Um romance e muitos segredosLogo que ouviu a notícia sobre a presença do Santo Ofício em Olinda, um jovempresidiário – atormentado por seus crimes – solicitou permissão para comparecer à Mesainquisitorial e descarregar sua consciência. Chamava-se Pero Marinho Lobera (18 anos),natural de Redondela, Reino da Galiza, dizia-se preso injustamente, acusado de roubo. Em 21 de novembro de 1593, no tempo da graça, confessou ter cometido diversos atos torpes comum homem, chamado Salvador Romeiro,6em Lisboa.[Há] 3 anos, pouco mais ou menos, que estando ele com Salvador Romeiro, tido porcristão-novo, coxo de um pé [...] homem de meia idade, casado e morador emLisboa, [...] ambos pecaram e consumaram o pecado nefando de sodomia, [...] o qualpecado [praticaram] alternadamente, 25 vezes, [...] sendo o dito Salvador Romeiroagente e ele paciente algumas 12 vezes, e sendo ele confessante o agente penetrandoe consumando no vaso traseiro do dito Salvador Romeiro [...] algumas 13 vezesPero Marinho relatou ainda que, há dois anos, estando na Paraíba, teve ajuntamentonefando com um negro da Guiné, moço de 10 anos, penetrando com seu membro no vasotraseiro do garoto uma vez, mas não ejaculou dentro. Outras vezes tentou penetrar da mesmaforma, mas não teve êxito. Consumou, ainda, “o pecado contra natura de brutalidade”(bestialidade) com uma burra, algumas 15 vezes, “metendo seu membro viril pela natura dadita alimária” e ejaculando dentro como se fosse homem com mulher, isso há 4 anos emLisboa. Noutra ocasião, efetuou o mesmo pecado com outra burra e parece que ninguém osviu.7Para além de diversos atos de sodomia perpetrados com Salvador Romeiro, PeroMarinho disse ter cometido molícies e conatus com um garoto na Paraíba e zoofilia comalgumas burras em Lisboa. Sua confissão (na graça) parece um indício de arrependimento,mas também pode ser interpretada como uma estratégia para preceder a algum delator. Comoveremos adiante, uma denúncia anterior à confissão constituía um agravante. [1]