O cargo de provedor-mor foi estabelecido pelo regimento de 17 de dezembro de 1548 para atuar como autoridade máxima da administração fazendária colonial, subordinado diretamente aos órgãos da metrópole, aos quais devia prestar contas. Sua criação foi justificada em razão das dificuldades encontradas no cumprimento da arrecadação das rendas e direitos reais, e o primeiro ocupante do cargo foi Antônio Cardoso de Barros, cavaleiro fidalgo da Casa Real.
Logo após a chegada dos primeiros portugueses no atual continente americano foram enviadas, em 1501, três expedições para o reconhecimento do litoral. Nesse mesmo ano, o território foi arrendado a um consórcio de comerciantes de Lisboa, visando desenvolver o comércio dos produtos encontrados, como o pau-brasil. Ainda nessa fase de reconhecimento e exploração costeira, foram estabelecidos os cargos de almoxarife e feitor, encarregados de arrecadar e fiscalizar as rendas reais e administrar as feitorias.
Em 1548, com a instalação de um governo-geral, a Coroa empreendeu uma tentativa de se impor de maneira mais efetiva na colônia, centralizando as atividades administrativas, judiciárias e fazendárias com a criação dos cargos de governador-geral, ouvidor-geral e provedor-mor.
Segundo o regimento de 17 de dezembro de 1548, o provedor detinha uma ampla gama de atribuições, voltadas para a implantação de mecanismos de arrecadação, a promoção da receita e controle das despesas, e a fiscalização das operações administrativas dos oficiais fazendários, das atividades econômicas coloniais e do armazenamento de armas e munições, exercendo também funções judiciais relativas às questões fazendárias. Suas atribuições específicas eram auxiliar o governador-geral em tudo que fosse necessário, acompanhando-o em suas visitas às capitanias; informar-se sobre os oficiais de Fazenda existentes em cada uma; fiscalizar os procedimentos realizados na arrecadação das rendas e direitos régios, e o cumprimento das recomendações sobre armazenamento das artilharias, armas e munições; tirar inquirição e fazer a devassa dos oficiais de Fazenda; ordenar a construção de alfândegas; mandar edificar casas onde se tratasse do negócio da Fazenda real e provedorias, com seus devidos livros de registros; mandar que os provedores enviassem, anualmente, ao tesoureiro-geral, certidão com os rendimentos e despesas, e cuidar para que os almoxarifes notificassem suas contas a cada cinco anos, decidindo sobre as possíveis dúvidas com os juízes (Regimento…, 1966, p. 271-278, Salgado, 1985, p. 155-156).
Na esfera judicial, o provedor-mor ficava encarregado de conhecer as apelações e agravos provenientes dos provedores das capitanias e de outros oficiais de Fazenda que ultrapassassem a quantia de dez mil-réis e, nos lugares onde estivesse, de conhecer as apelações e agravos a partir de dois mil-réis. Deveria também conhecer, por ação nova, no lugar onde estivesse e até cinco léguas ao redor, quaisquer causas relacionadas à Fazenda, desde que não tocasse ao procurador do rei, bem como avocar quaisquer feitos e causas tratadas pelas instâncias inferiores até dez mil-réis, e, acima desse valor, remeter os feitos para Bahia, onde deveria julgar com os juízes (Regimento…, 1966, p. 271-278; Salgado, 1985, p. 155-156).
Tinha ainda funções mais específicas, como dar licença para a construção de embarcações na ausência do governador-geral e definir a maneira como se deviam construir os navios para a defesa da costa. Outra atribuição era ordenar que em cada capitania houvesse um alealdador, que atuasse na alfândega, fazendo a avaliação do açúcar que deveria sair da colônia (Regimento…, 1966, p. 271-278; Salgado, 1985, p. 155-156).
Em 1577, o provedor-mor passou a ficar encarregado de proceder nos casos de descumprimento do regimento dos dízimos, promulgado após o rei ser informado que no Brasil não se pagava a dízima dos açúcares, algodões, mantimentos, criações e frutos.
Durante o período em que Portugal ficou sob o domínio espanhol, entre 1580 e 1640, algumas mudanças ocorreram na estrutura administrativa da metrópole. Em Portugal, foi criado o Conselho da Fazenda, em 1591, e, um pouco depois, em 1627, foi dado novo regimento à Casa dos Contos, com o objetivo de centralizar a contabilidade do Reino e domínios (Salgado, 1985, p. 37-41).
Na colônia, não houve alteração substancial na organização da administração fazendária, mas foram expedidos dois novos regimentos dirigidos ao cargo de provedor-mor. O primeiro, dado a Baltazar Roiz, em 12 de março de 1588, mantinha as atribuições do regimento de 1548, mas determinava maior rigor na tomada de contas dos oficiais de Fazenda e na cobrança de dívidas para a Fazenda real (Salgado, 1985, p. 86).
Ordenava ao provedor visitar as alfândegas para fiscalizar a arrecadação das rendas e direitos régios, verificando os livros de registros rubricados por ele ou pelo provedor de capitania, além de informar-se sobre o estabelecimento de provedorias em todas as capitanias, conferir os livros dos navios despachados para o Reino, averiguar o caderno de finanças do bispo, que continha relação das pessoas em dívida com a Fazenda, e cobrá-las.
Também mudava a quantia máxima das causas que o provedor podia conhecer, que seria determinada pelo regimento da Relação, e diminuía de cinco para três anos o prazo para a notificação dos almoxarifes (Regimento…, 1906b, p. 215-220). Logo em seguida, em 1591, foi dado outro regimento, a Baltazar Ferraz, que, manteve praticamente as mesmas disposições do regimento de 1588 (Salgado, 1985, p. 86).
Ainda no período da dominação espanhola, observou-se o estabelecimento de normas exclusivas para atividades produtivas coloniais, como os regimentos das terras minerais e do pau-brasil. Neste último, datado de 1605, havia determinações para o provedor-mor relacionadas à concessão de licença de autorização para o corte do pau-brasil; à declaração da quantidade da madeira a ser cortada, entre outras (Regimento…, 1972e, p. 363-365).
Alguns regimentos dirigidos aos ocupantes do cargo de governador-geral também continham competências para o provedor. O de Francisco Giraldes, de 8 de março de 1588, além de confirmar a função de auxiliar o governador-geral, tornava-o responsável por visitar as barreiras de bombarda e ver o treinamento dos bombardeiros, na ausência do governador-geral. O de Gaspar de Sousa, de 1612, mencionava, entre suas competências, verificar, anualmente, a folha da receita e despesa ordinárias do Estado do Brasil, passadas pelo governador-geral, incluindo-se as despesas extraordinárias.
Outro ato que fez referência ao provedor-mor foi o regimento do governador-geral d. Fernando Mascarenhas, conde da Torre, de 13 de agosto de 1638, emitido no contexto da guerra contra os holandeses que se encontravam instalados em Pernambuco. Este regimento, diferente dos outros, dava grande ênfase ao provimento das tropas e ao pagamento dos soldados, e incumbia o provedor de assistir à entrega do dinheiro e dos mantimentos vindos de Portugal para auxiliar na guerra contra os holandeses; fazer a matrícula dos oficiais e soldados que recebessem soldo da Fazenda Real; possuir um livro de ementas para lançar os nomes dos oficiais e soldados falecidos ou ausentes; estar presente ao pagamento da gente da guerra; tomar, anualmente, junto com o contador-geral, as contas dos oficiais da Fazenda, remetendo-as para a Casa dos Contos e o Conselho de Fazenda de Lisboa, e encaminhar aos armazéns reais de Lisboa o traslado da matrícula das pessoas que serviam no Brasil (Registo…, 1955, p. 187-209).
Após o fim do domínio espanhol, em 1640, as preocupações fiscais foram expostas novamente no regimento do governador-geral Roque da Costa Barreto, de 23 de janeiro de 1677. Segundo este documento, o provedor-mor ficava encarregado de auxiliar o governador-geral, junto com os governadores de capitanias, na arrematação dos contratos reais, bem como de estimular o crescimento das rendas, especialmente aquelas advindas da pesca de baleias, de cuidar da fiscalização das despesas das folhas secular, eclesiástica e militar, e da administração dos donativos e impostos, além de verificar as folhas de pagamento e assentar nos postos militares pessoas que atendessem aos requisitos exigidos (Regimento…, 1972c, p. 745-846; Salgado, 1985, p. 273).
Na segunda metade do século XVIII, com as reformas empreendidas pelo marquês de Pombal e o estabelecimento de uma política econômica fortemente fiscalista, foram iniciadas reformas administrativas de impacto na colônia. Nesse contexto, foi dado o último regimento conhecido ao provedor-mor, em 1752, que trazia competências específicas à administração das despesas das fragatas que aportavam na colônia (Regimento... 1752, p. 110-116; Salgado, 1985, p. 365-367).
Nesse mesmo período, se deu o estabelecimento de juntas da Real Fazenda subordinadas diretamente ao Erário Régio em Portugal, em substituição às antigas provedorias. Outras determinações envolveram a criação de órgãos ligados à produção de ouro e diamantes, e de novos mecanismos que visavam o fomento à produção agrícola, ao comércio e à indústria. Em 1770, o alvará de 3 de março extinguiu o cargo de provedor-mor, que teria suas competências absorvidas pelas juntas da Fazenda e pela Intendência da Marinha e Armazéns Reais, criada na Bahia nessa mesma data.
Angélica Ricci CamargoJan. 2014Fontes e bibliografiaALVARÁ de regimento para as propinas e salários dos oficiais da fazenda, alfândega e Senado da Câmara da cidade da Bahia de Todos os Santos, Estado do Brasil, de 15 de abril de 1709. Documentos Históricos, Rio de Janeiro, v. 80, p. 90-108, 1955.ARMAZÉM. In: INSTITUTO CAMÕES. Disponível em: https://goo.gl/TWRGjC. Acesso em: 9 nov. 2009.FALCON, Francisco José Calazans. A época pombalina: política econômica e monarquia ilustrada. São Paulo: Ática, 1982. (Ensaios, 83).REGIMENTO de Antônio Cardoso de Barros, provedor-mor da Fazenda, de 17 de dezembro de 1548. In: TAPAJÓS, Vicente. A política administrativa de d. João III. 2. ed. Rio de Janeiro: Departamento Administrativo do Serviço Público/Serviço de Documentação, 1966. p. 271-278. (História Administrativa do Brasil; 2).
REGIMENTO de Francisco Giraldes, de 30 de março de 1588. In: MENDONÇA, Marcos Carneiro de. Raízes da formação administrativa do Brasil. v. 1. Rio de Janeiro: Conselho Federal de Cultura, 1972a. p. 253-277.
REGIMENTO de Gaspar de Souza, de 6 de outubro de 1612. In: MENDONÇA, Marcos Carneiro de. Raízes da formação administrativa do Brasil. v. 1. Rio de Janeiro: Conselho Federal de Cultura, 1972b. p. 413-436.REGIMENTO de Roque da Costa Barreto dos governadores-gerais, de 16 de janeiro de 1677. In: MENDONÇA, Marcos Carneiro de. Raízes da formação administrativa do Brasil. v. 2. Rio de Janeiro: Conselho Federal de Cultura, 1972c. p. 745-846.
REGIMENTO do pau-brasil de 12 de dezembro de 1605. In: MENDONÇA, Marcos Carneiro de. Raízes da formação administrativa do Brasil. v. 1. Rio de Janeiro: Conselho Federal de Cultura, 1972d. p. 363-365.
REGIMENTO dos dízimos do Brasil, de 17 de setembro de 1577. In: MENDONÇA, Marcos Carneiro de. Raízes da formação administrativa do Brasil. v. 1. Rio de Janeiro: Conselho Federal de Cultura, 1972e. p. 223-241.REGIMENTO para o provedor-mor da Fazenda do Estado do Brasil, de 31 de outubro de 1752. Arquivo Nacional, Fundo Relação da Bahia, códice 539, v. 3, f. 110-116.REGIMENTO que foi dado ao licenciado Baltazar Ferraz para cobrar o que se deve à fazenda de sua Majestade, de 12 de fevereiro de 1591. In: RIHGB, Rio de Janeiro, Tomo 67, Parte 1, p. 237-241, 1906a.
REGIMENTO que se deu a Balthazar Roiz Soza, provedor-mor da Fazenda do Brasil, de 12 de março de 1588. Revista do IHGB, Rio de Janeiro, t. 67, parte I, p. 215-220, 1906b.
REGISTO de um traslado do regimento que a este Estado trouxe o conde da Torre dom Fernando Mascarenhas, tirado do próprio escrivão da Fazenda Real, que foi deste Estado Miguel Pinto de Freitas, de 13 de agosto de 1638. Documentos Históricos, Rio de Janeiro, v. 79, p. 187-209, 1955.SALGADO, Graça (coord.). Fiscais e meirinhos: a administração no Brasil colonial. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.SANCHES, Marcos Guimarães. “Todo o que toca ao aumento do serviço de Sua Majestade”. In: REUNIÃO DA SOCIEDADE BRASILEIRA DE PESQUISA HISTÓRICA, 26., 2006, Rio de Janeiro. Anais... Rio de Janeiro, 2006. Disponível em: www.sbph.org/reuniao/26/trabalhos/ Marcos_Guimaraes_Sanches/. Acesso em: 16 out. 2009.Documentos sobre este órgão podem ser encontrados nos seguintes fundos do Arquivo NacionalBR_RJANRIO_86 Secretaria do Estado do BrasilReferência da imagemSir Henry Chamberlain. Vistas e costumes da cidade e arredores do Rio de Janeiro em 1819-1820. Rio de Janeiro: Kosmos, 1943. Arquivo Nacional, OR_1985
O que é História?
Abraham Lincoln (1809-1865) dizia que "se não for verdade, não é História. Porém, é possível contar um monte de mentiras dizendo só a verdade.
Existiu um homem que pegou uma nação destruída, recuperou sua economia e devolveu o orgulho ao seu povo. Em seus quatro primeiros anos de governo, o número de desempregados caiu de 6 milhões para 900 mil pessoas. Este homem fez o produto interno bruto crescer 102% e a renda per capita dobrar, aumentou os lucros das empresas de 175 milhões para 5 bilhões de Marcos e reduziu uma hiperinflação, a no máximo 25% ao ano. Este homem adorava música e pintura e quando jovem imaginava a seguir a carreira artística. [28174] Você votaria neste homem Adolf Hitler (1889-1945)?
Quantos ou quais eventos são necessários para uma História? Segundo Aluf Alba, arquivista do Arquivo Naciona: o documento, ele começa a ser memória já no seu nascimento, e os documentos que chegam no Arquivo Nacional fazem parte de um processo, político e técnico de escolhas. O que vai virar arquivo histórico, na verdade é um processo político de escolhas, daquilo que vai constituir um acervo que vai ser perene e que vai representar, de alguma forma a História daquela empresa, daquele grupo social e também do Brasil, como é o caso do Arquivo Nacional.
É sempre um processo político de escolha, por isso que é tão importante termos servidores públicos posicionados, de pessoas preparadas para estarem atuando nesse aspecto.
Mary Del Priori, historiadora:
Nós temos leis aqui no Brasil, que são inclusive eu diria bastante rigorosas. Elas não são cumpridas, mas nós temos leis para arquivos municipais, estaduais e arquivos federais, que deveriam ser cobradas pela própria população, para manutenção desses acervos, acervos que estão desaparecendo, como vimos recentemente com o Museu Nacional e agora com a Cinemateca de São Paulo. E no caso dos arquivos municipais, esses são os mais fragilizados, porque eles tem a memória das pequenas cidades e dos seus prefeitos, que muitas vezes fazem queimar ou fazem simplesmente desaparecer a documentação que não os interessa para a sua posteridade. Então esse, eu diria que essa vigilância sobre o nosso passado, sobre o valor dos nossos arquivos, ainda está faltando na nossa população.
Lia Calabre, historiadora:
A memória de Josef Stálin inclusive, ela serve para que não se repitam os mesmos erros, ela serve para que se aprenda e se caminhe. Os processos constantes de apagamento. Existe um depósito obrigatório de documentação que não é feita, na verdade se a gente pensar, desde que a capital foi para Brasília, os documentos não vieram mais para o Arquivo Nacional. [4080]
Quantos registros?
Fernando Henrique Cardoso recupera a memória das mais influentes personalidades da história do país.
Uma das principais obras do barão chama-se "Efemérides Brasileiras". Foi publicada parcialmente em 1891 e mostra o serviço de um artesão. Ele colecionou os acontecimentos de cada dia da nossa história e enquanto viveu atualizou o manuscrito. Vejamos o que aconteceu no dia 8 de julho. Diz ele:
- Em 1691 o padre Samuel Fritz, missionário da província castelhana dos Omáguas, regressa a sua missão, depois de uma detenção de 22 meses na cidade de Belém do Pará (ver 11 de setembro de 1689).
- Em 1706 o rei de Portugal mandou fechar uma tipografia que funcionava no Recife.
- Em 1785 nasceu o pai do Duque de Caxias.
- Em 1827 um tenente repeliu um ataque argentino na Ilha de São Sebastião.
- Em 1869 o general Portinho obriga os paraguaios a abandonar o Piraporaru e atravessa esse rio.
- Em 1875 falece no Rio Grande do Sul o doutor Manuel Pereira da Silva Ubatuba, a quem se deve a preparação do extractum carnis, que se tornou um dos primeiros artigos de exportação daquela parte do Brasil.
Ainda bem que o barão estava morto em 2014 julho que a Alemanha fez seus 7 a 1 contra o Brasil.
(...) Quem já foi ministro das relações exteriores como eu trabalha numa mesa sobre a qual a um pequeno busto do barão. É como se ele continuasse lá vigiando seus sucessores.
Ele enfrentou as questões de fronteiras com habilidade de um advogado e a erudição de um historiador. Ele ganhava nas arbitragens porque de longe o Brasil levava a melhor documentação. Durante o litígio com a Argentina fez com que se localiza-se o mapa de 1749, que mostrava que a documentação adversária estava simplesmente errada.
Esse caso foi arbitrado pelo presidente Cleveland dos Estados Unidos e Rio Branco preparou a defesa do Brasil morando em uma pensão em Nova York. Conforme registrou passou quatro anos sem qualquer ida ao teatro ou a divertimento.
Vitorioso nas questões de fronteiras tornou-se um herói nacional. Poderia desembarcar entre um Rio, coisa que Nabuco provavelmente faria. O barão ouviu a sentença da arbitragem em Washington e quieto tomou o navio de volta para Liverpool. Preferia viver com seus livros e achava-se um desajeitado para a função de ministro.