História da História do Brasil, 1979. José Honório Rodrigues
1979. Há 45 anos
Para o Brasil interessa especialmente a viagem efetuada entre 1541 e 1542, desde as praias de Santa Catarina até o interior do Paraguai. Os estudiosos da expansão territorial, da conquista e do povoamento, das origens das primeiras bandeira~. encontram neste relato muita informaçãopreciosa.
Mais importante foi ainda a reconstituição deste percurso para prova do título brasileiro ao território de Palmas, disputado à República Argentina. Rio Branco esclareceu de dinitivamente a questão, ao traçar o exato caminho seguido pela autoridade espanhola em território brasileiro. Este caminho figurava em Atlas argentinos, ora pela margem setentrional do Iguaçu, ora representado pela margem meridional, passando pelo território então em litígio. Percorrendo os capítulos VI e XI dos Comentários, diz Rio Branco, vê-se que a expedição partindo do rio ltabucu, hoje Itapucu, no litoral deSanta Catarina, subiu a cadeia marítima chamada Serra do Mar, entroupelos campos do planalto de Curitiba, passou da margem esquerda paraa direita do Iguaçu, atravessou o Tibagi e continuou pela margem esquerdadeste afluente do Paranapanema no rumo N.N.O. Depois atravessou outrosrios no rumo do sul, paralelamente ao curso deste último rio, alcançou amargem direita do Iguaçu, logo acima do seu Salto Grande. Desceu entãoo Iguaçu até a sua confluência no Paraná, transpôs este rio e prosseguiuatravés do Paraguai (21 l.A expedição espanhola de 1541, acrescenta Rio Branco, não avistousequer o território de Palmas, e nos próprios comentários encontra-se menção dos Portugueses que dez anos antes por ali haviam passado, descendoo Igúaçu, quando, a mandado de Martim Afonso de Sousa, iam ao descobrimento do Interior (22).Deste modo, o território a leste do rio Pequiri ou Pepiri, depois Peperi Guaçu, foi descoberto por paulistas e não por Cabeza de Vaca. O certoé que o Governo espanhol transmitiu dez anos depois a notícia de queFrancisco Chaves e seus companheiros, que de Cananéia haviam seguidoem direção do Paraguai, haviam sido trucidados pelos indios nas margensdo Iguaçu [História da História do Brasil, 1979. José Honório Rodrigues. Página 12]
Outro roteiro é a "Demonstração dos diversos caminhos que os moradores de São Paulo se servem para os Rios Cuiabá e Província de Cochiponé". A ida é explicada com muita atenção e cuidado, advertindo sobre os perigos e dificuldades, e a volta é muito sumária e, como sempre, voltando para as matas de Botucatú e daí para Sorocaba, e grande porta de penetração ao sertão. [Página 189]
Francisco Adolfo de Varnhagen ofereceu ao Instituto Histórico as "Notícias Práticas das Minas do Cuiabá e Goyases, na Capitania de São Paulo e Cuiabá, que dá o Reverendo Padre Diogo Soares, o capitão João Antônio Cabral Camello, sobre a viagem que fez às Minas de Cuiabá no ano de 1727".
Como os outros, este documento é prático pois procura informar o caminho seguido, as dificuldades encontradas, os riscos que correram e os proveitos ou perdas que tiveram. Do capitão Camello, sabe-se apenas que empreendeu essa viagem de Sorocaba a Cuiabá. "Não poderei informar a V. Rev. com a individuação que pretende, mas o farei na melhor forma que me for possível, porque os contínuos perigos e riscos desta derrota não dão lugar a se entender nada."
A "Notícia" é repleta de informação sobre os nativos da região e basicamente ensina pela experiência o roteiro, seus problemas e as soluções improvisadas. Viaja pelo Rio Grande, Camapuan, Quexim (Coxim), Taquari, Paraguai-Mirim, Paraguai-Assú, Porrudos, Cuiabá onde chega a 21 de novembro de 1727. Fala da vila de Cuiabá com suas oito ou nove casas de telha, e as mais de capim, que se vendiam caro, e mais tarde caíram muito de preço, como as roças, quando as desampararam os donos, retirando-se para São Paulo.
No fim, faz uma espécie de inventário, resumindo as conveniências e inconveniências gerais de Cuiabá. "Verdade é que favoreceu a fortuna mais a alguns, mas foram muito poucos os que tiveram de livrar o principal com que entraram. Eu saí de Sorocaba com quatorze negros e três canoas minhas, perdi duas no caminho, e cheguei com uma e com setecentas oitavas de empréstimo, e gastos de mantimento que comprei pelo caminho; dos negros vendi seis meus, que tinha comprado fiado no Sorocaba, quatro de uns oito que me tinha dado meu tio, e todos dez para pagamentos de dívidas. Dos mais que me ficaram morreram três e só me ficou um único, e o mesmo sucedeu a todos os que fomos ao Cuiabá. Enfim, de 23 canos que saímos de Sorocaba, chegamos só quatorze ao Cuiabá; as nove perderam-se, e o mesmo sucedeu às mais tropas, e sucede cada ano nesta viagem." [Páginas 208 e 209]