os exploradores chegaram aos locais mais distantes. A expansão e os avanços que se sucederam através da navegação no Rio Tietê, a exploração das várzeas e daí aos caminhos que tiveram acesso os conquistadores para avançar pelo interior do território ainda inexplorado, esses fatores nos fornecem uma com-preensão bastante precisa sobre as origens do Tatuapé, quando tomamos os avanços realizados pelos desbravadores na direção leste, desde Piratininga.
Os primeiros povoamentos que se desenvolveram a leste da vila, surgem com as atividades dos colonizadores, depois que colocaram os pés sobre a ex-tensa planície povoada pelas aldeias indígenas. No alto da colina primordial, onde se estabeleceram os jesuítas em 1554, celebrando a primeira missa no lugar que já se chamou Casa de Piratininga, seus habitantes seriam citados pelos padres como piratininganos. Essa colina era cercada pelos tortuosos traçados de dois rios: a leste, espalhando-se em várzeas, o Rio Tamanduateí e a oeste pelo Ribeirão Anhangabaú que nele deságua. Mais ao norte estava o Rio Tietê, que recebia as águas do Tamanduateí, conforme esclareceu a professora de História do Brasil da Universidade Católica de Santos, Wilma Therezinha Fernandes de Andrade, historiadora com vários livros e artigos publicados em jornais e revistas. “Piratininga era o local da taba do Tibiriçá. Ele tinha uma aldeia, onde hoje é o centro de São Paulo. Quando chegam os jesuítas, eles convertem o Tibiriçá ao catolicismo. Convertido ele fica inteiramente à disposição dos jesuítas e indica a eles qual o melhor lugar para fundarem sua escola, na verdade era um centro de catequese. Aquela região toda do planalto era repleta de índios e o Tibiriçá era o grande cacique. Ele conhecia a região, porque morava lá, e indica o local aos jesuítas.” 1
A taba de Tibiriçá, ou seja, a aldeia do povo Tupiniquim do qual era o grande chefe, ficava na extensão do que conhecemos atualmente como Centro Histórico de São Paulo. Depois da chegada dos jesuítas, a oca de Tibiriçá – sua casa propriamente dita – tinha como endereço a área onde hoje está o Mosteiro de São Bento. O local para a moradia dos padres, onde seria erguida sua “casa”, foi indicado ao padre Manoel da Nóbrega pelo líder indígena e é aquele que conhecemos como Pátio do Colégio. Ali a história de São Paulo teria o seu começo, com vista privilegiada para uma colina que ficava ao longe na direção leste, depois da extensa planície em parte inundável pelo rio do grande tamanduá.
Atualmente, os dois rios que ajudaram moldar aquele centro de catequese, que logo acolheu índiose colonos e se tornou um povoado, estão canalizados. O Tietê, por sua vez, foi totalmente desfigurado ao longo do seu percurso urbano. Mas, ainda é cedo para avaliarmos as inúmeras dores de cabeça que o avanço da “civilização” demandará.
O importante agora é o sonho de Nóbrega: fundar uma comunidade pura, voltada para a religiosidade e o trabalho, cujos elementos e mão de obra estão totalmente disponíveis e até solícitos; os nativos ofereciam ajuda e se submetiam aos padres, entretanto havia os contrários.
Nesta viagem às origens do Tatuapé, toma-se conhecimento de longínquos registros históricos. Entre eles, constata-se que existem divergências; às vezes interpretações ambíguas. Além disso, há versões sobre fatos históricos que superam o aprendizado dos tempos escolares e só são encontradas respostas com mais clareza e profundidade nos bancos acadêmicos. Neste percurso, chega-se a defrontar com afirmações que indicam a relação do colonizador português Braz Cubas com a origem do bairro desde 1540 ou 1551, atribuindo essa relação a uma sesmaria.
Essa concessão em terras de Martim Afonso fazia divisa com a de Pero de Góes. Em levantamento comprovado pelas pesquisas da professora Wilma Therezinha, o escudeiro e o guerreiro da Corte portuguesa, foram vizinhos.
“Realmente o Martim Afonso doou sesmarias em Piratininga. A primeira sesmaria doada no Brasil foi a de Pedro de Góis. Resumidamente, essa sesmaria começava no Largo do Caneú, defronte a Serra de Taperovira que depois vai se chamar Serra do Quilombo, seguia pelo planalto até o Rio Tietê, passando por um Pinhal na passagem chamada Conceição, alcançava o Caminho de Piratininga, encontrando com a Serra de Paranapiacaba, descendo pelo Vale do Ururay que hoje é o Rio Mogi até a Ilha de Caremacoara na Barra de Cubatão, até o Largo do Caneú. A sesmaria de Braz Cubas se limitava com a de Pedro de Góis.”
Os mapas antigos consultados para esta viagem, no entanto, não apresentam um local chamado Tatuapé, que só será visto muito tempo depois.
Portanto, seria mais lógico dizer de maneira mais abrangente, que Braz Cubas conheceu suas terras até onde pode chegar e povoar, ou seja, nas proximidades do Rio Tietê na extensão das suas posses, onde surgiriam outros tantos povoados que se tornariam bairros e municípios, mas que nem por isso foi atribuída ao fiel escudeiro de Martim Afonso a fundação dos mesmos. No Anexo IV, que se encontra no final deste livro, será possível observar os limites da concessão de sesmaria feita a Braz Cubas [Página 3 do PDF]
Mapa da região de Santos e São Vicente, mostrando a chegada da Armada de Martim Afonso de Sousa, e a distribuição conhecida de uma parte da sua gente, situação que ainda se conservava em 1534.
A – Tomando por base o “Diário da Navegação”, vê-se aqui o trajeto provável da Armada de Martim Afonso, ao chegar de fora e ao penetrar na “abra” do “Porto de São Vicente”.B – Ponto da “abra” do “Porto de S. Vicente”, onde fundeou a Armada pela primeira vez, abrigando-se do mau tempo – “ESTA NOITE NO QUARTO DA MODORRA FOMOS SURGIR DENTRO NA ABRA, EM FUNDO DE SEIS BRAÇAS DE AREIA GROSSA”.
C – Praia da “Ilha do Sol”, onde a 21 de janeiro teria fundeado a Armada (atual Praia do Góes, na Ilha de Santo Amaro) – “SEGUNDA-FEIRA VINTE E UM DE JANEIRO DEMOS A VELA E FOMOS SURGIR NUMA PRAIA DA ILHA DO SOL; PELO PORTO SER ABRIGADO DE TODOS OS VENTOS”.
D – O “Porto das Naus”, fronteiro ao “Porto de S. Vicente”, onde fundeou a Armada de Martim Afonso, na tarde do dia 22 de Janeiro – “TERÇA-FEIRA PELA MANHÃ FUI NUM BATEL DA BANDA A LESTE DA BAHIA E ACHEI UM RIO ESTREITO E A TARDE METEMOS AS NAUS DENTRO COM O VENTO SUL”.E – O verdadeiro “Porto de S. Vicente” onde a 22 de janeiro desceu em terra Martim Afonso, mandando fazer uma casa para guardar as velas e a enxárcia dos navios, e onde mandou por a seco uma das naus da expedição, presumivelmente a capitânia. – “COMO FOMOS DENTRO MANDOU O CAPITÃO JÁ FAZER UMA CASA EM TERRA PARA METER AS VELAS E ENXÁRCIA. AQUI NESTE PORTO DE SÃO VICENTE VARAMOS UMA NAU EM TERRA”.
1 – Outeiro de Santa Catharina, onde se estabeleceu o fidalgo Luiz de Góes.
2 – Ponto da ilha, onde se fixaram Paschoal Fernandes e Domingos Pires.
3 – Encostas do morro de “S. Jerônimo” (atual Monte Serrat) onde ficou Braz Cubas, (então moço de vinte e três anos).
4 – Ponto onde se localizaram os nobres José, Francisco e Paulo Adorno, irmãos de origem genovesa, e onde fundaram o “Engenho de S. João” em 1533.
5 – Lugar em que se estabeleceu o ferreiro da Expedição, Mestre Bartholomeu Gonçalves ou Fernandes.
6 – Aqui ficou e obteve sesmaria, o fidalgo Jorge Ferreira, mais tarde casado com uma filha de João Ramalho. Este lugar chama-se “Itapema”.
7 – Ilha Pequena (atual Barnabé) onde ficou Henrique Montes, “prático da região e guia da Armada de Martim Afonso”. Assassinado Montes em 1534 ou 35, passou esta ilha com as terras de Jurubatuba à propriedade de Braz Cubas.
8 – Aqui ficou o fidalgo Pero de Góes, com sesmaria. Era irmão de Luiz de Góes e fundou o grande “Engenho da Madre de Deus” com Capela.
9 – Neste lugar se estabeleceu o fidalgo Rui Pinto.
10 – Neste ponto, à margem do Rio Cubatão, se estabeleceu Francisco Pinto, pai do fidalgo Rui Pinto. Mais tarde, estas terras parecem ter passado à propriedade do nobre Antonio Rodrigues de Almeida.
11 – Terras do Antonio Rodrigues, a ele doadas alguns anos antes da chegada de Martim Afonso, pelo Governador das terras do Brasil Cristovão Jacques, sendo Capitão do povoado de S. Vicente, Pero Capico.