A proibição da maconha é racista, consultado em cartacapital.com.br
Atualizado em 13/02/2025 06:42:31
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Não é exagero dizer que o racismo foi elemento central na história da proibição da maconha e, aqui no Brasil, o preconceito foi escancarado no próprio texto das leis. Nessa questão, nosso País ainda entrou para a história com um vergonhoso protagonismo na articulação pela criminalização da cannabis em escala global.Se um dia lançarem um livro para contar a história da proibição da maconha, o Brasil será citado logo nas primeiras páginas. Isso porque a primeira lei do mundo a criminalizar o uso da maconha, de 1830, é um produto da Câmara Municipal do Rio de Janeiro.Dizia o texto: “É proibida a venda e o uso do pito do pango, bem como a conservação dele em casas públicas. Os contraventores serão multados, a saber: o vendedor em 20$000, e os escravos e mais pessoas, que dele usarem, em três dias de cadeia”.Uma bravata comum desta época dizia que “maconha em pito faz negro sem vergonha”.Na política internacional, o Brasil tem contribuições importantes no lobby para proibição da maconha. A apresentação, em 1915, do médico Rodrigues Dória, no Segundo Congresso Científico Pan-americano, realizado nos Estados Unidos, escancara bem nossa posição.Na ocasião, o doutor Dória, médico renomado da Universidade Federal da Bahia, apresentou o estudo intitulado “Os fumadores de maconha: efeitos e males do vício”, indicando que a maconha foi introduzida no Brasil pelos negros escravizados, como sendo uma vingança da “raça subjugada” pelo roubo da liberdade.O médico também mirava o canhão do preconceito contra a utilização da maconha em rituais religiosos e alertava que a erva servia para “produzir alucinações e excitar os movimentos nas danças selvagens dessas reuniões barulhentas”.A legislação de drogas no século XXI não conta com este racismo explícito para justificar a criminalização de algumas drogas e a atual lei de drogas brasileira (11.343/06) foi precocemente celebrada por acabar com a pena de prisão para usuários.Infelizmente o resultado foi justamente o oposto, pois provocou um expressivo crescimento da população carcerária condenada por tráfico. O percentual de presos pelo crime no Brasil foi de 8,7% em 2005 para 32,6% da população carcerária em 2017.Difícil acreditar que este aumento seja resultado do sucesso das ações repressivas ou de um crescimento no número de braços trabalhando para o narcotráfico. Na verdade, as prisões tem sido ocupadas por usuários pobres, que não contam com auxílio jurídico para se defender do porte de pequenas quantidades de droga.E o pior é que isto ocorre com contribuição da lei que deveria acabar com a pena de prisão para usuários. O problema é que a lei determina a aplicação de critérios controversos para separar quem porta para uso pessoal daquele com intenções comerciais.Diz o texto da lei 11.343/06 que, para determinar se a droga se destinava a consumo pessoal, o juiz deve analisar a quantidade apreendida, o local da apreensão e o histórico de vida do acusado.Estes critérios podem servir para sentenciar por tráfico, com uma pena de 5 a 15 anos de prisão, o indivíduo preso em alguma região pobre, pelo simples fato do local ser dominado por traficantes. O juiz pode alegar que se ele estava naquele lugar, também deve trabalhar para o tráfico. A questão do histórico de vida é outra covardia. Neste caso, pode se aplicar a regra do “uma vez traficante, sempre traficante”.Prova deste modus operandi da política proibicionista consta na tese de mestrado de Orlando Zaccone, delegado de polícia do Rio de Janeiro.Zaccone analisou, no ano de 2005, registros de ocorrência envolvendo drogas em diversas delegacias da cidade do Rio de Janeiro e percebeu que a repressão muda de acordo com o perfil econômico dos bairros.Naquele ano, a 34ª DP (Bangu), um bairro de classe média baixa da Zona Oeste do Rio, registrou 186 flagrantes de tráfico. A 21ª DP (Bonsucesso), próxima aos Complexos do Alemão e da Maré, registrou 73 ocorrências de tráfico. Na parte mais abastada da cidade a 14ª DP (Leblon) registrou nove casos de tráfico e a 13ª DP (Ipanema) apenas cinco.A Barra da Tijuca, bairro famoso pelos condomínios de alto padrão, parece um território livre das drogas, já que apenas três traficantes foram presos pela delegacia da região ao longo de um ano.Não é possível afirmar, com base nestas estatísticas, que a periferia do Rio é dominada pelo tráfico e que os bairros mais ricos são ilhas de abstinência. Estes dados são resultado de uma ação seletiva do proibicionismo. Mais uma vez, o racismo e a divisão de classes são elementos centrais destas políticas públicas.O tráfico e o consumo de drogas são uma realidade dos becos das favelas e dos apartamentos milionários da orla. Entretanto, a realização de ações repressivas muda de maneira significativa de acordo com CEP onde ocorre a ação.A guerra às drogas nos bairros mais pobres é feita com Caveirão (aéreo e terrestre), entrada em residências sem preocupações com formalidades judiciais e um inaceitável saldo de mortes entre moradores e policiais. Quando a repressão ocorre nos bairros mais abastados, geralmente se respeita as normas para execução dos mandados de busca ou prisão, executadas no protocolar horário de seis horas da manhã e com o devido respeito à privacidade do acusado.Só o racismo e o preconceito contra os mais pobres explicam a adoção de uma estratégia de guerra às drogas que aponta as armas apenas para o lado mais desfavorecido da cidade.São raras as operações que buscam minar a estrutura do narcotráfico combatendo, por exemplo, a lavagem de dinheiro das drogas que é feita com a conivência de respeitáveis instituições financeiras.Não é por acaso que existe o estereótipo de traficante como um homem negro e morador de favela. Alguém parou para pensar que ele também pode ser alguém que usa terno bem cortado, é proprietário de um helicóptero e tem livre circulação na política institucional?
Registros mencionados
• outubro de 1830 Lei* Atualizado em 13/02/2025 06:42:31
O que é História?
Abraham Lincoln (1809-1865) dizia que "se não for verdade, não é História. Porém, é possível contar um monte de mentiras dizendo só a verdade.
Existiu um homem que pegou uma nação destruída, recuperou sua economia e devolveu o orgulho ao seu povo. Em seus quatro primeiros anos de governo, o número de desempregados caiu de 6 milhões para 900 mil pessoas. Este homem fez o produto interno bruto crescer 102% e a renda per capita dobrar, aumentou os lucros das empresas de 175 milhões para 5 bilhões de Marcos e reduziu uma hiperinflação, a no máximo 25% ao ano. Este homem adorava música e pintura e quando jovem imaginava a seguir a carreira artística. [28174] Você votaria neste homem Adolf Hitler (1889-1945)?
Quantos ou quais eventos são necessários para uma História? Segundo Aluf Alba, arquivista do Arquivo Naciona: o documento, ele começa a ser memória já no seu nascimento, e os documentos que chegam no Arquivo Nacional fazem parte de um processo, político e técnico de escolhas. O que vai virar arquivo histórico, na verdade é um processo político de escolhas, daquilo que vai constituir um acervo que vai ser perene e que vai representar, de alguma forma a História daquela empresa, daquele grupo social e também do Brasil, como é o caso do Arquivo Nacional.
É sempre um processo político de escolha, por isso que é tão importante termos servidores públicos posicionados, de pessoas preparadas para estarem atuando nesse aspecto.
Mary Del Priori, historiadora:
Nós temos leis aqui no Brasil, que são inclusive eu diria bastante rigorosas. Elas não são cumpridas, mas nós temos leis para arquivos municipais, estaduais e arquivos federais, que deveriam ser cobradas pela própria população, para manutenção desses acervos, acervos que estão desaparecendo, como vimos recentemente com o Museu Nacional e agora com a Cinemateca de São Paulo. E no caso dos arquivos municipais, esses são os mais fragilizados, porque eles tem a memória das pequenas cidades e dos seus prefeitos, que muitas vezes fazem queimar ou fazem simplesmente desaparecer a documentação que não os interessa para a sua posteridade. Então esse, eu diria que essa vigilância sobre o nosso passado, sobre o valor dos nossos arquivos, ainda está faltando na nossa população.
Lia Calabre, historiadora:
A memória de Josef Stálin inclusive, ela serve para que não se repitam os mesmos erros, ela serve para que se aprenda e se caminhe. Os processos constantes de apagamento. Existe um depósito obrigatório de documentação que não é feita, na verdade se a gente pensar, desde que a capital foi para Brasília, os documentos não vieram mais para o Arquivo Nacional. [4080]
Quantos registros?
Fernando Henrique Cardoso recupera a memória das mais influentes personalidades da história do país.
Uma das principais obras do barão chama-se "Efemérides Brasileiras". Foi publicada parcialmente em 1891 e mostra o serviço de um artesão. Ele colecionou os acontecimentos de cada dia da nossa história e enquanto viveu atualizou o manuscrito. Vejamos o que aconteceu no dia 8 de julho. Diz ele:
- Em 1691 o padre Samuel Fritz, missionário da província castelhana dos Omáguas, regressa a sua missão, depois de uma detenção de 22 meses na cidade de Belém do Pará (ver 11 de setembro de 1689).
- Em 1706 o rei de Portugal mandou fechar uma tipografia que funcionava no Recife.
- Em 1785 nasceu o pai do Duque de Caxias.
- Em 1827 um tenente repeliu um ataque argentino na Ilha de São Sebastião.
- Em 1869 o general Portinho obriga os paraguaios a abandonar o Piraporaru e atravessa esse rio.
- Em 1875 falece no Rio Grande do Sul o doutor Manuel Pereira da Silva Ubatuba, a quem se deve a preparação do extractum carnis, que se tornou um dos primeiros artigos de exportação daquela parte do Brasil.
Ainda bem que o barão estava morto em 2014 julho que a Alemanha fez seus 7 a 1 contra o Brasil.
(...) Quem já foi ministro das relações exteriores como eu trabalha numa mesa sobre a qual a um pequeno busto do barão. É como se ele continuasse lá vigiando seus sucessores.
Ele enfrentou as questões de fronteiras com habilidade de um advogado e a erudição de um historiador. Ele ganhava nas arbitragens porque de longe o Brasil levava a melhor documentação. Durante o litígio com a Argentina fez com que se localiza-se o mapa de 1749, que mostrava que a documentação adversária estava simplesmente errada.
Esse caso foi arbitrado pelo presidente Cleveland dos Estados Unidos e Rio Branco preparou a defesa do Brasil morando em uma pensão em Nova York. Conforme registrou passou quatro anos sem qualquer ida ao teatro ou a divertimento.
Vitorioso nas questões de fronteiras tornou-se um herói nacional. Poderia desembarcar entre um Rio, coisa que Nabuco provavelmente faria. O barão ouviu a sentença da arbitragem em Washington e quieto tomou o navio de volta para Liverpool. Preferia viver com seus livros e achava-se um desajeitado para a função de ministro.