundo Chasin (1978), o nacionalismo de Salgado esconde suas reaisintenções: implantar um modelo político extremamente autoritário. Diante disso, emGeografia Sentimental percebemos a construção de metáforas e discursos indiretoscomo mecanismos retóricos, uma vez que o gênero literário de ensaio permitiu ao autorse aproximar do seu leitor, transmitindo toda sua ideologia. [p. 91]

de Morgan, que fornece a base argumentativa para Engels; este último, lido por tantospensadores franceses, alemães e inglese, influenciou outros de sua geração, num efeitoem cadeia espalhando seu pensamento para além do seu tempo.O paradigma social/bandeirante criado por Cassiano alicerçou-se em três núcleosde complexidade: a família, o clã patriarcal e a bandeira e, sempre, a dimensãogeográfica seria o planalto do Piratininga. Para o autor, o espaço representado noperíodo colonial caracterizar-se-ia anamórfico, ou seja, ainda deformado por serdesconhecido.Contudo, o colonizador ao desembarcar em terras incógnitas, perceberia aexistência de vida no litoral e, posteriormente, no planalto, sublinhando a importânciado indígena na construção do espaço brasileiro.

Ora, quando chegou o descobridor, já os tupis haviam descido os platôsbolivianos, à procura do país das palmeiras. Cabia-lhes (aos tupis) ‘umatarefa colossal: da caaguaçu boliviana deveriam alcançar, para além doAnhembi, o grande mar oriental, juntando-se a gente irmã que, certamente, jáse haveria estabelecido na costa’. A toponímia da antiga Capitania de SãoVicente é ‘gritantemente tupi-guarani’, como diz Plínio Airosa. O nomeguaianá, na opinião de Teodoro Sampaio, designaria apenas um ramo da raçatupi, porque, de fato, do tupi eram a arte e o vocabulário escrito por Anchietae porque os nomes dos chefes e principais entre esses índios e bem assim osdas localidades a região por eles ocupadas todos procedem desta língua. RICARDO, 1970, p.07)

A construção do espaço geográfico a partir da interação dos grupos sociais coma natureza alinha-se bastante com o discurso geográfico na obra já analisada MartimCererê. Notamos a tentativa ainda sutil do autor em descrever o convívio harmônicoentre o europeu e o indígena, início da suposta “democracia racial brasileira”. Paratanto, com o intuito de legitimar seu discurso como científico, o autor cita PlínioAyrosa, primeiro professor titular da Cadeira de Etnografia e Língua Tupi-Guarani daFaculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo.

No excerto acima, o discurso de Ricardo centraliza-se na figura indígena e ésustentado por uma narrativa acadêmica, não mais literária. As unidades geográficasdescritas por ele são: a planície, planalto e os platôs bolivianos. E a relação litoral/sertãorepresentaria o atrito dos poderes entre a influência da coroa portuguesa no litoral e a“autonomia democrática” do sertão. Para ele, um marco na história brasileira seria oencontro da cultura portuguesa/europeia com os nativos “da terra”, “[...] os homens dooceano trazendo uma organização social aristocrática e os homens da terra em estado [p.; 125]

social primitivo, comunista” (1970, p.8). Vemos a ideia de Morgan reaparecernovamente nessa pequena citação.

Em um enfoque geográfico, o autor salienta “quatro fases bandeirantes deconquista da hinterland”: 1532: Martim Afonso resolve subir ao planalto, oitocentosmetros de altitude de São Vicente; 1550: Santo André da Borba do Campo; 1554: SãoPaulo do Piratininga e Sant’Ana do Parnaíba. Assim como em Geografia Sentimental,de Plínio Salgado, o autor utiliza-se do termo hinterland para atribuir a umadeterminada cidade o qualificativo estratégico frente ao contexto nacional.

Outrossim, estas três ultimas cidades abririam as portas do sertão para odesenvolvimento civilizacional do interior. Vias de acesso foram utilizadas para essapenetração, como, por exemplo, o rio Tietê devido ao seu fluxo contínuo rumo oeste. Afixação de tais grupos humanos, com seus aglomerados, depende principalmente domeio físico e, nessa ambiência natural, a sociedade mergulha em raízes profundas devinculo com o solo. É como se houvesse em cada cidade erguida no planalto um miniestado autogerido e autossuficiente.

O Estado de São Paulo atrairia novas frentes pioneiras para si, como se fosse umímã para diferentes povos. O autor de Martim Cererê teria essa perspectiva social tãoforte que descreve minuciosamente os deslocamentos populacionais de outras regiõespara o planalto do Piratininga, materializando estes dados em um mapa temático:Só de 1936 a 1939 s transportam 120.000 trabalhadores agrícolas do interiorbaiano para S.Paulo. De Minas Gerais chegam 56.000; de Alagoas 22.000; dePernambuco, 8.000 (postas as migrações em números redondos). Em 1952,segundo os Estados de procedência, assim falam as estatísticas: do Acre 3;Amazonas 12; Pará 50; Maranhão 72; Piauí 2.625; Ceará, 15.105; RioGrande do Norte, 728; Paraíba, 3.167[...]. (RICARDO, 1959, p.385) [p. 126]

existencial dos tipos humanos regionais se modificaria, ou seja, a sociedade estariavinculada ao meio. Na obra de Salgado, há uma crítica constante a crescenteurbanização e a racionalização das cidades, sobretudo São Paulo. Salientamos aquantidade significativa de imagens em cada página do livro. Não excluímos tal pontode nossa análise e chegamos à conclusão de que essas imagens faziam parte do discursodo autor em construir um cenário manipulado no imaginário do leitor. Em Geografiasentimental o autor deixa transparecer seu posicionamento quanto à relação espaçogeográfico/homem, pois considera que o segundo (homem) seja submisso ao primeiro(geográfico). Fechamos esse livro com a ideia de que o discurso geográfico teria umpapel fundamental para as aspirações de Salgado. Isso porque este discurso traria adiscussão das singularidades regionais de um país continental, introduzindo napsicologia do individuo o sentimento orgânico com o solo. Pontuamos aqui uma crítica.O livro de Plínio detém uma narrativa atraente e de fácil compreensão, no entantototalmente a-histórica. O vinculo orgânico com o solo não era sustentado por raízespassadas, mas sim por paisagens romantizadas. E isso, ao nosso ver, faz jus a umnacionalismo anacrônico e perigoso.Marcha para oeste (1940), de Cassiano Ricardo, foi sem dúvida a análise maistrabalhosa. Percebemos nesse volumoso livro a intenção de Ricardo em recontar ahistória do Brasil a partir da figura do bandeirante paulista. É importante destacarmostambém que, ao contrário de Geografia sentimental, o ensaio de Ricardo traz umadiscussão mais calcada em dados e fontes primárias de investigação. Percebemos que oautor tentou rever a cultura bandeirante sob uma perspectiva histórica, sociológica e,sobretudo, geográfica, uma vez que a união desses três recortes metodológicosjustificava um Estado (paulista), uma raça (bandeirante) e um meio (Planalto: sertão).Chamou-nos a atenção nesse livro a quantidade significativa de vezes que Ricardoevoca o trabalho Pionniers e planteurs de São Paulo, do geógrafo Pierre Monbeig. Issoé um indicativo forte das ideias científicas e literárias estarem alinhadas a um mesmoplano compreensivo. Percebemos a forte tentativa do autor em justificar a formação dasociedade do planalto como um padrão verdadeiro da “democracia racial brasileira”.Outro ponto que nos aguçou a curiosidade foi a constante utilização da palavrahinterland, dividindo em quatro fases bandeirantes a conquista deste hinterland: 1532-Martim Afonso, 1550-Santo André da Borba do Campo, 1554- São Paulo do Piratininga [p. 138]



  


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