Capítulo da História Colonial, 1907. Capistrano de Abreu (1853-1923)
1907. Há 117 anos
Fontes (2)
1536, como se conclue do foral de sua capitania datado de 26de Fevereiro.
Desde Bertioga até o Cabo-Frio continuavam implacáveis os Tupinambás, combatendo e atacando por terra e por mar contra os Peró, e a favor dos Máir. N´um dos combates succumbiu Ruy Pinto. Cunhambebe, truculento maioral tamoyo, guardava entre os outros tropheus o habito e a cruz de Christo d´este cavalleiro.
índios forneciam-lhes os suplementos necessários, e destruí-las era um dos meios mais próprios parasujeitar os donos.Se encontravam algum rio e prestava para a navegação, improvisavam canoas ligeiras, fáceis devarar nos saltos, aliviar nos baixios ou conduzir à sirga. Por terra aproveitavam as trilhas dos índios; emfalta delas seguiam córregos e riachos, passando de uma para outra banda conforme lhes convinha, eainda hoje lembram as denominações de Passa-Dois, Passa-Dez, Passa-Vinte, Passa-Trinta; balizavamse pelas alturas, em busca de gargantas, evitavam naturalmente as matas, e de preferência caminhavampelos espigões. Alguns ficaram tanto tempo no sertão que “volviendo a sus casas hallaron hijos nuevos,de los que teniendolos ya a ellos por muertos, se habian casado com sus mujeres, llevando tambienellos los hijos que habian engedrado en los montes”, informa-nos Montoya. Os jesuítas chamam àgente de S. Paulo mamalucos, isto é, filhos de cunhãs índias, denominação evidentemente exata, poismulheres brancas não chegavam para aquelas brenhas.Faltaram documentos para escrever a história das bandeiras, aliás sempre a mesma: homensmunidos de armas de fogo atacam selvagens que se defendem com arco e frecha; à primeira investidamorrem muitos dos assaltados e logo desmaia-lhes a coragem; os restantes, amarrados, são conduzidosao povoado e distribuídos segundo as condições em que se organizou a bandeira. Nesta monotoniatrágica os Caiapós introduziram mais tarde uma novidade: “a de nos cercar de fogo quando nos achamnos campos, a fim de que impedida a fuga nos abrasemos: este risco evitam já alguns lançando-lhecontrafogo, ou arrancando o capim para que não se lhe comuniquem as suas chamas; outros se untamcom mel de pau, embrulhados em folhas ou cobertos de carvão, por troncos verdes ou paus queimados”.À parte geográfica das expedições corresponde mais ou menos o seguinte esquema: Osbandeirantes deixando o Tietê alcançaram o Paraíba do Sul pela garganta de São Miguel, desceram-noaté Guapacaré, atual Lorena, e dali passaram a Mantiqueira, aproximadamente por onde hoje transpõea E. F. Rio e Minas. Viajando em rumo de Jundiaí e Mogi, deixaram à esquerda o salto do Urupungá,chegaram pelo Paranaíba a Goiás. De Sorocaba partia a linha de penetração que levava ao trecho superior dos afluentes orientais do Paraná e do Uruguai. Pelos rios que desembocam entre os saltos doUrubupungá e Guaiará, transferiram-se da bacia do Paraná para a do Paraguai, chegaram a Cuiabá e aMato-Grosso. Com o tempo a linha do Paraíba ligou o planalto do Paraná ao do S. Francisco e doParnaíba, as de Goiás e Mato-Grosso ligaram o planalto amazônico ao rio-mar pelo Madeira, peloTapajós e pelo Tocantins.As bandeiras no século XVI devastaram sobretudo o Tietê, cujos numerosos Tupiniquins depressadesapareceram, e o alto Paraíba, chamado rio dos Surubis em Piratininga, segundo informa Glimmer;com o tempo foram-se alongando os raios do despovoamento e depredação, característico essencial einseparável das bandeiras.O movimento paulista para o sertão ocidental chocou-se com o movimento paraguaio à procurado mar: Ciudad Real, no Piqueri, próximo do salto das Sete Quedas, Vila Rica, no Ivaí, datam dasegunda metade do século XVI, antes do Brasil cair sob o domínio da Espanha. Com estes colonos agente de São Paulo cultivou a princípio boas relações; nas caçadas humanas foram às vezes sóciosaliados. Além disso a viagem por terra do Paraguai para a costa fazia-se mais facilmente procurandoPiratininga, do que repetindo a incômoda travessia de Cabeza de Vaca. A harmonia entrava assim nointeresse de ambas as partes. Só mais tarde houve conflitos e as duas povoações desapareceram.
Por 1610, jesuítas castelhanos partidos de Asunción começaram a missionar na margem oriental do Paraná. Fundaram Loreto e San Ignacio, no Paranapanema, e em compasso acelerado mais onze reduções no Tibagi, no Ivaí, no Corumbataí, no Iguaçu. Transposto o Uruguai, assentaram outras dez entre o Ijuí e o Ibicuí, outras seis nas terras dos Tape, em diversos tributários da lagoa dos Patos. De San Cristóbal e Jesús María, no rio Pardo, poucas léguas os separavam agora do mar.
Esta catequese grandiosa não consistia simplesmente em verter as orações da cartilha para alíngua geral, fazê-las repetir pela multidão ignara, submetendo-a à observância maquinal do culto externo.“Reduções, escreve um dos jesuítas contemporâneos que mais concorreram para avultarem, chamamosaos povoados dos índios, que vivendo à sua antiga usança, em matos, serras e vales, em escondidosarroios, em três, quatro ou seis casas apenas, separados, uma, duas, três e mais léguas uns de outros, osreduziu a diligência dos padres a povoações grandes e a vida política e humana, a beneficiar algodãocom que se vistam, porque comumente viviam em nudez, ainda sem cobrir o que a natureza ocultava”.
Não se imagina presa mais tentadora para caçadores de escravos. Por que aventurar-se a terras desvairadas, entre gente boçal e rara, falando línguas travadas e incompreensíveis, se perto demoravam aldeamentos numerosos, iniciados na arte da paz, afeitos ao jugo da autoridade, doutrinadas no aba-nheen?
Houve alguns salteios contra as reducções desde o seu começo, mas a energia e o sangue frio dos jesuitas contiveram os arreganhos dos mamalucos, que se retiraram proferindo ameaças. Para pol-as em pratica precisavam, porém, da connivencia da gente de Asuncion. Isto conseguiram em fins de 628, e muito concorreu para assegural-a Luis Cespedes Xeria, governador do Paraguay, casado em familia fluminense, senhor de engenho no Rio. Fez por terra a viagem para seu governo; esteve em Loreto do Pirapó, e Santo Ignacio de Ipãumbuçu, admirou as igrejas, «hermosísimas iglesias, que no Ias he visto mejores en Ias índias que he corrido dei Peru y
, e fez signal aos bandeirantes para avançarem. A primeira das reducções invadidas, a de S. Antônio, demorava na margem direita do Ivahy; invadiram depois San Miguel, Jesus Maria, San Pablo, San Francisco Xavier, no Ti-bagy; as outras ainda mais depressa do que as aggremiara uma inspiração ideal foram successivamente destruidas pela fúria de-vastadora. Restavam apenas as de Loreto e San Ignacio, no Parapa-nema ; os jesuitas resolveram transplantal-as para abaixo do salto das Sete Quedas, entre o Paraná e o Uruguay, doloroso êxodo cuja narrativa ainda hoje penalisa. Depois de devastadas as mis-sões de Guairá os mamalucos passaram ás do Uruguay e dos Tapes. A entrada em Jesus Maria, no rio Pardo, já em águas da lagoa dos Patos, qual a descreve Montoya, dará idéa resumida dos processos empregados nestas expedições.
No dia de São Francisco Xavier (3 de Dezembro de 1637), estando celebrando a festa com missa e sermão, cento e quarenta paulistas com cento e cincoenta tupis, todos muito bem armados de escopetas, vestidos de escupis, que são ao modo de dalmaticas estofadas de algodão, com que vestido o soldado de pés a cabeça peleja seguro das setas, a som de caixa, bandeira tendida e or-dem militar, entraram pelo povoado, e sem aguardar razões, acom-mettendo a igreja, disparando seus mosquetes. Pelejaram seis horas, desde as oito da manhã até as duas da tarde. Visto pelo inimigo o valor dos cercados e que os mortos seus eram muitos, determinou queimar a igreja, aonde se acolhera a gente. Por trez vezes tocaram-lhe fogo que foi apagado, mas áquarta começou a palha a arder, e os refugiados viram-se obriga-dos a sahir. Abriram um postigo e sahindo por elle a modo de rebanho de ovelhas que sae do curral para o pasto, com espadas, machetes e alfanjes lhes derribavam cabeças, truncavam braços, desjarretavam pernas, atravessavam corpos. Provavam os aços de seus alfanjes em rachar os meninos em duas partes, abrir-lhes as cabeças e despedaçar-lhes os membros. Compensará taes horrores a consideração de que por favor dos bandeirantes pertencem agora ao Brasil as terras devastadas?
Apenas vagamente se conhece o caminho seguido nas bandeiras contra Guairá, Uruguay e Tapes. Certamente Sorocaba, ultimo povoado, representava papel importante. Em canoas ou balsas feitas no planalto desciam os rios, e uma ou outra que garrava servia de aviso do perigo imminente ás reducções; eram, pois, viagens mixtas. Á volta, as jornadas deviam ser inteiramente por terra; de outro modo não poderiam trazer as chusmas de prisioneiros de colleira, amarrados uns aos outros.
Que destino davam a esta gente ? Diz-nos Montoya que eram empregados em transportar nas costas para a marinha carne de vacca e porco; naturalmente carregariam sal na volta; outros passavam para o Rio, onde havia interessados nestas piratarias; outros finalmente juntavam-se nas fazendas dos administradores. Em campanha «Ias mujeres de buen parecer, casadas, solteras ó gentiles, ei dueho Ias encerraba consigo en un aposento, con quien pasaba Ias noches ai modo que un cabron en un curral de cabras ». O numçro considerável dos escravisados nas reducções je-suiticas manifesta-se na freqüência de Carijós, posteriormente en-contrados nos logares mais distantes de sua primitiva assistência: Carijós chamavam, em São Paulo aos Guaranys. Estes indios, devidamente amestrados, serviam também para as conquistas de outros; eram o grosso das forças dos bandeirantes, cujo papel se limitava ao de officiaes. Os successos dos Tapes provaram mais uma vez não haver remédio en Asuncion, Rio ou Bahia. Os missionários esperavam ser mais felizes no alem-mar e embarcaram Antônio Ruiz de Montoya para Madrid, Francisco Dias Taho para Roma. Conseguio este bul-las e censuras fulminantes, trouxe aquelle as ordens mais precisas [Página 104]
Não se imagina presa mais tentadora para caçadores de escravos. Por que aventurar-se a terras desvairadas, entre gente boçal e rara, falando línguas travadas e incompreensíveis, se perto demoravam aldeamentos numerosos, iniciados na arte da paz, afeitos ao jugo da autoridade, doutrinados no abanheem?
Houve alguns salteios contra as reduções desde o seu começo, masa energia e o sangue-frio dos jesuítas contiveram os arreganhos dosmamalucos, que se retiraram proferindo ameaças. Para pô-las em práticaprecisavam, porém, da conivência da gente de Asunción. Isto conseguiram em fins de 628, e muito concorreu para assegurá-la Luís CéspedesXeria, governador do Paraguai, casado em família fluminense, senhor deengenho no Rio. Fez por terra a viagem para seu governo; esteve emLoreto do Pirapó e Santo Ignacio de Ipãumbuçu, admirou as igrejas,"hermosísimas iglesias, que no las he visto mejores en las Indias que he corrido delPerú y Chile", e fez sinal aos bandeirantes para avançarem.A primeira das reduções invadidas, a de S. Antônio, demorava namargem direita do Ivaí; invadiram depois San Miguel, Jesús María, SanPablo, San Francisco Xavier, no Tibagi; as outras, ainda mais depressado que as agremiara uma inspiração ideal, foram sucessivamente destruídas pela fúria devastadora. Restavam apenas as de Loreto e San Ignacio, no Paranapanema; os jesuítas resolveram transplantá-las parabaixo do salto das Sete Quedas, entre o Paraná e o Uruguai; dolorosoêxodo cuja narrativa ainda hoje penaliza. Depois de devastadas asmissões de Guairá, os mamalucos passaram às do Uruguai e dos Tape.A entrada em Jesús María, no rio Pardo, já em águas da lagoa dosPatos, qual a descreve Montoya, dará idéia resumida dos processos empregados nestas expedições.
No dia de São Francisco Xavier (3 de dezembro de 1637), estando celebrando a festa com missa e sermão, cento e quarenta paulistas com cento e cinqüenta tupis, todos muito bem armados de escopetas, vestidos de escupis, que são ao modo de dalmáticas estofadas de algodão, com que vestido o soldado de pés à cabeça peleja seguro das setas, a som de caixa, bandeira tendida e ordem militar, entraram pelo povoado, e sem aguardar razões, acometendo a igreja, disparando seus mosquetes. Pelejaram seis horas, desde as oito da manhã até as duas da tarde. [Página 111]
Visto pelo inimigo o valor dos cercados e que os mortos seus eram muitos determinou queimar a igreja, aonde se acolhera a gente. Por três vezes tocaram-lhe fogo que foi apagado, mas à quarta começou a palha a arder e os refugiados viram-se obrigados a sair.
Abriram um postigo e saindo por ele a modo de rebanho de ovelhas que sai do curral para o pasto, com espadas, machetes e alfanjes lhes derribavam cabeças, truncavam braços, desjarretavam pernas, atravessavam corpos. Provavam os aços de seus alfanjes em rachar os meninos em duas partes, abrir-lhes as cabeças e despedaçar-lhes os membros.Compensará tais horrores a consideração de que por favor dos bandeirantes pertencem agora ao Brasil as terras devastadas?
Apenas vagamente se conhece o caminho seguido nas bandeiras contra Guairá, Uruguai e Tape. Certamente Sorocaba, último povoado, representava papel importante. Em canoas ou balsas feitas no planalto desciam os rios, e uma ou outra que garrava servia de aviso do perigo iminente às reduções; eram, pois, viagens mistas.
À volta, as jornadas deviam ser inteiramente por terra; de outro modo não poderiam trazer as chusmas de prisioneiros de coleira, amarrados uns aos outros.
Que destino davam a esta gente? Diz-nos Montoya que eram empregados em transportar nas costas para a marinha carne de vaca eporco; naturalmente carregariam sal na volta; outros passavam para oRio, onde havia interessados nestas piratarias; outros finalmente juntavam-se nas fazendas dos administradores. Em campanha "las mujeresque en este, y otros pueblos (que destruyeron) de buen parecer, casadas, solteras o gentiles, el dueño las encerraba consigo en un aposento, con quien pasaba las noches almodo que un cabron en un curral de cabras".O número considerável dos escravizados nas reduções jesuítas manifesta-se na freqüência de carijós, posteriormente encontrados nos lugares mais distantes de sua primitiva assistência: carijós chamavam emSão Paulo aos guaranis. Esses índios, devidamente amestrados, serviamtambém para as conquistas de outros; eram o grosso das forças dos bandeirantes, cujo papel se limitava ao de oficiais.Os sucessos dos Tape provaram mais uma vez não haver remédioem Asunción, Rio ou Bahia. Os missionários esperavam ser mais felizesno além-mar e embarcaram Antonio Ruiz de Montoya para Madri, Francisco Dias Taño para Roma. Conseguiu este bulas e censuras fulminantes, trouxe aquele as ordens mais precisas e encarecidas para as autoridades coloniais. Tudo perdido. Conhecidas as letras pontifícias no Rio,alborotou-se a população, e a bula ficou suspensa. A irritação propagouse pela marinha e intensificou-se em serra acima. Defendidos por seucaminho inexpugnável, os paulistas expulsaram os jesuítas que só voltaram anos depois, à força de negociações e concessões. Implantou-se,portanto, o sistema seguido nas terras espanholas de encomendas ou administração dos índios; algumas encomendas por testamento couberamfinalmente à Companhia de Jesus. Imagina-se mal neste figurino oportunista a consciência heróica de Manuel da Nóbrega.Montoya conseguiu licença para aparelhar os índios com armas defogo e adestrá-los na arte militar. Em breve os bandeirantes perderam asuperioridade: derrotados, procuraram conquistas mais fáceis, na serrade Maracaju, no alto Paraguai, entre os chiquitos, e por fim entre o gentio de corso, de língua travada. Esta caçada não rendia tanto, as bandeiras foram perdendo parte dos primeiros atrativos e decaíram. Das reduções destruídas nunca mais se restabeleceram as de Guairá e dosTape; no Uruguai foram novamente fundados sete povos, mais tarde incorporados ao Brasil, como veremos.Melhores serviços prestaram os paulistas na Bahia e ao norte do rioSão Francisco. Em torno do Paraguaçu reuniram-se tribos ousadas e valentes, aparentadas aos aimorés convertidos no princípio do século, queinvadiram o distrito de Capanema, trucidaram os moradores e vaqueirosdo Aporá, e avançaram até Itapororocas. Pouco fizeram expediçõesbaianas mandadas contra eles, e houve a idéia de chamar gente de SãoPaulo. Acudindo ao convite Domingos Barbosa Calheiros embarcou emSantos; na Bahia se dirigiu para Jacobinas, mas deixou-se iludir porpaiaiás domesticados, e nada fez de útil. Acompanhando-o na jornadamais de duzentos homens brancos, raros tornaram do sertão.
Com este malogro não admira se repetissem as incursões de tapuias, a ponto de a 4 de março de 1669 ser-lhes declarada guerra e outravez convidados paulistas para fazê-la. Em agosto de 1671 chegou a genteembarcada, com cuja condução a câmara do Salvador despendeu maisde dez contos de réis. Eram dois os chefes principais, Brás Rodrigues deArzão e Estêvão Ribeiro Bairão Parente. [Páginas 112 e 113]
1° de 2 fonte(s) [29450] O Bacharel de Cananeia, por Elizandra Aparecida Nóbrega, ovaledoribeira.com.br Data: 7 de fevereiro de 2019, ver ano (202 registros)
Sabemos que o Bacharel, após aquela famosa desavença, recolheu-se a São Vicente, onde deve ter permanecido algum tempo, ocasião em que foi contemplado com a sesmaria em questão. É certo que, já em 1536, retornou a Cananeia, pois esse ano a Rainha de Portugal, Izabel, escreveu ao Bacharel pedindo-lhe que prestasse todo o auxílio ao navegador Gregório de Pesquera Rosa, que viria ao Brasil em busca de especiarias. Essa expedição, no entanto, nunca chegou ao seu destino.
Capistrano de Abreu nos informa em seus “Capítulos de História Colonial” que os primeiros colonos que vieram ao Brasil subordinavam-se a dois tipos extremos:
“uns sucumbiram ao meio, ao ponto de furar lábios e orelhas, matar os prisioneiros segundo os ritos, e cevar-se em sua carne; outros insurgiram-se contra ele e impuseram sua vontade, como o bacharel de Cananeia, que se obrigou a fornecer quatrocentos escravos a Diogo Garcia, companheiro de Solis, um dos descobridores do Prata.”
Diz, ainda, mestre Capistrano que, no processo de desbravamento e povoamento de nosso país, existiram três tipos de povoadores, ou seja: “o que não reagia e se submetia, o voluntarioso e indomável e o medíocre ou conciliador, que vivem bem uns com uns e outros, europeus e indígenas.” Segundo esse autor, os jesuítas empregaram seus esforços para que sobrevivesse o segundo tipo. Aquele “que se impunha, dominava, tornava-se verdadeiro régulo, como aquele bacharel de Cananeia.” Tirar o medo aos cristãos, senhorear gentio da terra pela guerra, amedrontá-lo com grandes ameaças, esta foi a conduta do bacharel, coadjuvada pelos jesuítas e adotada especialmente por Mem de Sá.
O Bacharel era figura bastante conhecida pelos antigos navegadores. Mantinha com eles laços de amizade e até mesmo intercâmbio comercial. Quando o navegador português Diogo Garcia de Moguer passou por São Vicente em 1527, encontrou um bacharel que ali se achava desterrado. Emm sua “Memória de la Navegación”, Garcia registrou que ali residiam, entre outros, o bacharel Cosme Fernandes e seus genros Gonçalo da Costa e Francisco de Chaves, que receberam os navegantes “de braços abertos”.