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Casa do Albergado de Sorocaba: O Sonho de Isabel Laureano Lopes
1 de janeiro de 1976, quinta-feira. Há 48 anos
A Casa do Albergado de Sorocaba foi construída por uma mulher que se tornou célebre em São Paulo por suas obras de assistência social: Isabel Laureano Lopes. Cega dos dois olhos, D. Isabel conseguiu arrecadar fundos com a publicação de uma série de livros de sua autoria.

Em 1976 Sorocaba possuía cerca de 252 mil habitantes [3], dos quais 80.139 moravam em casas alugadas. Um total de 17.602 famílias sorocabanas não possuíam casa própria. Contraditoriamente, uma pesquisa divulgada naquela mesma semana revelou que o município possuía 702 imóveis fechados [4].

As prisões-albergues custavam vinte vezes mais barato ao estado do que as penitenciárias.

Os mandatos de prisão cresciam à ordem de mil por mês, teríamos que construir mais de duas penitências por mês só para atender os novos mandatos. Ainda que todo o Orçamento Federal do país fosse investido na construção de penitenciárias, a crise continuaria.

O estado, isoladamento, não tinha condições de arcar com todas as despesas. Seria necessario construir 83 penitenciarias. Os números do Estado de SP eram assustadores [12]:

- carência de 41.500 vagas;
- 75.189 mandados de prisão por cumprir;
- 500 presos por penitenciaria;
- A Casa de Detenção, com capacidade para 2.200 presos, estava com uma população de 6.117 detentos;

A edição n° 1252 da revista Manchete/RJ publicou uma matéria dando detalhes da Casa do Albergado em Sorocaba:

Todos os dias, às cinco horas e trinta minutos da manhã, o PM Valdomiro de Brito repetia o mesmo ritual: tocar um sino acordando os quinze presos que receberam o benefício legal de cumprirem suas penas fora da cadeia, em regime de liberade condicional.

Tratava-se de uma experiência inédita no Brasil: 786 condenados à prisão, no Estado de São Paulo, recebram o chamado "Benefício do albergue", instituído por uma decisão do Conselho superior de Magistratura.

Os detentos passavam o dia todo trabalhando e só voltavam à noite para a prisão-albergue. Ali viviam em comunidade, sendo controlados apenas por um policial.

A maioria deles começavao trabalho às sete horas da manhã e todos faziam questão de chegar no horário.

Afinal, a perda do emprego representava uma ameaça de volta ao "xadrez" comum. O trabalho era muito variado: balconista em lojas comerciais, ajudante de cozinha, marceneiro, funcionário de hospital, operário de fábrica, etc.

Os detentos saiam muito cedo para o serviço, entre as 6 e 7 horas, e votavam somente entre 19 e 20 horas.

Almoçavam no próprio local ou, então, com as suas famílias. O jantar era sempre com a família. Essa rotina era rigorosamenrte obvervada pelos 15 albergados da "Casa do Albergado" de Sorocaba.

Mas, para dormir fora da Casa, era necessário uma autorização judicial. O albergado teria que apresentar, então, uma justificativa importante.

Para o detento chegar mais tarde, devia obter uma autorização especial. De um modo geral, os albergados se declaravam satisfeitos com a situação, muito diferente daqueles que ficavam nas celas das cadeias públicas e penitênciarias do estado.

Afora isso, conseguiam salários razoáveis. Haviam os que recebiam até cinco mil cruzeiros de salário, como era o caso do vendedor de uma forma de eletrodomésticos, Antônio de Oliveira (imagem 1), condenado, a dois anos de prisão por "crime de sedução".

A Secretária de Justiça de São Paulo não tinha condições para construir Casas do Albergado no interior. Assim cada município vinham pesquisando soluções próprias para a implantação das prisões-albergues.

A Casa do Albergado de Sorocaba foi construída por uma mulher que se tornou célebre em São Paulo por suas obras de assistência social: Isabel Laureano Lopes. Cega dos dois olhos, D. Isabel conseguiu arrecadar fundos com a publicação de uma série de livros de sua autoria.

A Casa de Sorocaba era bastante simples: dois quartos amplos com quarenta e quatro beliches, uma sala de visitas com televisão e mesa para o almoço de domingo.

À noite, os albergados se reúniam ali para conversar. Nos quartos, tinha-se a impressão de que eles estava ali de passagem. Nas paredes, não se via nenhum quadro ou fotografia.

Um dos presos dizia que essa ausência de objetos pessoas tinha um objetivo: "Os detentos querem mostrar a si próprios que estavam ali apenas de passagem, principalmenre porque a a maioria deles tinha sempre a esperança de ser indultado no Natal".

O albergado tinha, de fato, uma possibilidade maior de receber o indulto, por ser um preso que apresentava um nível muito baixo de periculosidade e um comportamento geralmente exemplar.

No Natral de 1975, por exemplo, vinte e nove presos da Casa do Albergado de Sorocaba foram beneficiados coma suspensão da pena.

O detento Antônio Oliveira, condenado a dois anos por ter seduzido uma garota de dezesseis anos, era um dosmelhores vendedores de uma das maiores lojas de eltrodomésticos de Sorocaba.

Foi o próprio patrão quem se movimentou para assegulhar-lhe o benefício do albergue. Antônio Oliveira era casado e tinha dois filhos. "A minha sorte, dizia ele, foi ter apoio dos donos da loja. Eles me conservaram na função, o que facilitou bastante a concessão do benefício do albergue." Antônio Oliveira dizia ainda:

"Não precisei nem vender meu carro. Com os cinco mil cruzeiros que continuo faturando mensalmente, consegui manter o padrão de vida da minha família, sem prejudicar minha mulher e meu dois filhos menores."

Outro detento beneficiado com o acesso ao albergue era Sidnei Hata (imagem 1), de 22 anos, condenado a um ano de prisão por consumo de maconha.Hata trabalhava como auxiliar de cozinha num restaurante especializado em servir refeições comerciais.

Julgado em Jundiaí, conseguiu instalar-se na Casa em Sorocaba, onde residia sua mãe."Os três anos e seis meses que fiquei na cadeia de Jundiaí antes de receber o benefício do albergue, contava Hata, foram suficientes para me mostrar o que é a vida ali: perigosa e dura.

E lá dentro que o detrtento se torna ainda mais viciado em drogas. Quem não quiser participar é perseguido pelos presos mais antigos, que não raro submetem os mais novos às suas taras sexuais.

Se alguém entra com a intenção de se regenear, sai bem pior, depois de cumprir a pena."Para obter o benefício do albergue, o sentenciado precisava ser considerado de baixa periculosidade e ter emprego garantigo.

O juiz poderia decrfetar o benefício no momento da sentença, se a pena fosse inferior a três anos. E se fosse superior a cinco anos, o detento poderia ser benficiado seis após a sentença, desde que tenha bom comportamento.

Nos casos de penas maiores, o sentenciado poderia ser transferido para o albergue após ter cumprido um terço da pena.

O sistema da prisão-albergue tinha apoio de diversos criminalistas. O professor Manuel Lopez-Rey Y Arroio, uma das maiores autoridades mundiais em criminologia e chefe da Seção de Defesa Social das Nações Unidas, assim se manifestava sobre a iniciativa:

"Está provado que a prisão fechada não soluciona o problema da criminalidade. E não existe nenhum país suficientemente rico para construir prisões que atendam a demanda.

É óbvio que as prisões fechadas não devem desaparecer e deixar de atender a casos de grande periculosidade. Mas uma unidade desse tipo não deve receber receber uma população maior que trezentos reclusos.

A ONU tem-se manifestado a favor das prisões abertar, pois os conceitos de segurança são na realiade instrumentos muito repressores, em nada contribuindo para a reabilitação social do indivíduo.

Numa entrevista exclusiva a MANCHETE, o Secretário de Justiça de São Paulo, Professor Manuel Pedro Pimentel, propunha que se desse o maior apoio ao regime de prisão-albergue. Quando lhe pediram um diagnóstico da crise carcerária no Estado, ele disse:

"A superlotação dos presídios é uma realidade. O crescimento da criminalidade não foi acompanhado pelo aumento do número de vagas nos presídios.

As cadeias públicas, destinadas a abrigar os presos correcionais, e que estão subordinadas à Secretaria de Segurança Pública, há muitos anos vêm abrigando precariamente os sentenciados e os presos em razão de prisão procesual, os quais deveriam estar recolhidos aos presídios da Secretaria de Justiça.

Com isso, a situação carcerária do Estado, nos dias de hoje, é a seguinte:A Casa de Detenção, com capacidade para 2.200 presos, está com uma população de 6.117 detentos, enquanto cadeias do interior há 7.500 presos que deveriam estar recolhidos à rede da Secretaroa de Justiça. Há, portanto, uma carência de quase 11.500 vagas."

QUAIS SERIAM AS PRINCIPAIS CAUSAS DESSA CRISE?
Pimentel - Desde a instalação, na década de 20, da Penitênciária Central na Capital de São Paulo, não se cuidou mais da atualização do sistema carcerário.

Durante muitos anos, ele foi até modelo de penitenciária para outros países. Foi só no governo Jânio Quadros que se cogitou da atualização do sistema, principalmente após a revolta do presídio da Ilha de Anchieta [1].

Foi nessa ocasião que se criaram os primeiros institutos penais agrícolas, os IPAs, que originalmente eram três:

Itapetininga, Bauru e São José do Rio Preto. Planejou-se também a construção de várias penitênciárias regionais, indicando-se Avaré, Araraquara, Pirajuí, Tirapina, Sorocaba e Samaritá, na Baixada Santista.

Entre essas obras, a única concluída é a de Avaré, inaugurada em 1971. A sua construção demorou dez anos e as outras estão agora em fase final de acabamento.A causa central de toda a crise é, portanto, a defasagem engtre o crescimento da criminalidade e a falta de criação de vagas em presídios fechados.

ESSA CRISE TENDE A SE AGRAVAR?
Pimentel - Leve-se em conta ainda que existem 75.189 mandados de prisão por cumprir. Supondo que esse número não represente o total de mandados válidos, porque muitos deles estarias cadudos por vários motivos (prescrição das penas, prisões provisórias já superadas, mortes dos réus, etc.), calcularíamos em cerca de 30 mil o número real de mandados por cumpir.

Sabendo-se que os presídios devem ser construídos com capacidade para abrigar, no máximo quinetos presos teríamos que construir vagas para 41.500 senteciados, o que demandaria a construção de oitenta e três penitenciárias.

Se considerarmos ainda que os mandatos de prisão crescem à ordem de mil por mês, teríamos que construir mais duas penitências por mês só para atender os novos mandatos.

QUAIS SERIAM AS SOLUÇÕES VIÁVEIS PARA O MOMENTO?
Pimentel - Ainda que todo o Orçamento Federal do país fosse investido na construção de penitenciárias, a crise continuaria.

Justamente por isso, insisto num novo enfoque do conceito da pena. Acredito que há a necessidade de se condenar à pena de prisçai todos os que praticam crime.Existem criminosos que praticamente não oferecem qualquer periculosidade, não sendo necessário, em consequência, prendê-los em penitenciárias.

Aí é que surge a importância da Resolução 92, do Conselho da Magistratura, estabelecendo que os sentenciados de escassa ou nenhuma periculosidade podem ser recolhidos em prisões-albergues, que custam vinte vezes mais barato ao estado.

O importante, agora, é que cada comunidade ajude na criação de sua própria Casa do Albergado, fazendo doações e facilitando a sua instalação, levando-se em conta que o estado, isoladamento, não tem condições de arcar com todas as despesas.

NO QUE CONSISTE BASICAMENTE A PRISÃO-ALBERGUE?
Pimentel - A prisão-albergue é um benefício ao qual só tem direito o condenado sem periculosidade. O Juiz só pode determinar a concessão do benefício quandoo detento tiver um emprego assegurado.

Dessa forma, o condenado temo direito de passar o dia todo no trabalho, com horário livre para o almoço e o jantar com a família, devendo voltar à noite para a Casa do Albergado.

QUAIS SERIAM AS VANTAGENS DO SISTEMA?
Pimentel - Em primeiro lugar, reitero que ele custa 20 vezes mais barato ao estado, que pode solucionar assim, ao menos parcialmente, o seu grave problema de superpopulação.

Acrescente-se a isso a grande vantagem social e humana de o condenado nçao perder o contato coma família, podendo ter um vida efetiva normal, escapando desse modo, aos desvios sexuais tão comuns em nossas penitenciárias.

Além disso, existe um outro fator, de fundamental importância: pelo sistema de prisão-albergue, a pessoa tem condições de se manter arualizada com relação ao mundo em que vive, evitando-se com isso choques posteriores, quando novamente em contato com a comunidade.

Antônio de Oliveira confirma as palavras do professor Manuel Pimentel: "Na hora do almoço, em cinco minutos, estou na minha casa, localizada a uma quadra da loja, e depois do expediente ainda fico mais duas horas com a família.Quando volto à noite para o Albergue, não me sinto como uma pessoa presa e fico estimulado para começar uma vida nova.

A minha pena deverá expirar em dezembro de 1977, mais tenho esperança de ser indultado no próximo Natal. Será, então, a reintegração completa no seio da minha família e da sociedade."

[1] https://brasilbook.com.br/r.asp?r=16877

[2] https://brasilbook.com.br/r.asp?r=19267

[3] Jornal Cruzeiro do Sul

[4] https://brasilbook.com.br/r.asp?r=8975


Sidnei Hata
Data: 01/01/1976 1976
Créditos / Fonte: Wilson Chumbo / Revista Manchete/RJ (ed. 1252)
Casa do Albergado

Casa do Albergado
Data: 01/01/1976 1976
Créditos / Fonte: Wilson Chumbo / Revista Manchete/RJ (ed. 1252)
Bairro do Cerrado

Casa do Albergado
Data: 01/01/1976 1976
Créditos / Fonte: Revista Manchete/RJ (Edição 1252)
Antônio Oliveira e a filha de 2 anos

Casa do Albergado
Data: 01/01/1976 1976
Créditos / Fonte: Wilson Chumbo / Revista Manchete/RJ (ed. 1252)

Casa do Albergado
Data: 01/01/1976 1976
Créditos / Fonte: Wilson Chumbo / Revista Manchete/RJ (ed. 1252)

Professor Manuel Pedro Pimentel
Data: 01/01/1976 1976
Créditos / Fonte: Revista Manchete/RJ

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