“Memórias Para a História da Capitania de São Vicente”, Frei Gaspar da Madre de Deus (1715-1800)
1797. Há 227 anos
Gaspar da Madre de Deus reconhece que a narrativa de Charlevoix sobre as incursões paulistas no Paraguai é exata, muito mais exata do que certos relatos portugueses. [Viagem a provincia de São Paulo e resumo das viagens ao Brasil, Província Cisplatina e Missões do Paraguai, 1940. Auguste de Saint-Hilaire (1779-1853). Página 40]
Frei Gaspar da Madre de Deus (1715-1800), Memórias para a história da capitania de São Vicente, I, em nota ao 154, afirma que Pirá-tininga, ou Piratinim, é um ribeiro, afluente do Tieté: e faz referência ao auto de demarcação das terras de Braz Cubas, feito em São Paulo em 1633, além de uma carta de sesmaria, passada por Jorge Ferreira aos 9 de agosto de 1567.
Supõe mesmo que seja o Tamanduatehy. Manuel Eufrásio de Azevedo Marques (1825-1878), porém nos Apontamentos históricos, geográficos, biográficos, estatísticos e noticiosos da província de São Paulo, no nome Piratininga, o refuta com vantagem, dizendo que, se em documentos antigos ha a palavra rio de Piratininga, é significando que pelos campos desse nome passa um rio. Em verdade, não há notícia de tal rio Pirá-tininga. [“Algumas notas genealógicas: livro de família: Portugal, Hespanha, Flandres-Brabante, Brazil, São Paulo-Maranhão: séculos XVI-XIX”, 1886. João Mendes de Almeida. Páginas 332, 333, 334, 335 e 336]
O entranhado espírito regionalista denuncia-se a cada passo em frei Gaspar; ora o leva a protestar na mais justa aliás das reivindicações, contra alegações insultuosas de Dom Vaissette, historiador maurino, ora a demonstrar quanto em terras de São Paulo era já volumosa a corrente nacionalista e quanta consciência já aí se tinha da importância do indigenato brasileiro. Acodem-lhe ao bico da pena, honesta e comedida, severas palavras e irritados conceitos. [Página 66]
Dom Vaissette, seu irmão de hábito beneditino, "historiador célebre e sábio monge", aliás, envergonhar-se-ia de ter iludido o público a respeito dos Paulistas", a quem tanto caluniara, chamado-lhes bandidos e piratas sem fé, sem lei, nem rei, "se não houvera bebido no mesmo charco de Charlevoix". [Página 67]
desfrutam os viandantes, por estar o cume das serras ordinariamente coberto de nevoeiros, que impediria a vista dos objetos inferiores.
115. Nesta viagem não basta chegar-se ao pico, para se ter dado fim às subidas, e vêem-se os caminhantes obrigados a continuá-las, quando as reputam acabadas; porque os cumes dos outeiros servem de base a outros montes, que adiante se seguem, e assim vão prosseguindo,de sorte que é necessário aos viajantes caminharem, como quem sobe por degraus de escadas. Vencido finalmente, este caminho, talvez o pior, que tem no mundo, chegou Martim Afonso ao campo de Piratininga, onde se achava aos 10 de outubro de 1532, e ali assinou nesse dia a Sesmaria de Pedro do Góis, lavrada por Pero Capico, escrivão de el-Rei. Examinou oterreno, quanto lhe foi possível, do qual formou idéia muito vantajosa; mas por isso mesmo, tanto que se recolheu à Vila de S. Vicente, deu uma providência digníssima da sua alta compreensão, ordenando que nem a resgatar com os índios pudessem ir brancos ao campo sem sua licença, ou dos capitães seus loco-tenentes, a qual se daria com muita circunspeção, e unicamente a sujeitos bem morigerados. Desta regra generalíssima só foiexcetuado João Ramalho o qual veio situar-se meia légua distante da Borda do Campo no lugar onde hoje existe a Capela de S. Bernardo.
116. Não padece a maior dúvida, que houve a dita proibição,e também que para todos poderem ir ao campo, foi necessária dispensade quem tinha jurisdição igual à do proibente. D. Ana Pimentel, comoprocuradora do donatário seu marido, passou o seguinte alvará no anodo 1544:91
“D. Ana Pimentel, mulher de Martim Afonso de Sousa, capitão-mor, e Governador da Povoação da Capitania de S. Vicente, costa do Brasil, que ora por seu especial mandado, e provisãogoverno a dita Capitania &c. Aos que este meu alvará virem e oconhecimento pertencer, faço saber, que eu hei por bem, e me apraz, moradores da dita Capitania de S. Vicente possam ir, emandar resgatar ao campo, e a todas outras coisas, e porémmando, que no tempo que os índios do dito campo andam emsua santidade, nenhuma pessoa de qualquer qualidade que seja,possa ir, nem mandar ao dito campo, por ser informada, quehá grande perigo para a dita terra irem lá em tal tempo, e tirando em este tempo, todo outros mandaram, e foram, contantoque sempre tomem licença do capitão, ou de quem o tal cargotiver; e nenhum capitão, nem ouvidor lhe não poderia tolher,não sendo no tempo, que se diz em cima, e assim mando a todas as Justiças, que guardem este, e o façam guardar; porque assim o hei por bem. Feito em Lisboa a 11 de fevereiro de 1544.”117. Ouvindo dizer os camaristas de S. Vicente, que AntônioTeixeira havia chegado de Lisboa e trazia o referido alvará, obrigaram-noa ir apresentá-lo na Vereação de 3 de maio de 1544 talvez por duvidarem, que D. Ana houvesse tido a imprudência de derrogar semelhantedisposição de seu marido.118. Com duas vistas, ambas muito próprias dos olhos doMartim Afonso, fez este donatário aquela proibição utilíssima ao bem comum do Reino, e conducente ao aumento da sua capitania. Ele penetrou osverdadeiros interesses do Estado melhor do que alguns modernos, e o seufim era não só evitar guerras, mas também fomentar a povoação da costa.Previu que da livre entrada dos brancos em as aldeias dos índios haviam deseguir-se contendas e alterar-se a paz tão necessária ao aumento da terra:não ignorava, que D. João III mandara fundar colônias em país tão remotode Portugal com o intuito de utilizar ao Estado por meio da exportaçãodos frutos brasílicos: sabia que todos os gêneros produzidos junto ao marpodiam conduzir-se para a Europa facilmente, e que os do sertão pelo contrário nunca chegariam a portos, onde os embarcassem, ou se chegassemseria com despesas tais, que aos lavradores não faria conta largá-los pelopreço, por que se vendessem os da marinha. Estes foram os motivos de antepor a povoação da costa à do sertão: e porque também previu, que nunca, ou muito tarde se havia de povoar bem a marinha, repartindo-se os co [Páginas 73 e 74]
dios e portugueses, desejosos de atrair grande número de povoadores, quese unissem a eles, e daqui nasceram as contendas, que tanto exagera o cronista da Companhia do Brasil, lançando toda a culpa aos filhos de João Ramalho. Vasconcelos não explica, que as diligências foram recíprocas; cala assolicitações de seus sócios; e pinta as dos Ramalhos por estilo, que os reputa sediciosos, ou rebeldes ao Estado quem lê a Crônica da sua Província.137163. A vista dos padres era muito mais penetrante, que a deseus êmulos: eles olhavam para aquela vila, como para um obstáculo aosprogressos da nova aldeia; e vendo, que ambas não podiam existir, desviaram o golpe fatal, que ameaçava a sua povoação, dispondo as coisasde sorte, que a espada fosse descarregar sobre a inimiga. Tentaram persuadir aos do Governo, que era conveniente ao Estado, e útil à religiãomudar-se para a Aldeia de S. Paulo o Pelourinho, e moradores de SantoAndré, e juntamente o foro de vila. Ponderavam, que esta por ficar vizinha ao mato, estava exposta às invasões repentinas dos bárbaros nossoscontrários, e que por falta de sacerdotes não havia nela quem administrasse os sacramentos; concluindo finalmente, que os mencionados inconvenientes ficariam remediados com a transmigração da vila para junto ao colégio, onde assistiam sacerdotes, que suprissem a falta de pároco, e não podiam chegar os inimigos sem serem sentidos, por ficar S.Paulo em lugar descoberto, e livre de árvores, que ocultassem as marchasdos exércitos contrários.
164. Depois de contenderem alguns anos por este modo, chegaram finalmente os padres a cantar a vitória; porque achando-se em S. Vicente o governador-geral Mem de Sá em 1560, tais razões lhe propôs o Pe. Nóbrega, a quem ele muito venerava, que persuadido delas, mandou extinguir a Vila de Santo André, e mudar o Pelourinho para defronte do colégio:
executou-se a ordem no mesmo ano, e daí por diante ficou a povoação na classe das vilas com o título de S. Paulo de Piratininga, que conservava desde o seu princípio. Os guaianases oriundos de Piratininga, e mais índios ali moradores, vendo que iam concorrendo portugueses, e ocupando as suas terras, desampararam S. Paulo, e foram situar-se em duas aldeias, que novamente edificaram, uma com o título de Nossa Senhora dos Pinheiros, e outra com a invocação de S. Miguel.
Depois de alguns anos Jerônimo Leitão, loco-tenente de Lopo de Sousa, donatário de S. Vicente, concedeu-lhes terras por uma só sesmaria lavrada aos 12 de outubro de 1580, na qual consignou aos índios dos Pinheiros 6 léguas em quadro na paragem chamada Carapicuíva, e outras tantas aos de S. Miguel em Uraraí. Hoje quase nada possuem os miseráveis índios descendentes dos naturais da terra; porque injustamente os desapossaram da maior parte das suas datas, não obstante serem concedidas as sesmarias posteriores dos brancos com a expressa condição de não prejudicarem aos índios, nem serem deles as terras, que se davam.
165. Eis aqui a história verdadeira da fundação da cidade de S.Paulo, a qual não deve sua origem a Martim Afonso de Sousa, nem traz asua criação do princípio assinado pelos autores estrangeiros, que falam nadita cidade. Para que se veja a pouca exceção, com que eles escrevem arespeito desta capitania, principalmente dos paulistas, eu vou copiar o quedeles, e de toda a capitania dizem Vaissette, e Charlevoix; e ao mesmotempo irei mostrando os seus erros, e convencendo de falsas quase todasas suas proposições. Deste modo conhecerão os leitores a futilidade, e oridículo de tudo quanto se tem escrito, e se escrever arbitrariamente destacapitania. Vaissette falando de S. Vicente diz:140“A costa do mar do norte cerca esta capitania no espaço deperto de 80 léguas141 comuns de França: ela tem a capitaniad’el-Rei ao meio-dia,142 e é cercada pelo poente pelo Paraguai.143Assegura-se, que ela tem pouco mais ou menos 80 léguas de ex [Páginas 105 e 106]
Eis que de maneira se expressa o autor a quém devemos preciosas informações sobre os nativos de Queluz, de Itapeva e de Grapuava: "Quando da invasão dos conquistadores, os guaianazes não puderam acompanhar as tribos de sua nação que procuraram, em meio das florestas, um refúgio contra a escravidão e a morte.
Os que permaneceram na região, fatigados por trinta anos de uma vida nômade e pelos longos sofrimentos que padeceram, cederam, afinal, ante a força das circunstâncias; déram a entender que queriam a paz e que submeter-se-iam completamente ao serviço dos brancos, sob a condição, porém, de que viveriam em comum entre si, mas separados daqueles... Foram atendidos. Sabemos, por tradição, que a aldeia dos Pinheiros... foi fundada em 1560." Página 133] [0]
Fundação da Cidade de São Paulo
Muito longe de merecerem alguma atenção as memórias, que ofereço a quem escrever a História desta Capitania, elas serviriam tão somente de enganar aos meu leitores, se eu contasse a fundação da cidade São Paulo como a relatam todos os Historiadores, e Dicionaristas Geógrafos Estrangeiros, principalmente D. José Vaissette, Historiador célebre, e sábio monge da Congregação Beneditina de S. Mauro em França, bem conhecida pela grande literatura, e muito observância de seus alunos. Eu tenho por certo (sem falar nos mais autores) que este meu irmão se envergonharia de ter iludido o público, com o que escreveu a respeito de São Paulo, e dos paulistas, se viera a esta Capitania, e pelos cartórios dela chegasse a conseguir uma leve instrução verdadeira dos fatos antigos, que publicou mal informado.
Em cima da serra de Paranaapiacaba, e debaixo do Trópico Austral pouco mais ou menos demora um País delicioso, a que os portugueses no princípio davam o nome de Campo por distinção das terras de Beira-mar, que acharam cobertas de arvoredo muito alto, quando aqui chegaram, e por isso diferentes daquelas mais vizinhas a São Paulo, as quais tem artificio não produzem árvores altas, senão em pequenos bosques, distantes uns dos outros, e dispersos por toda a campanha, a qual é um terreno desigual, cuja produção, espontânea, e mais ordinária, consiste em feno, e arbustos rasteiros: campões de mato chamam no Brasil aos tais pequenos bosques. Pelo dito campo dos Antigos faz seu curto um Rio famoso, a que os títulos, e cartas mais antigas dão o nome de Rio Grande, o de Anhambî as Sesmarias concedidas no princípio do século passado; e hoje todos vulgarmente o de Tyetê. Nele faz confluência um ribeiro, a que os nativos da terra intitulavam Piratininga, ou Piratinim, como acho escrito em alguns documentos antigos (...). Em uma das margens do tal ribeiro estava situada uma aldeia, cujo nome era Piratininga, onde residia Tebyreçá, Soberano dos Guaianazes: ela tomou o nome do ribeiro, o qual se comunicou a todo o Paiz, e este se chamou Campos de Piratininga. [Páginas 215 e 216] [1]img
Camargo aponta o historiador e monge beneditino Gaspar Teixeira de Azevedo (1715-1800), mais conhecido como Frei Gaspar da Madre de Deus, como o primeiro a chamar, em livro, de bandeiras as incursões pelo sertão — o faz em "Memórias Para a História da Capitania de São Vicente", publicado originalmente em 1797. "Mas ele ainda não empregava o termo bandeirantes. Chamava-os apenas de paulistas", atesta Camargo.
Eis aqui a história verdadeira da fundação da cidade de S. Paulo, a qual não deve sua origem a Martim Afonso de Sousa, nem traz a sua criação do princípio assinado pelos autores estrangeiros, que falam na dita cidade. Para que se veja a pouca exceção, com que eles escrevem a respeito desta capitania, principalmente dos paulistas, eu vou copiar o que deles, e de toda a capitania dizem Vaissette, e Charlevoix; e ao mesmo tempo irei mostrando os seus erros, e convencendo de falsas quase todas as suas proposições. Deste modo conhecerão os leitores a futilidade, e o ridículo de tudo quanto se tem escrito, e se escrever arbitrariamente desta capitania.
Joseph Vaissète (1685-1756) falando de S. Vicente diz:140
“A costa do mar do norte cerca esta capitania no espaço de perto de 80 léguas [iens, em 1755.(2) A capitania de S. Vicente estendia-se pela costa 100 legoas, d´ondese segue, que o Autor dlminue a sua extensão: porque 10 legoas francezas contém sómeinte 9 das nossas (Gelasio Antônio de Sá Supplemento daHistoria Chronol. tom. 1, cap. 2, 1, pag. 27), e como por esta com as 80 francezas sommão 72 portuguezas, dá o Padre á Capitania de S. Vicente na costa 22 legoas menos, do que élla tinha.] comuns de França: ela tem a capitania d´el-Rei ao meio-dia [ Em todo o Brazil não ha Província alguma, que se denomine Capitania d´El-Rei: a de S. Vicente tinha ao Meio dia 40 legoas. que pertencião ao Donatário de Santo Amaro], e é cercada pelo poente pelo Paraguai.143 Assegura-se, que ela tem pouco mais ou menos 80 léguas de extensão do levante ao poente na sua parte setentrional, onde confina com a capitania do Rio de Janeiro, e perto de 40 léguas na parte meridional [A Capitania de S. Vicente confinava pelo Sertão com terras de Hespanha, entre as quaes, e a costa do mar, assim ao Norte, como ao Meto dia, devem contar-se muitas legoas mais, do que as assignadas pelo A.].
O país é fértil, principalmente de frutos; tem Minas de Prata [Se fala de Minas descobertas, como parece falar, enganou-se certamente; pois em parte nenhuma do Brazil se labora em Minas de Prata, nem consta com certeza, que haja algumas rendosas: muitas vezes se procurarão n´outro tempo; e dizem, que D. Francisco de Souza, Governador Geral do Estado, extraíra pelos anos de 1599 alguma prata em Biraçoiaba, Termo da Villa de Sorocaba d´esta Capitania; mas em quantidade tão diminuta, e de lugar tão profundo, que não fazia conta aquela Mina, e por isso ficara sem uso], e se acha regado por muitos rios.
Entre as ilhas que estão sobre a costa, a principal é a de Santos, onde se vê a cidade146 de S. Vicente, antigamente capital da capitania, mas reduzida hoje a pouca cousa, por causa de não ser bom o seu porto. Santos está situada em 24º de latitude, e 29º de longitude ocidental.
[inicio da pagina 225] Os portugueses têm outras colônias nesta capitania: uma das principais é S. Paulo, cidade situada imediatamente debaixo do Trópico do Capricórnio [nota 4 - A cidade de S. Paulo está ao Sul do Trópico, como se vê da suaposição Mathematica (5 160)] na parte setentrional da capitania 25 léguas ao norte de Santos. Ela deve a sua origem a uma tropa de espanhóis, portugueses, índios, mestiços, mulatos, e outros fugitivos, que por se esconderem, e fugirem dos governadores-gerais do Brasil, se ajuntaram neste lugar, e aí se estabeleceram.
O seu número se acrescentou de tal sorte, que a cidade continha quatro, ou cinco mil habitantes no princípio deste século, sem contar os escravos, e índios, que se lhe davam. Os seus habitantes, que se diziam livres, foram governados em República 150 por espaço de dilatado tempo debaixo da autoridade d´el-Rei de Portugal, ao qual eles pagavam um tributo de quase 800 marcos de prata151 todos os anos pelo quinto do usufruto do seu domínio, onde eles têm minas de ouro, e prata, que são cercadas em roda de altas montanhas, e fechadas por um espesso bosque.
Eles admitiam consigo aventureiros detodas as nações da Europa; porém não permitiam entrada aosestrangeiros na sua república.
[(2) Parece, que o Autor se oontradiz; por quanto, depois de teraffirmado, que admittião comsigo aventureiros de todas as nações da Europa, accrescenta, que não permittião aos estrangeiros entrada na sua Republica; porém o sentido é, a meu ver, que deixavão morar forasteirosna sua Villa, e não conseütião terem parte no Governo. Eis aqui outrafábula, pois assim os europeos portuguezes como os estrangeiros casadosna terra, fôrão Camaristas sem contradicção alguma até o tempo das guerras civis entre Pires, e Camargos, e ainda depois disso erão admittidos comcertas limitações. Estas nobres íamilias aparentadas com as outras principaes de S. Paulo, estando depois de grandes desordens em campo a pontode se darem batalha com dous formidáveis exércitos, experimentarião a suatotal ruína, se o parocho, e religiosos da Villa, que muito bem conheciãoo motivo das discórdias, não reduzissem os dous bandos inimigos a abraçarem o prudente meio, de que nos Pellouros da Camara entrassem sempreOfficiaes das íamilias contendorae em igual numero, e entre elles algunsneutraes. Este meio serenou a tormenta, e para que se não levantasse outrasemelhante no tempo futuro, D. Jeronymo de Atayde, Conde de Atouguia,então Governador do Estado, approvou a Concordata na Cidade da Bahiaaos 24 de Novembro de 1655, a qual confirmou ao depois Sua Magestade varias vezes (Archiv. da Cam. de S. Paulo, Liv. de Reg. tit. 1655, pag. 28 e n. 4,tit. 1664, pag. 125), como explicarei melhor, quando escrever as guerras civisdesta Capitania Ouviu pois dizer Vaissette, ou quem lhe deu a noticia, quenem todos os moradores de S. Paulo podião servir na Camara, e não sabendoa razão disso, e também que cousa seja o que os portuguezes chamão Senado ou Camara, ignorando outro sim, que aos Officiaes della damos otitulo de Republicanos; escreveu, que os paulistas não permittião a estrangeiros entrada na sua Republica.]
Professavam a religião católica, ainda que exercitassem oofício de piratas;153 mas finalmente el-rei de Portugal sujeitouesta república a seu domínio imediato, do qual ela hoje depende,154 e o Papa Benedito XIV erigiu ali um bispado noano de 1745. Também há várias casas religiosas, e entre elasum Mosteiro de Beneditinos da Congregação do Brasil.155 Oshabitantes por muito tempo duvidaram admitir consigo jesuítas, os quais finalmente estabeleceram ali um colégio, nãoobstante esta dificuldade”. [Páginas 228]
156166. O jesuíta Charlevoix caminha por estrada tão escorregadiça,como a de Vaissette; e bem se percebe, que ambos beberam no mesmo charco. Falando dos moradores de S. Paulo, diz na sua História do Paraguai:157166. O jesuíta Charlevoix caminha por estrada tão escorregadiça,como a de Vaissette; e bem se percebe, que ambos beberam no mesmo charco. Falando dos moradores de S. Paulo, diz na sua História do Paraguai:157“Os seus habitantes com socorros dos jesuítas do seucolégio se conservaram algum tempo em a piedade,158e osíndios do distrito, que estes religiosos impediram fossemmaltratados, abraçaram com ânsia a religião católica; masisto durou pouco, e a colônia portuguesa de S. Paulo dePiratininga, sobre a qual os missionários haviam fundado asua maior esperança, veio a ser um obstáculo às suasconquistas espirituais.159 O mal veio primeiramente de outra0 A República de S. Paulo, foi como a de Platão existente só na idéia do impostor,que lhe deu subsistência
6 Impropriamente diz o Autor, que a Vila de S. Paulo está situada sobre o cume deuma montanha: porque não há serra alguma próxima a esta vila, hoje cidade. Ela de- mora em lugar alguma cousa elevado, mas não tanto, que seja difícil a sua expugna- ção, depois de ter chegado o inimigo à borda do campo, 3 léguas distante da cidade. [[[]]]
No dito ano de 1553 criou seu Patriarca Santo Ignácio nova Província independente Manóel da Nóbrega, o qual no ano de 1554 deu princípio ao terceiro colégio nos campos de Piratininga. Na igreja desta nova fundação se disse a primeira missa aos 25 de janeiro, dia em que a Igreja celebra a Conversão do Doutor das Gentes, e por isso ficou chamando-se de São Paulo aquela casa, e depois também uma vila, hoje cidade, que posteriormente se levantou junto ao Colégio em 1560, por súplicas dos padres e ordens do Governador Geral Mem de Sá, o qual extinguiu outra mais antiga, chamada de Santo André, erigido por João Ramalho e seus filhos na borda do Campo, e perto do lugar aonde agora vemos a capela de São Bernardo, obrigando os moradores da primeira a se transmigrarem para o sítio do Colégio, distante coisa de três léguas.
Antes disso havia mudado para o mesmo sítio a sua aldeia o Regulo Tiberiçá, desamparando o solar de seus maiores, que estavam junto ao rio Tietê (o original escreve "Rio Grande"), em distância de meia légua; e vindo fazer a sua casa no solo, que agora ocupa o Mosteiro de São Bento. Também havia se mudado Caiuby ou Cayobig, senhor Iaraybatiba, e outros: depois de se criar vila em São Paulo, todos estes nativos, a quem os portugueses antigos chamavam parceiros e compadres, foram habitar nas aldeias de Pinheiros e São Miguel, povoados nelas senhoras, e naturais de Piratininga.
Esta foi a origem da cidade de São Paulo, e não a fabulosa, que lhe dá o benedito francês D. José Vaissette, na sua História Geográfica Eclesiástica e civil, tom. 12, página 215, da impressão Parisiense de 1755, aonde falando da Colonia de São Paulo, diz:
- Ela deve a sua origem a uma tropa de hespanhóis, portugueses, indianos, mestiços, mulatos, e outros fugitivos, que por se esconderem e fugirem da tirania dos Governadores do Brasil, se ajuntaram neste lugar, e ai se estabeleceram, etc., etc.
Depois de fundada a cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, e nela um Colégio em 1567, extinguiu o Padre Ignácio de Azevedo, Visitador Geral dos Jesuítas, o Colégio de São Vicente, e por ser a terra muito pobre, e as Religiões neles assistentes, mandou-os para o Rio de Janeiro, conservando porém sempre uma casa, que a sua Religião tinha na vila de Santos a qual ao depois foi Colégio com o título de São Miguel.
Pelos anos de 1611 excitaram-se grandes contendas entre os jesuítas e portugueses, moradores nesta Capitania, e as discórdias originadas da liberdade dos nativos que os padres defendiam, talvez com zelo excessivo, vieram produzir o seguinte atentado. [Página 367, 368 e 369]
Memorias para a historia da capitania de S. Vicente
Créditos / Fonte: Boigy "Cadernos da Divisção do Arquivo Histórico e Pedagógico Municipal"
1° de fonte(s) [23952] “Algumas notas genealógicas: livro de família: Portugal, Hespanha, Flandres-Brabante, Brazil, São Paulo-Maranhão: séculos XVI-XIX”. João Mendes de Almeida (1831-1898) Data: 1886, ver ano (68 registros)
Frei Gaspar da Madre de Deus (1715-1800), Memórias para a história da capitania de São Vicente, I, em nota ao § 154, afirma que Pirá-tininga, ou Piratinim, é um ribeiro, afluente do Tieté: e faz referência ao auto de demarcação das terras de Braz Cubas, feito em São Paulo em 1633, além de uma carta de sesmaria, passada por Jorge Ferreira aos 9 de agosto de 1567.
Supõe mesmo que seja o Tamanduatehy. Manuel Eufrásio de Azevedo Marques (1825-1878), porém nos Apontamentos históricos, geográficos, biográficos, estatísticos e noticiosos da província de São Paulo, no nome Piratininga, o refuta com vantagem, dizendo que, se em documentos antigos ha a palavra rio de Piratininga, é significando que pelos campos desse nome passa um rio. Em verdade, não há notícia de tal rio Pirá-tininga. [Páginas 332, 333, 334, 335 e 336]
2° de fonte(s) [24510] “Viagem à provincia de São Paulo e Resumo das viagens ao Brasil, provincia Cisplatina e missões do Paraguai”. Auguste de Saint-Hilaire (1779-1853) Data: 1940, ver ano (95 registros)
Gaspar da Madre de Deus reconhece que a narrativa de Charlevoix sobre as incursões paulistas no Paraguai é exata, muito mais exata do que certos relatos portugueses. [Página 40]
3° de fonte(s) [24536] “História da siderúrgica de São paulo, seus personagens, seus feitos”. Jesuíno Felicíssimo Junior Data: 1969, ver ano (117 registros)
Antes vem o mestre Bartolomeu Fernandes, que o Autor apresenta como Bartolomeu Gonçalves e tinha ainda tratado e respondendo pela alcunha de Bartolomeu Carrasco, ferreiro contratado no Reino para atender, por dois anos, os reclamos de obras de ferro da armada e dos integrantes desse primeiro estabelecimento luso em solo brasileiro.
A alcunha de "Carrasco", no ambiente vicentino de então, era designativa do ofício de "ferreiro". Pondo-se à margem a interpretação dada à alcunha de "Carrasco", o certo é que é Américo de Moura (1881-1953) em "Os Povoadores do Campo de Piratininga", escreve: "Um mestre Bartolomeu, cujo apelido era Carrasco, em 1560, era senhor de terras no planalto à beira do Jurubatuba, e em 1571 já era falecido, tendo deixado herdeiros. [História da siderúrgica de São paulo, seus personagens, seus feitos, 1969. Jesuíno Felicíssimo Junior. Página IV]
Quanto a Bartolomeu Gonçalves, a mesma fonte, Américo de Moura (1881-1953), louva-se em Frei Gaspar (1715-1800), frisando: "Como se lê em Frei Gaspar, em nota à descrição d Santos, veio com Martim Afonso, e durante mais de vinte anos FOI O ÚNICO FERREIRO da Capitania, um mestre Bartolomeu, que primeiro se chamava Domingos Gonçalves, o qual em 1555, tendo mulher e filhas, obteve de Brás Cubas grande sesmaria em Santos".
É certo que este "mestre dos primeiros ferreiros que transpuseram a serra" mudou o nome de batismo de tal forma que, diz Américo de Moura (1881-1953), "poderia disputar a Bartolomeu Antunes a identificação por mim suposta como Bartholomeu Camacho"...
Entretanto, há entre os numerosos Fernandes, um Bartholomeu a que uo autor se refere como "um segundo Bartholomeu Fernandes que a História registra, possivelmente descendente em 1a. linha de seu homônimo reinol", como há, também, outro Bartholomeu Gonçalves, este mameluco, filho do Padre Adão Gonçalves (antes de entrar para a Companhia de Jesus), nascido em 1548, que entrou e faleceu na Companhia (Serafim Leite, História I, 576, 577, "Cartas" III, 191, 353).
Américo de Moura (1881-1953) investigando a origem de Bartholomeu Fernandes não conseguiu descobri-la, mas atribuiu a ele e não à mulher o "nome CABRAL que aparece em sua descendência".
Também, foi ferreiro e era analfabeto. O autor está em plena concordância com as melhores fontes, quando refere que o dito ferreiro "foi intimado e não ensinar seu ofício a um mameluco ou nativo de sua adoção". De fato, em 1579, intimaram-no "a não ensinar o oficio a um nativo que tinha em casa".
E em 1580 (Américo de Moura, 1881-1953), a cominação foi mais forte: era ele obrigado a expulsar de casa o nativo Gaspar". Vê-se que não é fácil deslindar o caso do Mestre Bartholomeu: três pessoas distintas ou uma só, como pretende o Autor, com três nomes diferentes? [Página V]
5° de fonte(s) [27367] “Ana Camacho, descendente de João Ramalho, Décio Martins de Medeiros”, 18.01.2018 Data: 18 de janeiro de 2018, ver ano (187 registros)
Segundo Frei Gaspar da Madre de Deus (1715-1800) em seu livro Memórias para a História da Capitania de S.Vicente, pag. 8: “Esta Ana Camacho era filha de Catarina Ramalho, neta de João Ramalho e bisneta de Tibiriça”. E na pag. 232 “Eu tenho uma cópia do testamento original de João Ramalho, escrito nas notas da Vila de S. Paulo pelo tabelião Lourenço Vaz, aos 3 de maio de 1580”.
6° de fonte(s) [29687] Como os bandeirantes, cujas homenagens hoje são questionadas, foram alçados a “heróis paulistas”. Edison Veiga, de Bled (Eslovênia) para a BBC News Brasil Data: 20 de junho de 2020, ver ano (241 registros)
Os “que vão ao sertão”
Uma pesquisa nas atas da Câmara de São Paulo comprova que o termo bandeirante não existia antes do fim do século 19. “A documentação oficial não se referia a eles nem como bandeirantes nem como sertanistas”, pontua Camargo. “O mais próximo que vi é ´homens que vão ao sertão´.”
Em 16 de maio de 1583, por exemplo, a Câmara registrou a reclamação de Jerônimo Leitão, capitão de São Vicente, indignado com as pessoas que iam "ao sertão" sem sua licença, causando "prejuízo" para a capitania. Ele contava estar "informado de muita devassidão" nessas empreitadas mata adentro.
Camargo aponta o historiador e monge beneditino Gaspar Teixeira de Azevedo (1715-1800), mais conhecido como Frei Gaspar da Madre de Deus, como o primeiro a chamar, em livro, de bandeiras as incursões pelo sertão — o faz em "Memórias Para a História da Capitania de São Vicente", publicado originalmente em 1797. "Mas ele ainda não empregava o termo bandeirantes. Chamava-os apenas de paulistas", atesta Camargo.