Descrevendo a genealogia de Francisco Bueno Luiz da Fonseca e seus filhos, PedroTaques, sobre uma de suas filhas informa:
1) “Dona Isabel Bueno da Fonseca, casou com Bartolomeu Bueno do Prado, capitãomor ajudante das Minas do Jacuí. Foi governador da expedição, que por ordem régia,que fez executar o governador José Antônio Freire de Andrade contra os foragidos esalteadores, que passavam de 1.000 pretos da Costa da Guiné, que ficaraminteiramente destruídos. Foi filho do capitão-mor Domingos Rodrigues do Prado. Emtítulo de Prados. Faleceu em janeiro de 1768; jaz sepultado na capela do Rosário,freguesia das Carrancas da Comarca de São João Del Rei”1.
Analisemos ecomentemos essas informações:A) Dona Isabel, a mulher de Bartolomeu, era irmã de Diogo Bueno da Fonsecaque, juntamente com seu cunhado Bartolomeu, atacou o Quilombo do Cascalhoem 1760. Fizeram experiência aurífera em todo o território das batalhas de 1759e tomaram posse da Sesmaria do Quilombo do Ambrósio (destruído em 1746)situado a norte da atual cidade de Cristais – MG2. Diogo continuou residindoem Carrancas e Bartolomeu foi morar do Arraial do Jacuí3.B) “Bartolomeu Bueno do Prado, capitão-mor ajudante das Minas do Jacuí” –esse fato é confirmado por muitos documentos, inclusive pelo IMAR-MG, Cx.155, Doc. 7, AHU, 09.12.1800, onde várias testemunhas repetiram “que sabepor ver que é certo, logo que se fez a dita conquista acudiu povo numerosoàquele sertão por haver ouro, e se edificou uma povoação chamada Senhora daConceição de São Pedro de Alcantra (e Almas) do Jacuí, onde se edificou umregistro de contadoria com vezes de intendência comissária e na qual setrocam os dinheiros da Sua Majestade e mais não disse desta”4. As magníficasruínas dessa Intendência podem ser vistas até hoje na cidade de Jacuí - MG5. A [p. 1 do pdf]
1763, quando morreu Gomes Freire sem filhos, passando muito depois o seu título deconde de Bobadela a seu irmão José AntônioB) Tratava-se mesmo de “um quase reino de pretos foragidos”, pois, cada quilombotinha seu rei e estado e, todos eles, obedeciam ao rei do Quilombo do Ambrósio, comoatestou o próprio Gomes Freire de Andrade em correspondência ao ministro da Coroa,Thomé Joaquim da Costa Corte Real, em dezembro de 1759, referindo-se ao AmbrósioII de Ibiá (encontrado evacuado), de que os quilombos eram todos “subordinados a ummaior, donde residia a negra corte e o chamado Rei a que os mais obedeciam”19.Veja-se, pois, que Taques registrou corretamente esse fato de 1759 em benefício dodireito de vingança dos nobilíssimos paulistas, os Lara de Goiás, por um fato ocorridoantes do ano de 1751.C) Fica evidente, também, que, para catalogar os dados genealógicos, Taques deve terse utilizado de um sistema de fichas ou folhas de papel arquivadas na ordem quequisesse, nas quais, durante a sua vida, foi acrescendo informações na medida em quepesquisava e, ao final, utilizando uma classificação familiar-numérica, escreveu suasbrochuras ou livros manuscritos que, muito depois, vieram a ser copiados e recopiadosno Brasil e em Portugal20.D) A expressão “que ocupavam a campanha desde o rio das Mortes até o Grande, quese atravessa na estrada de São Paulo para Goiases”. Note-se que a “estrada de SãoPaulo para Goiases” NÃO é a Picada de Minas para os Goiases. Essa estrada, semdúvida é aquela que passava pelos Sertões do Jacuí, entre os rios Sapucaí e Pardo(afluentes esquerdos do rio Grande), tendo ao centro os rios São João e São Pedro deAlcantra (sic) do Jacuí, caminhos percorridos inversamente – da barra do rio Sapucaíno Grande, no rumo a São Paulo – por Bartolomeu Bueno do Prado em 175921 e porLuiz Diogo em 176422. Veja-se que, aqui, Taques omitiu o ataque aos quilombos doBambuí, Indaiá (margem direita do rio São Francisco) e, novamente, os quilombos doAmbrósio II e Pernaíba (atual Triângulo Mineiro).
3.1.2 – Transcrevamos o final do verbete “José de Almeida Lara” legado por PedroTaques em seu Nobiliarquia Paulistana: “artolomeu Bueno desempenhou tanto oconceito que se formava do seu valor e disciplina da guerra contra esta canalha, quese recolheu vitorioso, apresentando 3.900 pares de orelhas dos negros, que destruiuem quilombos, sem mais prêmio que a honra de ser ocupado no real serviço, comoconsta dos acórdãos tomados em Câmara de Vila Rica sobre esta expedição, e o efeitodela para total segurança dos moradores daquela grande capitania” 23. [p. 6 do pdf]
quase 100% dos quilombolas desse quilombo. Ora, se nesses dois quilombosBartolomeu Bueno do Prado e suas tropas mataram quase 100% dos quilombolas, porque não teriam feito o mesmo nos demais quilombos da Confederação do CampoGrande? Evidente, pois, que os 3.900 pares de orelhas noticiados por Pedro Taquesdevem se referir apenas aos quilombolas que Bartolomeu teria matado pessoalmente.f) A maioria das testemunhas do Processo de Justificação do neto de BartolomeuBueno do Prado, disseram que sabiam das batalhas do Campo Grande e Sertões doJacuí “por ver”, ou seja, porque estiveram presentes e participaram dos ataques aosquilombos. Uma delas, “Sebastião Pimenta Ribeiro, homem branco, casado, moradorna freguesia das Lavras onde vive de sua lavoura, de idade de setenta” e tantos anos,perguntando porque sabia que o justificante era quarto neto de Amador Bueno daRibeira, respondeu que era “pela razão de achando-se ele testemunha há muitos anos(antes de 1775) na cidade de São Paulo e na diligência de uma Inquirição de Gênere(busca genealógica sobre alguém) e, procurando saber certa circunstância aosargento-mor Pedro Taques, este mostrou a ele testemunha um livro donde contava aascendência da família do justificante, além de ser notório”32. Portanto, Pedro Taquesconversou pessoalmente com uma testemunha ocular de todo o genocídio praticadocontra os quilombolas do Campo Grande. Evidente que ficou sabendo de tudo o queteria acontecido naquelas batalhas. Portanto, onde é que estão os argumentos daquelesque sempre tentaram negar até mesmo essa notícia dos 3.900 pares de orelha que nosfoi legada pelo historiador e linhagista Pedro Taques?
Como estamos noticiando há quase trinta anos, as supressões, mutilações, distorções efalsificações de documentos – a exemplo da suposta viagem de Pamplona e da supostaCarta da Câmara de Tamanduá à Rainha - levaram a erro gerações e gerações dehistoriadores e permitiram ao monarquismo-reverencial e ao racismo nadarem debraçadas na manutenção da ideia de que os negros sempre foram subservientes e quesomente foram remidos da escravidão pela bondade da princesa Isabel, a redentora –insinuando que, caso contrário, seriam escravos até hoje.
Curiosamente, os mesmos historiadores e sociólogos que, ainda nos dias de hoje,louvam os duvidosos feitos do mentiroso Inácio Correia Pamplona e acreditampiamente nas contradições e falsidades contidas na suposta carta da Câmara deTamanduá à Rainha (1793) são os mesmos que, entre outras alienações, ainda repetemas mesmas falsas contestações contra a informação dos 3.900 pares de orelhasimortalizada pelo historiador e genealogista, Pedro Taques de Almeida Pais Leme.Espero que com as informações aqui documentadas, os alunos e orientandos dessesobscurantistas se rebelem contra essa anencefalia crônica e os ensinem que não hádemérito em reconhecer os erros passados. Mesmo porque, depois da ConstituiçãoFederal de 1988, não há mais tolerância aos crimes de falsidade ideológica, falsa [p. 9 do pdf]