terça-feira, em favor dos operários”. Em seguida, citava o exemplo das “IndustriasReunidas Matarazzo” e finalizava, referindo-se ao “sr. comm. Ermelino Matarazzo”,como merecedor dos “mais francos elogios e os nossos mais vivo (sic) votos são de queencontre imitadores” (CRUZEIRO DO SUL, 23 nov. 1918, p.2). Em outro artigo, de24/11/1918, intitulado “A situação dos operarios”, noticia o fato de mais umestabelecimento industrial de São Paulo “acudir ao appello da Cruz Vermelha em favordos operarios” e continua:Nos grandes balanços das emprezas industriaes o onus duma quinzena devencimentos pode ser supportado sem perigo de sua consistencia financeira,em benefício de familias inteiras de operarios às quaes a falta dumaquinzena de salarios quer dizer miseria, fome e mesmo, às vezes, expulsão dacasa em que habita. (CRUZEIRO DO SUL, 24 nov. 1918, p. 2, grifo meu)O fato de o artigo mencionar a possível expulsão dos operários de suas casaspela falta ao trabalho, é sintomático, pela razão de que o texto poderia estar fazendoalusão ao caso da vila operária da fábrica Santa Rosália, em que as moradias dostrabalhadores pertenciam à empresa.
Para compreender melhor o episódio é necessário entender a situação das vilasoperárias na cidade. O Almanach Illustrado de Sorocaba para 1914, ao mostrar a importância da fábrica Santa Rosália, descreve sua vila operária, “com a pittorescacasaria uniforme, alinhada em ruas direitas e bem, conservadas, ostentando no planoprincipal a sua grande fabrica de tecidos” (Almanach Illustrado de Sorocaba para 1914,p. 52). Em seguida, continua:
De construcção moderna e hygienica, a Villa Santa Rosalia, que representaem si a eloquencia do progresso, progride dia a dia, a fim de abrigar ascentenas de operários que impulsionam a industria com o seu trabalhovalioso; aquelles grupos de habitações, modestas ruas que agradam á vista,resumem, juntamente com o edificio da maquinaria, a garantia de uma vidasem grandes preocupações a muitas familias, ás quaes a lucta pela existenciase tornou menos pezada, graças á iniciativa do capitalista benemerito.(...)A Villa, annexa a esta [fábrica Santa Rosália], é organisada de 270 casas,escolas publicas, consultorio medico, armazém, casa de diversões, etc, sendomagnífica a sua illuminação electrica e perfeito o serviço de encanamento deágua. (idem., p. 52-53)
O texto de Francisco Camargo Cesar, um jornalista local, faz uma descriçãoidealizada da vila operária. Além de frases como “ruas que agradam a vista” e “garantiade uma vida sem grandes preocupações a muitas familias”, o autor ainda classifica como “magnifica” a iluminação elétrica e “perfeito” o serviço de encanamento de água.De acordo com Carvalho, “em 1914, a cidade estava muito longe de estar saneada e arede de água e esgotos, assim como a iluminação elétrica atendia, e mesmo assim deforma precária, uma parte do núcleo urbano da cidade” (CARVALHO, 2008, p. 63).Sendo que a vila e a fábrica em questão ficavam afastadas “um kilometro da cidade”(idem), como afirma o próprio Camargo Cesar.Descrição bem diferente nos fornece Jacob Penteado, ao relatar o período queviveu na mesma vila, nos primeiros anos do século XX:Em 1900, ano de meu nascimento, a empresa era próspera (...). Na encostada colina, havia várias ruelas de casas rústicas, com telhas vãs, onde, ànoite, o vento executava sua lúgubre sinfonia. Nada de instalações sanitáriasou iluminação. Esta era à base de velas ou de lampiões a querosene. Água,só de poço ou do rio próximo. Os moradores, para suas necessidades,recorriam aos urinóis ou, então, iam defecar no mato que cercava ascasinholas.O horário de trabalho era bem amargo. Os operários entravam às cinco damanhã, (...). Tinham quarenta e cinco minutos para almoço, às onze horas.Depois continuavam sua faina, que ia até as oito horas da noite (...).(PENTEADO, 1962 apud BONADIO, 2004 p. 222)No ano referido por Penteado, a cidade ainda não contava com uma rede de águae esgotos. Segundo Carvalho, sua construção só seria iniciada em 1901 e finalizada noano seguinte. Porém, como mencionado acima, funcionou apenas em parte do centrourbano e de forma deficiente.Portanto, além das péssimas condições de moradia e das longas e estafantesjornadas de trabalho mencionadas por Penteado, outros problemas eram enfrentadospelos moradores da referida vila. Segundo Araújo Neto,Dentro de vilas fechadas, como a da Fábrica Santa Rosália, localizada empropriedade rural de mesmo nome, (...) os operários estavam quase quetotalmente submetidos à autoridade do capitalista: durante o horário detrabalho e fora dele, pois residiam e trabalhavam em sua propriedade,estando por isso sujeitos às regras impostas por ele. (ARAÚJO NETO, 2005,p. 39)Em 1910, o jornal O Operario em um artigo intitulado “Feudalismo em 1910”denuncia a ausência de liberdade dos moradores das vilas operárias da cidade:(...) Hoje, que se proclama liberdade em todos os cantos, que leis sobre leistem sido decretadas para garantia individual, causa pasmo o desleicho dasmunicipalidades, em não legislarem sobre as organisações das villasoperarias. (...) [Páginas 12 e 13]