Primeiro vôo planado teria ocorrido no Brasil por José Raymundo, o Voador da Fazenda da Serra do Córrego do Queijo
8 de dezembro de 1913, segunda-feira. Há 111 anos
Desde os primórdios da humanidade, o homem ansiava por ser capaz de voar como os pássaros. O desejo de voar está presente na humanidade provavelmente desde o dia em que o homem pré-histórico passou a observar o voo dos pássaros e de outros animais voadores.
Ao longo da história há vários registros de tentativas mal sucedidas de voos. Os primeiros tentaram voar imitando pássaros: usar um par de asas, colocando-os nos braços e balançando-os. Imitava-se exatamente o que faziam os pássaros: bater asas para cima e para trás.
Até o século 19, todas as tentativas de voar feitas pelo homem resultaram em fracasso, quando não em morte.
O primeiro registro documentado dessas tentativas ocorreu na Europa, quando Jean-Marie Le Bris efetuou um voo em 1856. Outro planador foi construído por Wilhelm Kress em 1877, em Viena.
O alemão Otto Lilienthal continuou com o trabalho de Wenham, tendo-o melhorado bastante por volta de 1874, e publicou toda sua pesquisa em 1889. Otto Lilienthal também produziu uma série de planadores de qualidade, e em 1891 Lilienthal foi capaz de fazer voos sustentados por mais de 25 metros consistentemente, ao contrário de antigas tentativas que apresentavam resultados instáveis.
Lilienthal rigorosamente documentou todo seu trabalho através inclusive de fotografias e, por esta razão, Lilienthal é o mais conhecido dos antigos pioneiros da aviação.
Mas, de acordo com uma matéria publicada em um importante jornal do Rio de Janeiro do início do século 20, o verdadeiro pai do voo planado teria sido um brasileiro - o primeiro em todo o mundo que voou em sua máquina, em 1853, em voo controlado por cerca de duzentos metros.
Ele se chamava José Raymundo da Silva Pinto, morador da Fazenda da Serra do Córrego do Queijo, no então município de Rio Preto, Minas Gerais, e teria inaugurado a locomoção aérea no mundo, estabelecendo-se como o primeiro homem que se levantou do solo e progressou nos ares, em um pássaro mecânico, mediante esforço muscular.
José Raymundo ‘Voador’
Findava o ano de 1913 quando o tenente Mello Mattoso recebeu uma correspondência inusitada vinda do interior, narrando uma história por demais interessante, ocorrida havia sessenta anos.
Colunista de um dos principais jornais do país, especializado em aviação, com autoridade afirmou se tratar de “um grande facto histórico”, sugerindo que “depois de averiguado por uma comissão oficial, ou pela imprensa”, o personagem ao qual se referia aquela carta deveria ser considerado “mais um padrão de glória nacional”, e que “Belo Horizonte deveria levantar uma estátua ao ‘Voador’”, um mineiro do Vale do Rio Preto!
O personagem se chamava José Raymundo da Silva Pinto, um fazendeiro, sem instrução, que lia e escrevia mal. Homem já maduro, casado e pai de vários filhos, morava na Fazenda da Serra do Córrego do Queijo, na freguesia do Barreado, município de Rio Preto (hoje Santa Bárbara do Monte Verde).
Foi nos primeiros anos da década de 1850 que esse simples lavrador inventou um par de asas, inspirado nos pássaros, e “andou primeiro fazendo uns voozinhos de experiência” em sua propriedade rural.
Rapidamente a notícia do homem que sabia voar com um pássaro mecânico, espalhou-se pelas redondezas, e o senhor José Raymundo passou a ser conhecido no povoado do Barreado e adjacências pela alcunha de “Voador”.
Depois de se capacitar e julgar preparado, convencido de que poderia mesmo voar, decidiu se aventurar. Tempos depois de enviuvar, em uma bela manhã de sol, galgou as escadas do sobrado sede da fazenda e despediu-se da família. Disse-lhes:
“_ Vou para o Rio de Janeiro, voando pelos ares. Ou então fazer uma visita para a mulher, no céu!”
Depois que se despediu de todos os presentes, o “Voador”, muito senhor de si, atirou-se da varanda da casa, aos ares, munido do par de asas por ele fabricado, que manobrava com maestria, ao modo dos pássaros.
Mas, logo no início da longínqua expedição projetada, “quebrou-se o machinismo: e o nosso infeliz, mas desde então celebre patrício, foi cair junto a um moinho, a uns duzentos metros do sobrado”.
Na queda, o senhor José Raymundo “Voador” teve uma das pernas fraturada. “Consta a tradição que um dos pretos que acudiram a levantá-lo, disse-lhe ao ouvido, com uma intuição de perito aeronauta:
_ ‘Si nhonhô não tivesse voado como tico-tico sem rabo, não teria caído!’”
Segundo o entendido tenente Mello Mattoso, “essa observação do preto faz crêr que o aparelho do ‘Voador’ era mais uma imitação da borboleta do que a do pássaro”.
Afirmou, ainda, o experimentado militar que, por meio desse voo de duzentos metros, o senhor José Raymundo da Silva Pinto teria sido o pioneiro a fazê-lo em todo o mundo:
“assim se teria inaugurado a locomoção aérea”, estabelecendo-se o voador riopretano como “o primeiro homem que se levantou do solo e progressou nos ares, em um pássaro mecânico, mediante esforço muscular”.
“Que prazer não seria vermos estampada na Imprensa diária a photographia da gloriosa Fazenda da Serra do Córrego do Queijo!”, finaliza Mattoso.
Coincidentemente, não muito distante dali, do outro lado do rio Preto, no então município de Valença (hoje Rio das Flores), alguns anos depois seria batizado Alberto Santos Dumont, o primeiro no mundo a voar em um balão dirigível com motor a gasolina.
Rodrigo Magalhães, pesquisador e historiador riopretano