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4363O sertão primordial e o grande confronto. Por Gustavo Maia Gomes, economista, em inteligencia.insightnet.com.br (data da consulta) 29370Cristóvão Colombo. Por Daniel Neves Silva, em mundoeducacao.uol.com.br (data da consulta) No dia 12 de outubro de 1492, os espanhóis chegaram à região das Antilhas, mas não sem grande tensão. A viagem estendeu-se por mais tempo que Colombo havia imaginado, e, para conter o ânimo dos marinheiros, ele manteve dois registros das distâncias percorridas. O registro falso contava com distâncias menores do que de fato foram percorridas. De toda forma, a hipótese de retornar à Espanha se terra não fosse encontrada foi manifestada durante a viagem. No entanto, os espanhóis avistaram uma ilha que atualmente faz parte das Bahamas. Os nativos chamavam-na de Guanahani, mas Colombo nomeou-a San Salvador. Os historiadores não têm certeza de qual ilha efetivamente seja. Durante essa viagem, Colombo também chegou à ilha onde hoje fica o Haiti e a República Dominicana, nomeando-a Hispaniola. O contato com os nativos foi pacífico, mas Colombo já havia demonstrado em seus registros o interesse em escravizá-los. Ele também sequestrou alguns deles para levá-los como demonstração aos reis espanhóis. Colombo acreditou ter chegado à Ásia, e por isso chamou os nativos de “índios”. Ele permaneceu com essa ideia até o fim de sua vida. Somente décadas depois é que os europeus conseguiram confirmar que se tratava de um novo continente. Entretanto, ao longo de sua vida, Colombo negou-se a perceber os indícios que demonstravam isso. Durante sua estada em Hispaniola, a embarcação Santa María naufragou. Colombo então formou um assentamento espanhol chamado Navidad, deixou dezenas de homens nele e retornou para a Espanha na Niña. Durante o retorno, ele encontrou a Pinta, embarcação comandada Martín Pinzón, que confirmou ter encontrado ouro. Em 14 de março de 1493, Colombo chegou à Espanha, sendo recebido com grandes homenagens.
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29350*REVISTA DO ARQUIVO MUNICIPAL Aliás, cabe assinalar que Nóbrega não levava muito a sério a doutrinação dos índios do planalto. Em carta anterior, datada de 15 de junho de 1553, afirmava com todas as letras que só se ocuparia na conversão desses índios, enquanto estivesse impedido de se internar em definitivo no sertão (LEITE, v.1, p. 496). Na hipótese de ser verdade que foram os índios os únicos responsáveis pela escolha do lugar de sua nova aldeia no planalto – local esse depois plenamente aceito e ratificado pelos jesuítas, podemos supor – fica mais fácil compreender o grande acerto com que desempenharam tal missão. Com efeito, na condição de silvícolas planaltinos, profundamente familiarizados com a região, eram eles os mais capacitados para determinar o ponto mais favorável para a criação de um novo povoado. Por uma questão de sobrevivência, só poderiam decidir-se por um local em acrópole (o que parece ter sido uma tradição entre os nossos índios antigos), próximo de rios piscosos e de trilhas que os poriam em fácil comunicação terrestre com pontos estratégicos ocupados por aldeias amigas. 24428*“Os Tupi de Piratininga: Acolhida, resistência e colaboração”. Benedito Antônio Genofre Prezia, PUC-SP Mesmo alguns considerados de nobre estirpe, como o genovês Paulo Dias Adorno, não se comportou dignamente, tendo que fugir para a Bahia com um certo Affonso Rodrigues, “por um homizio [homicídio] que lá fizeram [em São Vicente]”. Igual expediente lançou mão Brás Cubas, fundador de Santos e um dos portugueses mais ricos da terra. Fugira para Portugal, “por cosas mal hechas en esta tierra siendo capitán”, como registrou Nóbrega. Entre falcatruas cometidas, são elencados roubo de terras, de escravos e de vacas de Pero Correia, que os havia destinado à manutenção das crianças indígenas da casa de São Vicente. Os jesuítas aceitaram fazer um acordo, pois ele não tinha bens suficientes para pagar uma dívida de 2.600 ducados. Devolveu os escravos e entregou as 10 vacas, reconciliando-se com os jesuítas, que afirmaram que era “mejor uno com paz que 30 com contienda”. 25850*Historia da Companhia de Jesus no Brasil. Serafim Soares Leite (1890-1969) Ainda em vida do P. Leonardo Nunes se avançou na direção do sul. Iniciou ele próprio viagens, indo recolher umas senhoras naufragadas no Rio dos Patos. Fora a pedido de Tomé de Sousa, estava para lá no dia 10 de março de 1553, e já tinha voltado a 15 de junho. Neste dia, escreve Nóbrega que estão todos de saúde, "salvo Leonardo Nunes, que veio muito doente do Rio dos Patos, aonde foi buscar umas senhoras Castelhanas, a pedido do Governador".
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20766*"O Romance do Prata" de Paulo Setúbal (Sabarabuçu, serra Sabarabussú) Lopo de Albuquerque, estando a varar as cabeceiras do S. Francisco, mandou erguer uma cruz de madeira no alto de certa lomba. Aconteceu que, ao galgarem a serra, os escravos deram inopinadamente — "com hum grande e alevantado padrão de pedra; derrubaram este padrão e se vio que debaicho delle havia huma lage de pedra com esta inscripçào: Minas de prata que se descobrio neste Logar no anno de 1614, que a seo tempo saberà S. Magestade dellas". Minas de prata! As encantadas minas de Melchior Dias! Lopo de Albuquerque, mais os negros, botou-se a romper alvoroçadamente aqueles chãos. E eis que topa, aos primeiros golpes, com uma caixa de tijolos chapeada de ferro. Arromba a tampa da caixa. Dentro, com o maior espanto, depara o sertanista um velho papel embolorado. Nesse papel se declarava que, não longe dali, ficava uma grande serra alterosa, coberta de matos copadissimos, onde estavam as minas. A serra onde estavam as minas! Até que enfim, por obra daquele estonteante acaso, iam surgir à luz do sol as escondidas riquezas do Caramuru. Lopo de Albuquerque parte com ânsia em busca à serra alterosa. Alcança-a. Descobre o sítio indicado no papel. Escava-o. E — deslumbrante realidade! — acha na entranha do morro os primeiros veios da tão sonhada prata... "Lopo de Albuquerque tirou então as amostras da prata; deu conta dellas a S. Magestade; e S. Magestade lhe respondeo, pello seo secretàrio, Mendo de Forjaz, que rompesse as minas". E acrescenta o cronista, textualmente, esta afirmativa categórica: "D. João de Alencastro vyu essa prata; e eu a vy tambem..." Lopo de Albuquerque, com alguns escravos de confiança, saiu a romper as minas como determinara o Rei. Mas...— Cuidado, Lopo Albuquerque, cuidado! Todos os que, até hoje, tentaram desvendar a prata que o mato esconde, morreram. Não escapou um só! ... mas o feliz achador das minas, ao atravessar um cerradão de aroeiras, é subitamente picado por estranho bicho. Picada funesta! De nada valeram sangrias, nem mezinhas, nem ervas de bugre. "... dous dias antes de chegar, Lopo de Albuquerque falleceu da mordedura daquelle bicho pessonhento". Outra morte! Outra desgraça! Outra vítima da malfadada prata! E quem poderia, jà agora, topar de novo, na serra alterosa, com os escondidos veios? Um filho de Lopo, Francisco de Albuquerque, rapazola verdolengo, ainda nas primícias da adolescência, tomou corajosamente a peito o levar avante o desvendamento das minas. Decisão inútil! O destino, aquele destino implacàvel que perseguia com tamanha fereza os profanadores da prata, cortou-lhe cerce o ímpeto animoso: Francisco, num assomo de cólera, assassinou desastradamente o escravo que lhe servia de guia. Era este escravo, por fatalidade, o único vivente que sabia do sitio onde ficavam as minas. "... tinha Francisco um crioulo seo escravo, que havia acompanhado o Pay e sabia a Serra e o buraco da prata. Pretendeo Francisco que o crioulo lhe foce mostrar; mas duvidou o negro fazello sem que o senhor primeiro lhe desse a promessa de libertar. Apaixonou-se tanto Francisco Albuquerque que, inconsideradamente, lhe atirou a espingarda e o mattou; ficou assim sem aquelle escravo, e, o que é o mais, sem guia para aquella empreza..." [p.19]
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24592*Revista trimestral do Insituto Histórico e Geografico Lopo de Albuquerque, estando a varar as cabeceiras do S. Francisco, mandou erguer uma cruz de madeira no alto de certa lomba. Aconteceu que, ao galgarem a serra, os escravos deram inopinadamente — "com hum grande e alevantado padrão de pedra; derrubaram este padrão e se vio que debaicho delle havia huma lage de pedra com esta inscripçào: Minas de prata que se descobrio neste Logar no anno de 1614, que a seo tempo saberà S. Magestade dellas". Minas de prata! As encantadas minas de Melchior Dias! Lopo de Albuquerque, mais os negros, botou-se a romper alvoroçadamente aqueles chãos. E eis que topa, aos primeiros golpes, com uma caixa de tijolos chapeada de ferro. Arromba a tampa da caixa. Dentro, com o maior espanto, depara o sertanista um velho papel embolorado. Nesse papel se declarava que, não longe dali, ficava uma grande serra alterosa, coberta de matos copadissimos, onde estavam as minas. A serra onde estavam as minas! Até que enfim, por obra daquele estonteante acaso, iam surgir à luz do sol as escondidas riquezas do Caramuru. Lopo de Albuquerque parte com ânsia em busca à serra alterosa. Alcança-a. Descobre o sítio indicado no papel. Escava-o. E — deslumbrante realidade! — acha na entranha do morro os primeiros veios da tão sonhada prata... "Lopo de Albuquerque tirou então as amostras da prata; deu conta dellas a S. Magestade; e S. Magestade lhe respondeo, pello seo secretàrio, Mendo de Forjaz, que rompesse as minas". E acrescenta o cronista, textualmente, esta afirmativa categórica: "D. João de Alencastro vyu essa prata; e eu a vy tambem..." Lopo de Albuquerque, com alguns escravos de confiança, saiu a romper as minas como determinara o Rei. Mas...— Cuidado, Lopo Albuquerque, cuidado! Todos os que, até hoje, tentaram desvendar a prata que o mato esconde, morreram. Não escapou um só! ... mas o feliz achador das minas, ao atravessar um cerradão de aroeiras, é subitamente picado por estranho bicho. Picada funesta! De nada valeram sangrias, nem mezinhas, nem ervas de bugre. "... dous dias antes de chegar, Lopo de Albuquerque falleceu da mordedura daquelle bicho pessonhento". Outra morte! Outra desgraça! Outra vítima da malfadada prata! E quem poderia, jà agora, topar de novo, na serra alterosa, com os escondidos veios? Um filho de Lopo, Francisco de Albuquerque, rapazola verdolengo, ainda nas primícias da adolescência, tomou corajosamente a peito o levar avante o desvendamento das minas. Decisão inútil! O destino, aquele destino implacàvel que perseguia com tamanha fereza os profanadores da prata, cortou-lhe cerce o ímpeto animoso: Francisco, num assomo de cólera, assassinou desastradamente o escravo que lhe servia de guia. Era este escravo, por fatalidade, o único vivente que sabia do sitio onde ficavam as minas. "... tinha Francisco um crioulo seo escravo, que havia acompanhado o Pay e sabia a Serra e o buraco da prata. Pretendeo Francisco que o crioulo lhe foce mostrar; mas duvidou o negro fazello sem que o senhor primeiro lhe desse a promessa de libertar. Apaixonou-se tanto Francisco Albuquerque que, inconsideradamente, lhe atirou a espingarda e o mattou; ficou assim sem aquelle escravo, e, o que é o mais, sem guia para aquella empreza..." [p.19] 3553*Os Amaral Gurgel: Família, poder e violência na América portuguesa (c. 1600 – c. 1725) Lopo de Albuquerque, estando a varar as cabeceiras do S. Francisco, mandou erguer uma cruz de madeira no alto de certa lomba. Aconteceu que, ao galgarem a serra, os escravos deram inopinadamente — "com hum grande e alevantado padrão de pedra; derrubaram este padrão e se vio que debaicho delle havia huma lage de pedra com esta inscripçào: Minas de prata que se descobrio neste Logar no anno de 1614, que a seo tempo saberà S. Magestade dellas". Minas de prata! As encantadas minas de Melchior Dias! Lopo de Albuquerque, mais os negros, botou-se a romper alvoroçadamente aqueles chãos. E eis que topa, aos primeiros golpes, com uma caixa de tijolos chapeada de ferro. Arromba a tampa da caixa. Dentro, com o maior espanto, depara o sertanista um velho papel embolorado. Nesse papel se declarava que, não longe dali, ficava uma grande serra alterosa, coberta de matos copadissimos, onde estavam as minas. A serra onde estavam as minas! Até que enfim, por obra daquele estonteante acaso, iam surgir à luz do sol as escondidas riquezas do Caramuru. Lopo de Albuquerque parte com ânsia em busca à serra alterosa. Alcança-a. Descobre o sítio indicado no papel. Escava-o. E — deslumbrante realidade! — acha na entranha do morro os primeiros veios da tão sonhada prata... "Lopo de Albuquerque tirou então as amostras da prata; deu conta dellas a S. Magestade; e S. Magestade lhe respondeo, pello seo secretàrio, Mendo de Forjaz, que rompesse as minas". E acrescenta o cronista, textualmente, esta afirmativa categórica: "D. João de Alencastro vyu essa prata; e eu a vy tambem..." Lopo de Albuquerque, com alguns escravos de confiança, saiu a romper as minas como determinara o Rei. Mas...— Cuidado, Lopo Albuquerque, cuidado! Todos os que, até hoje, tentaram desvendar a prata que o mato esconde, morreram. Não escapou um só! ... mas o feliz achador das minas, ao atravessar um cerradão de aroeiras, é subitamente picado por estranho bicho. Picada funesta! De nada valeram sangrias, nem mezinhas, nem ervas de bugre. "... dous dias antes de chegar, Lopo de Albuquerque falleceu da mordedura daquelle bicho pessonhento". Outra morte! Outra desgraça! Outra vítima da malfadada prata! E quem poderia, jà agora, topar de novo, na serra alterosa, com os escondidos veios? Um filho de Lopo, Francisco de Albuquerque, rapazola verdolengo, ainda nas primícias da adolescência, tomou corajosamente a peito o levar avante o desvendamento das minas. Decisão inútil! O destino, aquele destino implacàvel que perseguia com tamanha fereza os profanadores da prata, cortou-lhe cerce o ímpeto animoso: Francisco, num assomo de cólera, assassinou desastradamente o escravo que lhe servia de guia. Era este escravo, por fatalidade, o único vivente que sabia do sitio onde ficavam as minas. "... tinha Francisco um crioulo seo escravo, que havia acompanhado o Pay e sabia a Serra e o buraco da prata. Pretendeo Francisco que o crioulo lhe foce mostrar; mas duvidou o negro fazello sem que o senhor primeiro lhe desse a promessa de libertar. Apaixonou-se tanto Francisco Albuquerque que, inconsideradamente, lhe atirou a espingarda e o mattou; ficou assim sem aquelle escravo, e, o que é o mais, sem guia para aquella empreza..." [p.19] 24677*Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro Antes da publicação destes bandos, tinham os vereadores de São Paulo recebido uma carta de Salvador Correia de Sá (...) pedem informações á camara de São Paulo, sobre o atroz homícidio de um mineiro, e várias ações criminais, que diziam cometera nestas capitanias de São Vicente e Itanhaém, o provedor da fazenda real Pedro de Sousa Pereira. A esta carta responderam os vereadores paulistas em 18 de dezembro de 1660, dizendo, que o mineiro, casualmente se arrojara na profunda caverna de uma cata, indo a saltar de um lado para outro, na parte superior, sem que pessoa alguma concorresse para a sua morte. [Páginas 47 e 48] 28389*“Entre a sombra e o sol. A Revolta da Cachaça, a freguesia de São Gonçalo e a crise política fluminense (Rio de Janeiro, 1640-1667)”. Antonio Filipe Pereira Caetano De volta à vila de São Paulo, os revoltosos fluminenses até que tentaram alertar os paulistas sobre os males causados pela administração de Salvador de Sá, quando em 16 de novembro de 1660 escreveram aos vizinhos: são tantos os apertos, ou para melhor dizer, as tiranias, com que o mau governo de Salvador Correia de Sá e Benavides e seus parentes tem oprimido a toda a esta capitania, que não podendo já suportá -los (por mais o intentou), se resolveu a nobreza, clero e povo, unânimes e conformes a deitar de si carga, com que já não podia, fiados na justificação ante as razões pés de Sua Majestade das causas que tiveram e os moveram, em que se fundamentaram para depor ao dito Salvador Correia de Sá e Benavides (...) Por trás da tentativa de alerta, os fluminenses visavam, além do esclarecimento sobre a morte do mineiro Jayme Commere, angariar o apoio dos paulistas frente ao domínio do luso-espanhol na repartição sul. Um mês e dois dias depois, a resposta dos paulistas deixaria os camareiros fluminenses perplexos: em razão do general Salvador Correia de Sá nosso Governador, experimentamos tanto pelo contrário as mau fundadas queixar desse povo, que com todos os desse povo, que com todos os dessa capitania juntos e não deverão parte do muito que as estranham a novidade do sucesso, a que vos mercês devem acudir com remédio, para que Sua Majestade fique melhor servido, e nós não faltaremos a obrigação que temos de seus leais vassalos. O apoio dos paulistas a Salvador de Sá para os fluminenses não correspondia aos acontecimentos de 1640, quando governador da repartição sul ficou ao lado dos eclesiásticos nas restrições à escravização dos negros da terra. No entanto, o posicionamento dos paulistas relacionava-se muito mais aos benefícios imediatos empreendidos pelo governador nas regiões mineradoras, que se encontravam listadas na carta que a câmara da vila de São Paulo escreveu a Salvador Correia de Sá declarando seu apoio: (...) grandes benefícios nas estradas, nas passagens do rio na observância da justiça, tendo-se nestas capitanias o que parecia impossível em tão breve tempo, sobretudo a V.S. mandado fazer a estrada do mar de que posso mandar carros por elas, cortando serras, e passar por onde uma pessoa passava mal (...), onde fizeram mais de setenta pontes, obra que ainda é aos que a fizeram lhes parecem impossível.
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24677*Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro Antes da publicação destes bandos, tinham os vereadores de São Paulo recebido uma carta de Salvador Correia de Sá (...) pedem informações á camara de São Paulo, sobre o atroz homícidio de um mineiro, e várias ações criminais, que diziam cometera nestas capitanias de São Vicente e Itanhaém, o provedor da fazenda real Pedro de Sousa Pereira. A esta carta responderam os vereadores paulistas em 18 de dezembro de 1660, dizendo, que o mineiro, casualmente se arrojara na profunda caverna de uma cata, indo a saltar de um lado para outro, na parte superior, sem que pessoa alguma concorresse para a sua morte. [Páginas 47 e 48]
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26478*Relatório de Antonio Paes Sande (1622-1695) Relatório do Governador Antonio Paes de Sande, em que se indica as causas do malogro das pesquisas das minas do Sul e propõe o alvitre para se obter de uma maneira segura o seu descobrimento "A fama das minas de ouro e prata de Pernaguá, Itabanhana e Serra de Sabarabussú, despertou o cuidado e aplicação para se descobrirem anda no tempo do domínio de Castela. Ultimamente S.M., que Deus guarde, com despezas consideráveis de sua Real Fazenda procurou o descobrimento e entabolamento destas minas, mandando para este efeito a Dom Rodrigo de Castelbranco, que as não pode ou não soube descobrir. A minha curiosidade (quando lhe não queiram chamar zelo) procurou em diversos tempos e ocasiões investigar a causa de não conseguir-se este descobrimento das minas, que prometia tão grandes interesses a esta Coroa, valendo-me nas vezes que estive na Baya e no Reyno da notícia de algumas pessoas práticas, que m`a podiam dar dar descobrimentos antigos e modernos. Afirmaram todos que havia as minas que se procuravam descobrir e entabolar, mas que se não achavam, nem se haviam de descobrir pelos meios que se haviam até agora aplicado, por não serem proporcionados para se conseguir o fim que se desejava, Posso depor, que achando-me na Baya ao tempo que Dom Rodrigo de Castelbranco havia entrado a fazer o seu descobrimento (antes do sucesso) afirmaram algumas pessoas práticas, que era impossível conseguir o intento (com a experiência que mostrou) pelas manifestas contradições, de meios, desordens e disposições. A primeira contradição era, que mal pode descobrir a entabolar minas, que não sabe o que ela são, que os sujeitos que até agora se haviam escolhido para estes descobrimentos não tinham ciência algumas delas. A prata das Índias se beneficia por diversas faculdades, desde que em um certo cerro se acha a mina, até que a prata que nela há, o venha a ser, porque uns nativos (ou brancos que os imitam) não tem mais ofício que buscá-las; outros depois de achadas, seguir as betas e penetrar os estados que mais ou menos profundamente seguram serem reais; outros metem o cabedal naquela mina que se lhe achou ou comprou ou pediu ao administrador geral; outros tem os engenhos donde se mói a pedra a outros finalmente temperam a mesma pedra depois de moída e lhe aplicam os ingredientes com que (conforme espécie e qualidade que ela é) tem mostrado a experiência se une menos vagarosamente o açougue, funde com mais facilidade o metal, no que é necessário delicadíssimo tanto, porque por qualquer falta, se perdem muitas vezes grandes cabedais no erro do temperamento. Dom Rodrigo de Castelbranco nunca nas Índias foi escrutador ou bruxula (como os Indios) das minas pelos cerros; nunca foi mineiro, nem seguiu bestas ou profundou estados; nunca foi senhor de minas, nem teve ofício de temperar a pedra moída, se falava em alguns termos, era pelos ouvir e não pelos praticar, e assim como no Brazil há tantos senhores de engenhos e nenhum dele sabe como se tempera o açúcar das canas que nele moem, e se o quisessem fazer se perderam, e todavia falam como se entendessem da arte, assim Dom Francisco ainda que tivera engenho nas Índias, nem por isso era descobridor de minas, penetrador de betas, nem temperador de prata; não é pequena contradição do intento encarregar o efeito a quem não se sabe ser causa eficiente, nem ainda instrumental dele. A segunda contradição era a Infantaria que levava esse homem, porque ou fosse para se introduzir e obedecer, se os Paulistas o não quisessem admitir, ou para autoridade de sua pessoa, execução de suas ordens, ou para o acompanharem no sertão. Se para se introduzir e fazer obedecer, no caso que os Paulistas o repugnem, nem 100 vezes 50 soldados que levava, o poderiam meter na Vila de São Paulo, porque os serros a defendem por todas as partes, seus moradores de grande valor e constância em causa pública, e todos na última desesperaçam são inconquistáveis; e como o nome de infantaria para eles é abominável, e introduzida esta primeira, poderem ter entre si a disposição de toda a mais, seria muito para temer que a não deixem subir á serra, e ir á Vila; e se para autoridade de sua pessoa e execução de suas ordens, com a mesma Infantaria se impossibilita o intento, porque quanto é maior a autoridade que se funda em levar soldados, é maior o escrúpulo daqueles por cuja causa os levam, e deste lhe pode nascer desconfiança de se considerarem dominados, quando todo o estudo dos Paulistas é a conservação de sua liberdade. Se para o acompanharem ao sertão até á serra de Sabarabussú, não tem para isso préstimo infantaria alguma do Brazil, não sendo Paulistas, como a experiência tem mostrado, e supondo-se que não ouve repugnância com os nativos a Sabarabussú, e é impossível conseguir-se a jornada, ou hão de ir são menos 40 Paulistas com eles para os conduzir a aquela serra, o que se não poderá conseguir sem temor grande, que o receio de se considerarem escravos dessa mesma Infantaria, e dos estragos que ao futuro poderão fazer em suas famílias e crédito, os cabos, oficiais e soldados, que necessariamente hão de presidiar aquela praça, se se descobrirem as minas, disponhão secretamente os meios de se não acharem. Muitas outras razões ouvi praticar, mostrando com elas ser quase impossível descobrirem-se estas minas pelos meios que se até agora para este efeito se haviam aplicado, que deixo de referir, por chegar ao meio, que este discurso oferece pelo mais eficaz e o único para se poderem descobrir e entabolar as minas desejadas, mostrando primeiro as razões em que se funda. Está a Vila de São Paulo (cuja área é capaz de se fundar nela uma populosíssima cidade) na eminência de um plano pouco desigual do campo que em circunferência domina, por uma parte a todo o alcance de vista, e por outra a multidão de vários serros, que ao longe lhe formão horizonte. Duvida-de se os grãos de ouro, que em todo ele se acham são abalados dos mesmos serros pelas águas nativas, que deles se despenhão, se descobertos pelas chuvas, donde separadamente se criam. É o campo ameníssimo, retalhado de diversas ribeiras, e principalmente de um rio, de cujas margens se tira o ouro, que chamam de "lavagem". Dista esta vila da de Santos (que é o porto mais frequente daquela costa) 12 léguas, a maior parte delas por caminhos a que dão lugar algumas serras menores até se chegar ao pé da que chamam Paranapiaçaba, a qual é altíssima, e quase inacessível por uma breve estreiteza que os rochedos deixam escassamente ao trânsito de uma só pessoa atrás de outra. Do cume dela se estende aquele campo até á Vila de São Paulo, que por esta causa é naturavelmente inconquistável. A excelência do clima, dos ares e do temperamento se infere bem de não haver até hoje ali médico algum. Tem todas as flores, frutas, legumes e pão, que há em Portugal, e no Brazil em grande abundância, por a terra ser fecundíssima, só o vinho não chega a ser perfeito, mas são perfeitíssimas as carnes de todas as espécies; de maneira que produz aquela região tudo o que a natureza humana pode apetecer para o sustento e para o regalo; assim como as influências dela geram ouro nos serros, e nas áreas de que se tira, parece geram também nos homens os espíritos generosos que neles há, porque todos são briosos, valentes, impacientes de menor injúria, ambiciosos de honra, amantíssimos da sua prátia, benéficos aos forasteiros, e adversíssimos a todo o ato servil, pois até aqueles, cuja muita pobreza, lhe não permite ter quem o sirva, se sujeita antes a andar muitos anos pelo sertão em busca de quem o sirva, do que a servir a outrem um só dia. Há muitos de grossos cabedais para aquelas partes, e não poucas famílias bastantemente nobres, e ainda que entre si tragam inimizades particulares, todos se unem para a conservação da sua república. As mulheres são formosas e varonis, e é costume ali deixarem seus maridos á sua disposição o governo das casas e das fazendas, para que são industriosas, e inclinadas a casar antes suas filhas com estranhos que as autorizem, que com naturais que as igualem. Os filhos primeiro sabem a língua do gentio, do que aprendem a materna, são de gentil índole e gênio para as campanhas, e para as escolas, engenhosos para tudo, e todos saem do berço com a doutrina de conservação da sua liberdade, cujos ciúmes dão a seus pais as minas de ouro e prata que ocultam, e as quais de quantas diligências se tem mandado fazer por descobri-las. E finalmente a vila de São Paulo digníssima de se verificar nela o célebre vaticínio do grande padre José de Anchieta, que ha ela de ser metrópole do Brazil, e parece que não tem para isso mais adequadas disposições, que as do meio que logo se apontará, pois é certo que não pode subir aquele auge com a ruína, se não com o aumento de seus habitadores. Sendo pois esta a natureza e o estudo destes homens, considerando eles (como se ha ouvido praticar a muitos deles) que se as minas reais da prata e ouro se descobrirem, necessariamente se ha de mandar (Governador ou Vice-Rey para aquelas Capitanias, meter nelas presídios para a sua segurança, multiplicar-lhe tributos, que hão de ficar as suas casas expostas ao descrédito, que tem padecido muitas nos estragos que costumam fazer os cabos e os soldados, que o governo quase livre que tinham da sua republica ha de ser sujeito; que donde mandavam, hão de ser mandados, que os não deixarão ir ao sertão, ou se forem lhe hão de tirar os nativos para as minas, que toda a sua utilidade destas ha de ser ruína de suas pessoas, casas, e famílias; e que aquelas terras que seus antepassados povoaram, e seus descendentes foram descobrindo, e multiplicando tão numerosas vilas com tanto trabalho seu, aumento da fazenda real do Estado, hão de ser agora prêmio dos estranhos sem merecimento, e terem seu netos por remuneração do que tinham merecido seus progenitores, ficarem quase escravos dos que hão de ir dominar; bem se infere que para se conservarem no estado presente, e evitarem aquele dano futuro, hão de dispor as industrias de se não descobrir a preciosidade daquelas minas. Evidente prova é deste receio o sucesso que teve D. Francisco de Souza, quando foi aquela Capitania, pois acompanhando os Paulistas ao mineiro que mandou á serra de Sabarabussú, para saberem a parte donde ela ocultava as minas, depois de achadas, de que se fez aviso ao dito D. Francisco, e tiradas muitas cargas de pedra, que o mineiro trazia com grande contentamento, ponderando eles a mesma escravidão, que agora temem seus netos, mataram no caminho ao mineiro, e esconderam a pedra, disseram a D. Francisco que morrera no caminho, e se enganava no que havia escrito a S. Senhoria, de que resultou morrer o dito D. Francisco em breves dias e se perpetuar a suspensão daquelas minas, a tradição de haver muito ricas, e ainda há poucos anos algumas pessoas que existiam na Villa de S. Paulo davam notícia da prata que se fundio das cargas de pedra (...)" 29399Fogo em Borba Gato reacende debate sobre o que fazer com monumentos contestados, vejasp.abril.com.br Relatório do Governador Antonio Paes de Sande, em que se indica as causas do malogro das pesquisas das minas do Sul e propõe o alvitre para se obter de uma maneira segura o seu descobrimento "A fama das minas de ouro e prata de Pernaguá, Itabanhana e Serra de Sabarabussú, despertou o cuidado e aplicação para se descobrirem anda no tempo do domínio de Castela. Ultimamente S.M., que Deus guarde, com despezas consideráveis de sua Real Fazenda procurou o descobrimento e entabolamento destas minas, mandando para este efeito a Dom Rodrigo de Castelbranco, que as não pode ou não soube descobrir. A minha curiosidade (quando lhe não queiram chamar zelo) procurou em diversos tempos e ocasiões investigar a causa de não conseguir-se este descobrimento das minas, que prometia tão grandes interesses a esta Coroa, valendo-me nas vezes que estive na Baya e no Reyno da notícia de algumas pessoas práticas, que m`a podiam dar dar descobrimentos antigos e modernos. Afirmaram todos que havia as minas que se procuravam descobrir e entabolar, mas que se não achavam, nem se haviam de descobrir pelos meios que se haviam até agora aplicado, por não serem proporcionados para se conseguir o fim que se desejava, Posso depor, que achando-me na Baya ao tempo que Dom Rodrigo de Castelbranco havia entrado a fazer o seu descobrimento (antes do sucesso) afirmaram algumas pessoas práticas, que era impossível conseguir o intento (com a experiência que mostrou) pelas manifestas contradições, de meios, desordens e disposições. A primeira contradição era, que mal pode descobrir a entabolar minas, que não sabe o que ela são, que os sujeitos que até agora se haviam escolhido para estes descobrimentos não tinham ciência algumas delas. A prata das Índias se beneficia por diversas faculdades, desde que em um certo cerro se acha a mina, até que a prata que nela há, o venha a ser, porque uns nativos (ou brancos que os imitam) não tem mais ofício que buscá-las; outros depois de achadas, seguir as betas e penetrar os estados que mais ou menos profundamente seguram serem reais; outros metem o cabedal naquela mina que se lhe achou ou comprou ou pediu ao administrador geral; outros tem os engenhos donde se mói a pedra a outros finalmente temperam a mesma pedra depois de moída e lhe aplicam os ingredientes com que (conforme espécie e qualidade que ela é) tem mostrado a experiência se une menos vagarosamente o açougue, funde com mais facilidade o metal, no que é necessário delicadíssimo tanto, porque por qualquer falta, se perdem muitas vezes grandes cabedais no erro do temperamento. Dom Rodrigo de Castelbranco nunca nas Índias foi escrutador ou bruxula (como os Indios) das minas pelos cerros; nunca foi mineiro, nem seguiu bestas ou profundou estados; nunca foi senhor de minas, nem teve ofício de temperar a pedra moída, se falava em alguns termos, era pelos ouvir e não pelos praticar, e assim como no Brazil há tantos senhores de engenhos e nenhum dele sabe como se tempera o açúcar das canas que nele moem, e se o quisessem fazer se perderam, e todavia falam como se entendessem da arte, assim Dom Francisco ainda que tivera engenho nas Índias, nem por isso era descobridor de minas, penetrador de betas, nem temperador de prata; não é pequena contradição do intento encarregar o efeito a quem não se sabe ser causa eficiente, nem ainda instrumental dele. A segunda contradição era a Infantaria que levava esse homem, porque ou fosse para se introduzir e obedecer, se os Paulistas o não quisessem admitir, ou para autoridade de sua pessoa, execução de suas ordens, ou para o acompanharem no sertão. Se para se introduzir e fazer obedecer, no caso que os Paulistas o repugnem, nem 100 vezes 50 soldados que levava, o poderiam meter na Vila de São Paulo, porque os serros a defendem por todas as partes, seus moradores de grande valor e constância em causa pública, e todos na última desesperaçam são inconquistáveis; e como o nome de infantaria para eles é abominável, e introduzida esta primeira, poderem ter entre si a disposição de toda a mais, seria muito para temer que a não deixem subir á serra, e ir á Vila; e se para autoridade de sua pessoa e execução de suas ordens, com a mesma Infantaria se impossibilita o intento, porque quanto é maior a autoridade que se funda em levar soldados, é maior o escrúpulo daqueles por cuja causa os levam, e deste lhe pode nascer desconfiança de se considerarem dominados, quando todo o estudo dos Paulistas é a conservação de sua liberdade. Se para o acompanharem ao sertão até á serra de Sabarabussú, não tem para isso préstimo infantaria alguma do Brazil, não sendo Paulistas, como a experiência tem mostrado, e supondo-se que não ouve repugnância com os nativos a Sabarabussú, e é impossível conseguir-se a jornada, ou hão de ir são menos 40 Paulistas com eles para os conduzir a aquela serra, o que se não poderá conseguir sem temor grande, que o receio de se considerarem escravos dessa mesma Infantaria, e dos estragos que ao futuro poderão fazer em suas famílias e crédito, os cabos, oficiais e soldados, que necessariamente hão de presidiar aquela praça, se se descobrirem as minas, disponhão secretamente os meios de se não acharem. Muitas outras razões ouvi praticar, mostrando com elas ser quase impossível descobrirem-se estas minas pelos meios que se até agora para este efeito se haviam aplicado, que deixo de referir, por chegar ao meio, que este discurso oferece pelo mais eficaz e o único para se poderem descobrir e entabolar as minas desejadas, mostrando primeiro as razões em que se funda. Está a Vila de São Paulo (cuja área é capaz de se fundar nela uma populosíssima cidade) na eminência de um plano pouco desigual do campo que em circunferência domina, por uma parte a todo o alcance de vista, e por outra a multidão de vários serros, que ao longe lhe formão horizonte. Duvida-de se os grãos de ouro, que em todo ele se acham são abalados dos mesmos serros pelas águas nativas, que deles se despenhão, se descobertos pelas chuvas, donde separadamente se criam. É o campo ameníssimo, retalhado de diversas ribeiras, e principalmente de um rio, de cujas margens se tira o ouro, que chamam de "lavagem". Dista esta vila da de Santos (que é o porto mais frequente daquela costa) 12 léguas, a maior parte delas por caminhos a que dão lugar algumas serras menores até se chegar ao pé da que chamam Paranapiaçaba, a qual é altíssima, e quase inacessível por uma breve estreiteza que os rochedos deixam escassamente ao trânsito de uma só pessoa atrás de outra. Do cume dela se estende aquele campo até á Vila de São Paulo, que por esta causa é naturavelmente inconquistável. A excelência do clima, dos ares e do temperamento se infere bem de não haver até hoje ali médico algum. Tem todas as flores, frutas, legumes e pão, que há em Portugal, e no Brazil em grande abundância, por a terra ser fecundíssima, só o vinho não chega a ser perfeito, mas são perfeitíssimas as carnes de todas as espécies; de maneira que produz aquela região tudo o que a natureza humana pode apetecer para o sustento e para o regalo; assim como as influências dela geram ouro nos serros, e nas áreas de que se tira, parece geram também nos homens os espíritos generosos que neles há, porque todos são briosos, valentes, impacientes de menor injúria, ambiciosos de honra, amantíssimos da sua prátia, benéficos aos forasteiros, e adversíssimos a todo o ato servil, pois até aqueles, cuja muita pobreza, lhe não permite ter quem o sirva, se sujeita antes a andar muitos anos pelo sertão em busca de quem o sirva, do que a servir a outrem um só dia. Há muitos de grossos cabedais para aquelas partes, e não poucas famílias bastantemente nobres, e ainda que entre si tragam inimizades particulares, todos se unem para a conservação da sua república. As mulheres são formosas e varonis, e é costume ali deixarem seus maridos á sua disposição o governo das casas e das fazendas, para que são industriosas, e inclinadas a casar antes suas filhas com estranhos que as autorizem, que com naturais que as igualem. Os filhos primeiro sabem a língua do gentio, do que aprendem a materna, são de gentil índole e gênio para as campanhas, e para as escolas, engenhosos para tudo, e todos saem do berço com a doutrina de conservação da sua liberdade, cujos ciúmes dão a seus pais as minas de ouro e prata que ocultam, e as quais de quantas diligências se tem mandado fazer por descobri-las. E finalmente a vila de São Paulo digníssima de se verificar nela o célebre vaticínio do grande padre José de Anchieta, que ha ela de ser metrópole do Brazil, e parece que não tem para isso mais adequadas disposições, que as do meio que logo se apontará, pois é certo que não pode subir aquele auge com a ruína, se não com o aumento de seus habitadores. Sendo pois esta a natureza e o estudo destes homens, considerando eles (como se ha ouvido praticar a muitos deles) que se as minas reais da prata e ouro se descobrirem, necessariamente se ha de mandar (Governador ou Vice-Rey para aquelas Capitanias, meter nelas presídios para a sua segurança, multiplicar-lhe tributos, que hão de ficar as suas casas expostas ao descrédito, que tem padecido muitas nos estragos que costumam fazer os cabos e os soldados, que o governo quase livre que tinham da sua republica ha de ser sujeito; que donde mandavam, hão de ser mandados, que os não deixarão ir ao sertão, ou se forem lhe hão de tirar os nativos para as minas, que toda a sua utilidade destas ha de ser ruína de suas pessoas, casas, e famílias; e que aquelas terras que seus antepassados povoaram, e seus descendentes foram descobrindo, e multiplicando tão numerosas vilas com tanto trabalho seu, aumento da fazenda real do Estado, hão de ser agora prêmio dos estranhos sem merecimento, e terem seu netos por remuneração do que tinham merecido seus progenitores, ficarem quase escravos dos que hão de ir dominar; bem se infere que para se conservarem no estado presente, e evitarem aquele dano futuro, hão de dispor as industrias de se não descobrir a preciosidade daquelas minas. Evidente prova é deste receio o sucesso que teve D. Francisco de Souza, quando foi aquela Capitania, pois acompanhando os Paulistas ao mineiro que mandou á serra de Sabarabussú, para saberem a parte donde ela ocultava as minas, depois de achadas, de que se fez aviso ao dito D. Francisco, e tiradas muitas cargas de pedra, que o mineiro trazia com grande contentamento, ponderando eles a mesma escravidão, que agora temem seus netos, mataram no caminho ao mineiro, e esconderam a pedra, disseram a D. Francisco que morrera no caminho, e se enganava no que havia escrito a S. Senhoria, de que resultou morrer o dito D. Francisco em breves dias e se perpetuar a suspensão daquelas minas, a tradição de haver muito ricas, e ainda há poucos anos algumas pessoas que existiam na Villa de S. Paulo davam notícia da prata que se fundio das cargas de pedra (...)" 20766*"O Romance do Prata" de Paulo Setúbal (Sabarabuçu, serra Sabarabussú) Dia 28 de julho de 1682 Manuel de Borba Gato num impeto, em pleno sertão, assassina tresloucadamente, diante dos dois séquitos pasmados, o enviado de confiança do Príncipe! Não podia acontecer, na jornada à Sabarabuçu, acontecimento mais arrepiador. Tinha ali um epílogo de sangue, e, mais do que epílogo de sangue, finalizava-se em crime de lesa-majestade, a retumbante entrada do caçador de esmeraldas junto aos índios, contacta-o a fim obter informações pertinentes à localização de novas minas. Borba Gato, “tomado de violento ardor, defere-lhe um violento empuxão”. O bandeirante precipita Castelo Branco num sumidouro, num buraco de mina. Em julho de 1682, Rodrigo de Castelo Branco, desembarcara no Brasil. Ele era Superintendente-Geral das Minas e, ciente da experiência do bandeirante paulista Manuel de Borba Gato junto aos índios, contacta-o a fim obter informações pertinentes à localização de novas minas. Borba Gato, “tomado de violento ardor, defere-lhe um violento empuxão”. O bandeirante precipita Castelo Branco num sumidouro, num buraco de mina. [Wikipedia] D. Rodrigo de Castel Blanco està em São Paulo e lá só tinha uma meta: Sabarabuçu! Para tal, fazendo vir das vilas convizinhas os homens de melhor conselho e de maior experiência, homens anciões e de respeito, bota-se D. Rodrigo com eles a "discernir e rumiar as condições, e tempo mais conveniente, para se pôr em execução a jornada ao cerro da Sabarabussú, no descobrimento da prata" (e do ouro). E isso, là dizem pitorescamente as atas da Câmara para que de nenhuma maneira haja de aver falta nem estrovo em se conseguir a jornada de Sabarabussú". E a fim de não aver falta nem estrovo, a Câmara de Taubaté, muito generosamente, apressa-se em oferecer índios seus, a fim de irem plantando roças pelo caminho — "para com fasseledade se conseguir o descubrimento da prata". Mas houve em São Paulo absurda animosidade contra o pràtico de Itabaiana (...). Alardeava aos quatro ventos, com muito e jactancioso palavriado, os seus merecimentos e as suas sabenças. Os de S. Paulo, gente rústica, de pouca fala, enlurados naquele burgo de além-serra, ouviam desconfiados a mentira presunçosa. Detestavam-no. Demais (e aqui, doía-lhes aos paulistas este ponto) eles, os de S. Paulo, ao se "espernearem" por essas serranias afora, à frente de suas bandeiras, là iam à custa do seu bolso, arruinando as próprias fazendas, sem pesarem de uma só placa ao tesouro de el-Rei. D. Rodrigo estava determinado a encontrar Sabarabuçu, ali estava, vivendo como um senhor dom fidalgo, com os custos da jornada largamente pagos, e, por cima, a abocanhar do eràrio reinol a enormidade de seiscentos mil réis. Além de tais larguezas, agora, para se ir à Sabarabuçu, mandalhe ainda o Príncipe abonar, como ajuda, mais a gorda tença de quarenta mil réis! Aquilo assombrava e irava os de São Paulo. Ao mesmo tempo, num contraste gritante, là, pelas tredas matarias dos Cataguazes, hà sete anos jà, padecendo misérias sobre misérias, suportando desgraças e ruínas inenarràveis, dizimado, abandonado, estropeado, desbaratado, mandando vender, para se sustentar, as últimas jóias das filhas, Fernão Dias Paes Leme andava a romper com heroísmos tràgicos, desesperadamente, aquelas serranias bàrbaras onde se acoutavam as esmeraldas e a prata. D. Rodrigo, que era indiferente às esmeraldas e as buscas de bandeirantes, vai com os seus seiscentos e quarenta mil réis, aprestando sossegadamente a sua bandeira. Apresta-a. E ei-lo afinal pronto. Um dia, com muito negro e muito bugre, cargueiros e cargueiros atopetados de mantimentos, o velho mineiro Álvares Coutinho numa rede, carregado a ombro, D. Rodrigo de Castel Blanco lança grandiosamente os seus homens na trilha do caçador de esmeraldas. Vai, tal como o potentado paulista, por aquelas negrejantes rechàs de além-Mantiqueira buscar a nebulosa, a terrível mas sempre fascinante serra branca da prata. Sabarabuçu! Sabarabuçu! E a bandeira abalou. Subitamente chega a notícia, na vilota de São Paulo, estrondeja: Fernão Dias Paes Leme topara com as esmeraldas! Não topara o destemeroso cabo com a tão buscada Sabarabuçu, e nem com a tão buscada prata, é bem verdade. Mas topara com as esmeraldas. Sim, là por aqueles cerradões ermos dos Cataguazes, o velho rompedor-de-mato descobrira enfim as pedras verdes! Descobrira-as à beira da lagoa Vapabuçu. Descobrira-as, apanhara a terçã, e, por fatalidade, morrera subitamente da febre ruim. O filho do bandeirante, Garcia Paes, ao receber do pai moribundo as esmeraldas, botara-as num saquinho de chamalote, e mandara-o com muito lamento a D. Rodrigo. Quê? A D. Rodrigo de Castel Blanco? Os de S. Paulo ouviram, de punhos cerrados, indignadamente, a notícia destemperada. Como teve Garcia Paes coragem de entregar ao patarata a descoberta de Fernão Dias? Pois não via Garcia Paes que D. Rodrigo iria agora, com as esmeraldas nas garras, apregoar perante a corte que fora ele, D. Rodrigo, e não Fernão Dias, o achador das pedras? Aquilo atiçou na vilota iras assanhadas. O padre João Leite, irmão de Fernão Dias, correu à Câmara com o seu protesto: "Eu, o Padre João Leite da Silva, por mim e como irmão do defuncto, o Capitãm Fernão Dias Paes, descobridor das esmeraldas, e em nome da viuva, sua mulher, Maria Garcia, requeiro a suas mercês, huma e muytas vezes, da parte de S. Alteza, q. Deus guarde, que atalhem pelos meios convenientes, a D. Rodrigo Castell Branquo os intentos que tem de apoderar-se das minas de esmeraldas q. o dito meu irmão descobrio..." A "terrinha" piratiningana alvoroçou-se toda. Andavam pelo ar boatos azedados. Propalava-se até que... Súbito, no esfervilhar daquelas zangas, rompe por S. Paulo adentro, estupidificando-o, esta mensagem aterradora: — Borba Gato, o genro de Fernão Dias, assassinara a D. Rodrigo de Castel Blanco! Borba Gato? Ninguém queria acreditar! Apesar de sua cólera, as gentes de S. Paulo não haviam chegado a ponto de cogitar em tão sanhuda ousadia. Sofrear, com protestos e com embargos, diante das justiças, as possíveis raposias de D. Rodrigo, và! Mas assassinà-lo? Assassinar o enviado do Príncipe? Era demasia a que vassalos, por mais alevantados, não se atreviam com ligeireza. No entanto, por desgraça, aquela sacolejante notícia era a verdade nua: Borba Gato, genro de Fernão Dias, assassinara a D. Rodrigo de Castel Blanco! Como? Os dois homens, depois da morte do bandeirante paulista, tiveram, no sertão do Paraopeba, um encontro desafortunado. Borba Gato fora sempre de ânimo perigosamente assomado. D. Rodrigo de ânimo perigosa mente desabrido. Um estava, como todos os paulistas, assanhado contra o espanhol fanfarrão que recebera as esmeraldas. O outro, como todos os renóis, prevenidíssimo contra os paulistas altaneiros que os tratavam de igual para igual. O encontro deles, por isso mesmo, foi àspero. Áspero e breve. Apenas duas ou três frases cortantes: e Borba Gato, num arranco, ali, em pleno sertão, assassina tresloucadamente, diante dos dois séquitos pasmados, o enviado de confiança do Príncipe! Não podia suceder, como remate à jornada das pedras verdes, acontecimento mais arrepiador. Tinha ali um epílogo de sangue, e, mais do que epílogo de sangue, finalizava-se em crime de lesa-majestade, a retumbante entrada do caçador de esmeraldas. Bem sabia Borba Gato, diante daquela fatalidade, do destino cru que o aguardava. Bem sabia das vinganças que iriam desabar sobre a sua cabeça! Por isso não esperou que estalasse contra ele a sanha régia: naquele mesmo dia, fugindo às justiças, o paulista embrenhou-se às correrias por aqueles bosques asselvajados de além-Mantiqueira. Foi viver, segregado dos homens, como hirsuto bicho de mato, dentro do sertão terrificante daquelas paragens brutas.
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24461*“São Paulo na órbita do Império dos Felipes: Conexões Castelhanas de uma vila da américa portuguesa durante a União Ibérica (1580-1640)” de José Carlos Vilardaga Dia 28 de julho de 1682 Manuel de Borba Gato num impeto, em pleno sertão, assassina tresloucadamente, diante dos dois séquitos pasmados, o enviado de confiança do Príncipe! Não podia acontecer, na jornada à Sabarabuçu, acontecimento mais arrepiador. Tinha ali um epílogo de sangue, e, mais do que epílogo de sangue, finalizava-se em crime de lesa-majestade, a retumbante entrada do caçador de esmeraldas junto aos índios, contacta-o a fim obter informações pertinentes à localização de novas minas. Borba Gato, “tomado de violento ardor, defere-lhe um violento empuxão”. O bandeirante precipita Castelo Branco num sumidouro, num buraco de mina. Em julho de 1682, Rodrigo de Castelo Branco, desembarcara no Brasil. Ele era Superintendente-Geral das Minas e, ciente da experiência do bandeirante paulista Manuel de Borba Gato junto aos índios, contacta-o a fim obter informações pertinentes à localização de novas minas. Borba Gato, “tomado de violento ardor, defere-lhe um violento empuxão”. O bandeirante precipita Castelo Branco num sumidouro, num buraco de mina. [Wikipedia] D. Rodrigo de Castel Blanco està em São Paulo e lá só tinha uma meta: Sabarabuçu! Para tal, fazendo vir das vilas convizinhas os homens de melhor conselho e de maior experiência, homens anciões e de respeito, bota-se D. Rodrigo com eles a "discernir e rumiar as condições, e tempo mais conveniente, para se pôr em execução a jornada ao cerro da Sabarabussú, no descobrimento da prata" (e do ouro). E isso, là dizem pitorescamente as atas da Câmara para que de nenhuma maneira haja de aver falta nem estrovo em se conseguir a jornada de Sabarabussú". E a fim de não aver falta nem estrovo, a Câmara de Taubaté, muito generosamente, apressa-se em oferecer índios seus, a fim de irem plantando roças pelo caminho — "para com fasseledade se conseguir o descubrimento da prata". Mas houve em São Paulo absurda animosidade contra o pràtico de Itabaiana (...). Alardeava aos quatro ventos, com muito e jactancioso palavriado, os seus merecimentos e as suas sabenças. Os de S. Paulo, gente rústica, de pouca fala, enlurados naquele burgo de além-serra, ouviam desconfiados a mentira presunçosa. Detestavam-no. Demais (e aqui, doía-lhes aos paulistas este ponto) eles, os de S. Paulo, ao se "espernearem" por essas serranias afora, à frente de suas bandeiras, là iam à custa do seu bolso, arruinando as próprias fazendas, sem pesarem de uma só placa ao tesouro de el-Rei. D. Rodrigo estava determinado a encontrar Sabarabuçu, ali estava, vivendo como um senhor dom fidalgo, com os custos da jornada largamente pagos, e, por cima, a abocanhar do eràrio reinol a enormidade de seiscentos mil réis. Além de tais larguezas, agora, para se ir à Sabarabuçu, mandalhe ainda o Príncipe abonar, como ajuda, mais a gorda tença de quarenta mil réis! Aquilo assombrava e irava os de São Paulo. Ao mesmo tempo, num contraste gritante, là, pelas tredas matarias dos Cataguazes, hà sete anos jà, padecendo misérias sobre misérias, suportando desgraças e ruínas inenarràveis, dizimado, abandonado, estropeado, desbaratado, mandando vender, para se sustentar, as últimas jóias das filhas, Fernão Dias Paes Leme andava a romper com heroísmos tràgicos, desesperadamente, aquelas serranias bàrbaras onde se acoutavam as esmeraldas e a prata. D. Rodrigo, que era indiferente às esmeraldas e as buscas de bandeirantes, vai com os seus seiscentos e quarenta mil réis, aprestando sossegadamente a sua bandeira. Apresta-a. E ei-lo afinal pronto. Um dia, com muito negro e muito bugre, cargueiros e cargueiros atopetados de mantimentos, o velho mineiro Álvares Coutinho numa rede, carregado a ombro, D. Rodrigo de Castel Blanco lança grandiosamente os seus homens na trilha do caçador de esmeraldas. Vai, tal como o potentado paulista, por aquelas negrejantes rechàs de além-Mantiqueira buscar a nebulosa, a terrível mas sempre fascinante serra branca da prata. Sabarabuçu! Sabarabuçu! E a bandeira abalou. Subitamente chega a notícia, na vilota de São Paulo, estrondeja: Fernão Dias Paes Leme topara com as esmeraldas! Não topara o destemeroso cabo com a tão buscada Sabarabuçu, e nem com a tão buscada prata, é bem verdade. Mas topara com as esmeraldas. Sim, là por aqueles cerradões ermos dos Cataguazes, o velho rompedor-de-mato descobrira enfim as pedras verdes! Descobrira-as à beira da lagoa Vapabuçu. Descobrira-as, apanhara a terçã, e, por fatalidade, morrera subitamente da febre ruim. O filho do bandeirante, Garcia Paes, ao receber do pai moribundo as esmeraldas, botara-as num saquinho de chamalote, e mandara-o com muito lamento a D. Rodrigo. Quê? A D. Rodrigo de Castel Blanco? Os de S. Paulo ouviram, de punhos cerrados, indignadamente, a notícia destemperada. Como teve Garcia Paes coragem de entregar ao patarata a descoberta de Fernão Dias? Pois não via Garcia Paes que D. Rodrigo iria agora, com as esmeraldas nas garras, apregoar perante a corte que fora ele, D. Rodrigo, e não Fernão Dias, o achador das pedras? Aquilo atiçou na vilota iras assanhadas. O padre João Leite, irmão de Fernão Dias, correu à Câmara com o seu protesto: "Eu, o Padre João Leite da Silva, por mim e como irmão do defuncto, o Capitãm Fernão Dias Paes, descobridor das esmeraldas, e em nome da viuva, sua mulher, Maria Garcia, requeiro a suas mercês, huma e muytas vezes, da parte de S. Alteza, q. Deus guarde, que atalhem pelos meios convenientes, a D. Rodrigo Castell Branquo os intentos que tem de apoderar-se das minas de esmeraldas q. o dito meu irmão descobrio..." A "terrinha" piratiningana alvoroçou-se toda. Andavam pelo ar boatos azedados. Propalava-se até que... Súbito, no esfervilhar daquelas zangas, rompe por S. Paulo adentro, estupidificando-o, esta mensagem aterradora: — Borba Gato, o genro de Fernão Dias, assassinara a D. Rodrigo de Castel Blanco! Borba Gato? Ninguém queria acreditar! Apesar de sua cólera, as gentes de S. Paulo não haviam chegado a ponto de cogitar em tão sanhuda ousadia. Sofrear, com protestos e com embargos, diante das justiças, as possíveis raposias de D. Rodrigo, và! Mas assassinà-lo? Assassinar o enviado do Príncipe? Era demasia a que vassalos, por mais alevantados, não se atreviam com ligeireza. No entanto, por desgraça, aquela sacolejante notícia era a verdade nua: Borba Gato, genro de Fernão Dias, assassinara a D. Rodrigo de Castel Blanco! Como? Os dois homens, depois da morte do bandeirante paulista, tiveram, no sertão do Paraopeba, um encontro desafortunado. Borba Gato fora sempre de ânimo perigosamente assomado. D. Rodrigo de ânimo perigosa mente desabrido. Um estava, como todos os paulistas, assanhado contra o espanhol fanfarrão que recebera as esmeraldas. O outro, como todos os renóis, prevenidíssimo contra os paulistas altaneiros que os tratavam de igual para igual. O encontro deles, por isso mesmo, foi àspero. Áspero e breve. Apenas duas ou três frases cortantes: e Borba Gato, num arranco, ali, em pleno sertão, assassina tresloucadamente, diante dos dois séquitos pasmados, o enviado de confiança do Príncipe! Não podia suceder, como remate à jornada das pedras verdes, acontecimento mais arrepiador. Tinha ali um epílogo de sangue, e, mais do que epílogo de sangue, finalizava-se em crime de lesa-majestade, a retumbante entrada do caçador de esmeraldas. Bem sabia Borba Gato, diante daquela fatalidade, do destino cru que o aguardava. Bem sabia das vinganças que iriam desabar sobre a sua cabeça! Por isso não esperou que estalasse contra ele a sanha régia: naquele mesmo dia, fugindo às justiças, o paulista embrenhou-se às correrias por aqueles bosques asselvajados de além-Mantiqueira. Foi viver, segregado dos homens, como hirsuto bicho de mato, dentro do sertão terrificante daquelas paragens brutas. 24284*Inventario dos documentos relativos ao Brasil existentes no Archivo de Marinha e Ultramar de Lisboa Relatório do Governador Antonio Paes de Sande, em que se indica as causas do malogro das pesquisas das minas do Sul e propõe o alvitre para se obter de uma maneira segura o seu descobrimento "A fama das minas de ouro e prata de Pernaguá, Itabanhana e Serra de Sabarabussú, despertou o cuidado e aplicação para se descobrirem anda no tempo do domínio de Castela. Ultimamente S.M., que Deus guarde, com despezas consideráveis de sua Real Fazenda procurou o descobrimento e entabolamento destas minas, mandando para este efeito a Dom Rodrigo de Castelbranco, que as não pode ou não soube descobrir. A minha curiosidade (quando lhe não queiram chamar zelo) procurou em diversos tempos e ocasiões investigar a causa de não conseguir-se este descobrimento das minas, que prometia tão grandes interesses a esta Coroa, valendo-me nas vezes que estive na Baya e no Reyno da notícia de algumas pessoas práticas, que m`a podiam dar dar descobrimentos antigos e modernos. Afirmaram todos que havia as minas que se procuravam descobrir e entabolar, mas que se não achavam, nem se haviam de descobrir pelos meios que se haviam até agora aplicado, por não serem proporcionados para se conseguir o fim que se desejava, Posso depor, que achando-me na Baya ao tempo que Dom Rodrigo de Castelbranco havia entrado a fazer o seu descobrimento (antes do sucesso) afirmaram algumas pessoas práticas, que era impossível conseguir o intento (com a experiência que mostrou) pelas manifestas contradições, de meios, desordens e disposições. A primeira contradição era, que mal pode descobrir a entabolar minas, que não sabe o que ela são, que os sujeitos que até agora se haviam escolhido para estes descobrimentos não tinham ciência algumas delas. A prata das Índias se beneficia por diversas faculdades, desde que em um certo cerro se acha a mina, até que a prata que nela há, o venha a ser, porque uns nativos (ou brancos que os imitam) não tem mais ofício que buscá-las; outros depois de achadas, seguir as betas e penetrar os estados que mais ou menos profundamente seguram serem reais; outros metem o cabedal naquela mina que se lhe achou ou comprou ou pediu ao administrador geral; outros tem os engenhos donde se mói a pedra a outros finalmente temperam a mesma pedra depois de moída e lhe aplicam os ingredientes com que (conforme espécie e qualidade que ela é) tem mostrado a experiência se une menos vagarosamente o açougue, funde com mais facilidade o metal, no que é necessário delicadíssimo tanto, porque por qualquer falta, se perdem muitas vezes grandes cabedais no erro do temperamento. Dom Rodrigo de Castelbranco nunca nas Índias foi escrutador ou bruxula (como os Indios) das minas pelos cerros; nunca foi mineiro, nem seguiu bestas ou profundou estados; nunca foi senhor de minas, nem teve ofício de temperar a pedra moída, se falava em alguns termos, era pelos ouvir e não pelos praticar, e assim como no Brazil há tantos senhores de engenhos e nenhum dele sabe como se tempera o açúcar das canas que nele moem, e se o quisessem fazer se perderam, e todavia falam como se entendessem da arte, assim Dom Francisco ainda que tivera engenho nas Índias, nem por isso era descobridor de minas, penetrador de betas, nem temperador de prata; não é pequena contradição do intento encarregar o efeito a quem não se sabe ser causa eficiente, nem ainda instrumental dele. A segunda contradição era a Infantaria que levava esse homem, porque ou fosse para se introduzir e obedecer, se os Paulistas o não quisessem admitir, ou para autoridade de sua pessoa, execução de suas ordens, ou para o acompanharem no sertão. Se para se introduzir e fazer obedecer, no caso que os Paulistas o repugnem, nem 100 vezes 50 soldados que levava, o poderiam meter na Vila de São Paulo, porque os serros a defendem por todas as partes, seus moradores de grande valor e constância em causa pública, e todos na última desesperaçam são inconquistáveis; e como o nome de infantaria para eles é abominável, e introduzida esta primeira, poderem ter entre si a disposição de toda a mais, seria muito para temer que a não deixem subir á serra, e ir á Vila; e se para autoridade de sua pessoa e execução de suas ordens, com a mesma Infantaria se impossibilita o intento, porque quanto é maior a autoridade que se funda em levar soldados, é maior o escrúpulo daqueles por cuja causa os levam, e deste lhe pode nascer desconfiança de se considerarem dominados, quando todo o estudo dos Paulistas é a conservação de sua liberdade. Se para o acompanharem ao sertão até á serra de Sabarabussú, não tem para isso préstimo infantaria alguma do Brazil, não sendo Paulistas, como a experiência tem mostrado, e supondo-se que não ouve repugnância com os nativos a Sabarabussú, e é impossível conseguir-se a jornada, ou hão de ir são menos 40 Paulistas com eles para os conduzir a aquela serra, o que se não poderá conseguir sem temor grande, que o receio de se considerarem escravos dessa mesma Infantaria, e dos estragos que ao futuro poderão fazer em suas famílias e crédito, os cabos, oficiais e soldados, que necessariamente hão de presidiar aquela praça, se se descobrirem as minas, disponhão secretamente os meios de se não acharem. Muitas outras razões ouvi praticar, mostrando com elas ser quase impossível descobrirem-se estas minas pelos meios que se até agora para este efeito se haviam aplicado, que deixo de referir, por chegar ao meio, que este discurso oferece pelo mais eficaz e o único para se poderem descobrir e entabolar as minas desejadas, mostrando primeiro as razões em que se funda. Está a Vila de São Paulo (cuja área é capaz de se fundar nela uma populosíssima cidade) na eminência de um plano pouco desigual do campo que em circunferência domina, por uma parte a todo o alcance de vista, e por outra a multidão de vários serros, que ao longe lhe formão horizonte. Duvida-de se os grãos de ouro, que em todo ele se acham são abalados dos mesmos serros pelas águas nativas, que deles se despenhão, se descobertos pelas chuvas, donde separadamente se criam. É o campo ameníssimo, retalhado de diversas ribeiras, e principalmente de um rio, de cujas margens se tira o ouro, que chamam de "lavagem". Dista esta vila da de Santos (que é o porto mais frequente daquela costa) 12 léguas, a maior parte delas por caminhos a que dão lugar algumas serras menores até se chegar ao pé da que chamam Paranapiaçaba, a qual é altíssima, e quase inacessível por uma breve estreiteza que os rochedos deixam escassamente ao trânsito de uma só pessoa atrás de outra. Do cume dela se estende aquele campo até á Vila de São Paulo, que por esta causa é naturavelmente inconquistável. A excelência do clima, dos ares e do temperamento se infere bem de não haver até hoje ali médico algum. Tem todas as flores, frutas, legumes e pão, que há em Portugal, e no Brazil em grande abundância, por a terra ser fecundíssima, só o vinho não chega a ser perfeito, mas são perfeitíssimas as carnes de todas as espécies; de maneira que produz aquela região tudo o que a natureza humana pode apetecer para o sustento e para o regalo; assim como as influências dela geram ouro nos serros, e nas áreas de que se tira, parece geram também nos homens os espíritos generosos que neles há, porque todos são briosos, valentes, impacientes de menor injúria, ambiciosos de honra, amantíssimos da sua prátia, benéficos aos forasteiros, e adversíssimos a todo o ato servil, pois até aqueles, cuja muita pobreza, lhe não permite ter quem o sirva, se sujeita antes a andar muitos anos pelo sertão em busca de quem o sirva, do que a servir a outrem um só dia. Há muitos de grossos cabedais para aquelas partes, e não poucas famílias bastantemente nobres, e ainda que entre si tragam inimizades particulares, todos se unem para a conservação da sua república. As mulheres são formosas e varonis, e é costume ali deixarem seus maridos á sua disposição o governo das casas e das fazendas, para que são industriosas, e inclinadas a casar antes suas filhas com estranhos que as autorizem, que com naturais que as igualem. Os filhos primeiro sabem a língua do gentio, do que aprendem a materna, são de gentil índole e gênio para as campanhas, e para as escolas, engenhosos para tudo, e todos saem do berço com a doutrina de conservação da sua liberdade, cujos ciúmes dão a seus pais as minas de ouro e prata que ocultam, e as quais de quantas diligências se tem mandado fazer por descobri-las. E finalmente a vila de São Paulo digníssima de se verificar nela o célebre vaticínio do grande padre José de Anchieta, que ha ela de ser metrópole do Brazil, e parece que não tem para isso mais adequadas disposições, que as do meio que logo se apontará, pois é certo que não pode subir aquele auge com a ruína, se não com o aumento de seus habitadores. Sendo pois esta a natureza e o estudo destes homens, considerando eles (como se ha ouvido praticar a muitos deles) que se as minas reais da prata e ouro se descobrirem, necessariamente se ha de mandar (Governador ou Vice-Rey para aquelas Capitanias, meter nelas presídios para a sua segurança, multiplicar-lhe tributos, que hão de ficar as suas casas expostas ao descrédito, que tem padecido muitas nos estragos que costumam fazer os cabos e os soldados, que o governo quase livre que tinham da sua republica ha de ser sujeito; que donde mandavam, hão de ser mandados, que os não deixarão ir ao sertão, ou se forem lhe hão de tirar os nativos para as minas, que toda a sua utilidade destas ha de ser ruína de suas pessoas, casas, e famílias; e que aquelas terras que seus antepassados povoaram, e seus descendentes foram descobrindo, e multiplicando tão numerosas vilas com tanto trabalho seu, aumento da fazenda real do Estado, hão de ser agora prêmio dos estranhos sem merecimento, e terem seu netos por remuneração do que tinham merecido seus progenitores, ficarem quase escravos dos que hão de ir dominar; bem se infere que para se conservarem no estado presente, e evitarem aquele dano futuro, hão de dispor as industrias de se não descobrir a preciosidade daquelas minas. Evidente prova é deste receio o sucesso que teve D. Francisco de Souza, quando foi aquela Capitania, pois acompanhando os Paulistas ao mineiro que mandou á serra de Sabarabussú, para saberem a parte donde ela ocultava as minas, depois de achadas, de que se fez aviso ao dito D. Francisco, e tiradas muitas cargas de pedra, que o mineiro trazia com grande contentamento, ponderando eles a mesma escravidão, que agora temem seus netos, mataram no caminho ao mineiro, e esconderam a pedra, disseram a D. Francisco que morrera no caminho, e se enganava no que havia escrito a S. Senhoria, de que resultou morrer o dito D. Francisco em breves dias e se perpetuar a suspensão daquelas minas, a tradição de haver muito ricas, e ainda há poucos anos algumas pessoas que existiam na Villa de S. Paulo davam notícia da prata que se fundio das cargas de pedra (...)" [Páginas 197, 198 e 199]
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25029“Memória Histórica de Sorocaba” II. Luís Castanho de Almeida (1904-1981) Desde que foi constatado ouro em Minas pelos taubateanos, os de Sorocaba, embora no ciclo da caça ao nativo, tentaram fazer expedições somente de mineração ou com ambos os intuitos. As primeiras, na região além do Paranapanema. Assim é que em 1699 estava nos campos de Curitiba, Pascoal Moreira Cabral II, que não assinava Leme e Miguel Sutil de Oliveira, daí nascendo as Lavras de Santa Cruz ou do Sutil. As segundas, no atual Estado de Mato Grosso. Essa expedição de 1699 fôra resultado das instâncias de Artur de Meneses, governador do Rio em visita a Sorocaba. No se realizou a expedição autorizada por êle, do paulistano Gaspar de Godói Colaço, com perdão pelo assassínio de Fernão de Camargo, o Tigre. Era coisa própria de sorocabanos... Êstes pediram ainda ao Rei licença para fundar uma vila na Vacaria. Veio resposta negativa, por mêdo dos castelhanos. [Página 81]
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