O reinado de Filipe III e a configuração das relações de poder político e dominium em perspectiva ibero-atlântica. XXVII Simpósio Nacional de História (Natal/RN) - 01/01/2013 de ( registros)
O reinado de Filipe III e a configuração das relações de poder político e dominium em perspectiva ibero-atlântica. XXVII Simpósio Nacional de História (Natal/RN)
rei e seu valido.11 Por esses motivos as juntas desrespeitavam diferentes aspectos do Tratadode Tomar e sofreram a oposição contumaz do vice-rei Cristóvão de Moura.O período do reinado de Filipe III, que vai de 1598 a 1603, deu início às reformaspolítico-jurídicas e político-econômicas, que tiveram seu ápice entre os anos de 1604 e 1614.Na Europa, a Coroa procurou assegurar um período de paz para que pudesse concentrar seusesforços nas reformas ultramarinas. No ano de 1604, foi acertado um tratado de paz hispanobritânico e, entre 1609 e 1621, foi definida a “Trégua dos Doze Anos” com as ProvínciasUnidas.Para o segundo período, em relação à composição do Conselho de Portugal, devemosdestacar a nomeação de Diego da Silva y Mendoza, o conde de Salinas, em 1605. Suanomeação provocou fortes tensões: além de ser castelhano, o rei lhe deu preeminência sobreJuan de Borja, posição que se consolidou depois da morte deste, em 1606. Mas seu filho,Carlos de Borja, conde de Ficalho, que assumiu o lugar do pai, queria ver restaurado oprestígio da família no Conselho, justificada também pela aquisição, por casamento, do títulode marquês de Villahermosa, que lhe dava um estatuto superior ao conde de Salinas. Manuelde Castelo Branco apoiou Carlos nessa querela, que durou até 1613, quando se reafirmou asprerrogativas régias na definição na organização política da monarquia.12Os protagonismos de Juan de Borja e de Diego da Silva no Conselho coincidem com oque Fernanda Olival chama de “exílio” de D. Cristóvão de Moura, que entre 1601-1603 e1608-1612 foi designado, contra a sua vontade, vice-rei de Portugal. Como observaremos emseguida esses foram os períodos-chave de intervenção da Coroa no Atlântico, particularmenteno que se refere à tentativa de apropriação do tráfico de escravos em Angola e a políticaindígena na América, assuntos despachados por ordem régia e a contragosto do Conselho daFazenda, da Mesa de Consciência e Ordens e do Desembargo do Paço.A reforma do Conselho de Portugal, de 1602, criou uma secretaria especializada nosassuntos do ultramar português que deu origem ao novo Conselho da Índia, que teve seuregimento redigido pelo Conselho de Portugal. O Conselho da Índia estava localizado em Lisboa, enquanto que o Conselho de Portugal despachava em Madri e, depois da transferênciada corte, em Valladolid. O Conselho da Índia centralizou as atribuições do poder real noultramar, tratando principalmente dos assuntos de governo e defesa, enquanto que as juntasdesenvolveram as inovações político-econômicas do período.13 O Conselho da Índia, apesarde seu breve funcionamento, representou uma inovação fundamental de centralização dasquestões ultramarinas e de maior controle régio sobre as mesmas, essa experiência políticoinstitucional deu as bases para a constituição do Conselho Ultramarino durante a dinastia dosBraganças.14Francisco da Luz esclarece que as consultas do Conselho da Índia seguiam na suamaioria sem o visto do vice-rei, o que mostra uma transformação no circuito dosrequerimentos. 15 Além da comunicação direta entre o rei, as juntas e o Conselho, osrequerimentos ultramarinos deviam seguir ao Conselho da Índia. Depois da apreciação peloConselho da Índia, as “consultas” eram enviadas para o Conselho de Portugal, em Valladolid.O rei e o valido, com o auxílio de ministros do Conselho de Estado, muitas vezes definiram aspautas e mesmo encaminharam as medidas a serem tomadas.Os conselhos mais antigos continuaram despachando assuntos ultramarinos,independentemente da instalação do novo organismo. Diante das reclamações desse último, orei, por meio de uma carta de 27 de dezembro de 1604, ampliou as prerrogativas do Conselhoda Índia. 16 O vice-rei, o bispo D. Pedro de Castilho, reclamou constantemente que os documentos referentes ao ultramar chegavam primeiro no Conselho. A criação do Conselhoda Índia contradiz a estrutura argumentativa de António M. Hespanha que procura opor osistema de conselhos ao sistema de juntas. A forma de apropriação das jurisdições dosdiferentes conselhos e sua concentração em um único órgão, que passa a centralizar quase atotalidade dos assuntos ultramarinos, representam a vontade de administração ativa e deinterferência no ultramar português; prática semelhante à das juntas. 17 Francisco da Luzdestaca a rapidez com que foi formado e se iniciaram os despachos do novo conselho.Os primeiros conselheiros nomeados foram Francisco Vaz Pinto 18 e SebastiãoBarbosa19. Para a presidência foi designado Fernão Teles de Meneses20; falecido em 1605, foisubstituído no ano seguinte por D. Francisco de Mascarenhas21. Os dois outros conselheirosforam Pedro de Mendonça Furtado e D. Francisco de Almeida. D. Francisco de Almeida, oprimeiro governador-geral de Angola, que foi preso pelos moradores com a conivência dosjesuítas que temiam o fim do sistema de amos e a vassalagem direta dos sobas ao rei.22 Umapessoa estratégica que conhecera na pele as articulações dos agentes coloniais no Atlântico e avinculação entre o tráfico de escravos africanos e a questão indígena no Brasil. Dentre ossecretários, vemos uma rápida substituição de Estevão da Gama por João Brandão Soares, atéa escolha de João da Costa; para completar o quadro do conselho, foi designado AntônioVelez. Em dezembro de 1608, o conselheiro Pedro de Mendonça Furtado foi substituído porJoão Furtado de Mendonça que, além da vasta experiência indiana, foi o segundo governadorgeral de Angola, cargo que esteve a frente durante sete anos, a contar de 1595. Vaz Pinto,nomeado para o Desembargo do Paço, foi substituído por Simão Soares de Carvalho em janeiro de 1611. Outro experiente servidor nas Índias, João Correia de Sousa, substituiu D.Francisco de Almeida em setembro de 1612, em razão de sua aposentadoria. Destaca-se apresença de dois antigos governadores de Angola, que também se relacionam às mudanças nacomposição do Conselho de Portugal, no asiento de escravos, na política indigenista nasÍndias de Castela e a de Portugal, reformas que se concentram entre os anos de 1608 e 1612.
Entre 1602 e 1605, a presença de ministros castelhanos foi crescente nos conselhos ejuntas que tratavam do ultramar português, muitos com passagem pela Casa de Contrataçãode Sevilha e pelo Conselho de Índias. Em agosto de 1605 (“Carta de Sua Majestade”. Valladolid, 13 de agosto de 1605) foi determinado que todos os secretários do Conselho da Índia fossem espanhóis, o que reforça a preocupação de coordenar as reformas do ultramar português com as experiências de governo das Índias Ocidentais e os interesses espanhóis.23
A nomeação e o despacho dos ofícios para o Atlântico português também foramdiscutidos ao mesmo tempo nos conselhos reais. Os candidatos indicados possuíam atuaçãono contexto da África atlântica e do Brasil. Muitos nomes foram indicados para ambos oslados do Atlântico e também foram feitos pedidos de mercê que revelam acomplementaridade deste espaço político-econômico.
Como Francisco de Carro, que depois de participar da conquista de Angola e prestar serviços no Brasil, era um dos candidatos para a capitania de Sergipe. 16 de novembro de 1605. In: AGS, SP, l. 1476, f. 63-64v. Na nomeação para o governo do Estado do Brasil, em 21 de abril de 1606, figura na lista o assentista do contrato de Angola, D. Gonçalo Coutinho. In: idem, f. 73-74v. Manoel de Sousa Coutinho, irmão de João Roiz (abreviatura para Rodrigues) Coutinho e Gonçalo, pedia do Rio de Janeiro o governo de Angola. 5 de junho de 1606. In: ibidem, f. 102-102v.
O maior controle sobre os funcionários régios passou a ser sentido e os pedidos de residência e devassa eram feitos ao mesmo tempo para o Brasil e Angola.25 A centralização do poder permitiu maior agilidade nos processos e uma ação mais consistente por parte da Coroa.
Ver as devassas que Belchior de Amaral tirou dos governadores-gerais do Brasil D. Diogo Botelho e D. Francisco de Sousa. 26 de julho de 1604. In: Biblioteca Nacional de Lisboa, Col. Pombalina 249, f. 205-206v. E 16 de agosto de 1605. In: AGS, SP, l. 1491, f. 225-225v. Para Angola ver “Treslado de uma carta de André Velho da Fonseca que foi ao Reino de Angola a diligências do serviço de sua majestade”. Luanda, 9 de dezembro de 1610. In: FELNER, A. de A. Angola. Coimbra: Imprensa da Universidade, 1933, p. 431-432. A Coroa chegou a enviar a residência do governador-geral de Angola, João Furtado de Mendonça, para D. Francisco de Sousa, no Brasil. “Despacho de 21 de julho de 1605”. In: AGS, SP, l. 1491, f. 208v.
A questão religiosa, no Brasil e na África Centro-Ocidental, foi tratada simultaneamente. A principal justificativa dos religiosos para se envolverem no governo temporal, tanto dos indígenas como dos africanos, era a insuficiência das esmolas e dos pagamentos reais para a sustentação das missões. Essa situação também fazia com que os [Páginas 4, 5, 6 e 7 do pdf]