Ê, camarás! De marginais a heróis. Fonte: saopaulo.sp.leg.br
Atualizado em 23/02/2025 12:08:35
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O motorista de ônibus aposentado Carlos Alberto Tavares, de 71 anos, está animado. Em instantes, vai começar a aula de afromix, atividade física que une elementos da capoeira e de outras danças. “A gente se sente bem e pode até comer à vontade que não engorda”, diz o aluno, que participa regularmente da atividade.Já Márcia Valeska conta que seus alunos, e ela mesma, saem com mais disposição das aulas de afromix e de capoeira. “Todo mundo pode fazer”, garante a professora, que gostaria de ver mais mulheres e crianças jogando capoeira, sendo “camarás”, como os praticantes também são conhecidos.Tanto a afromix quanto a capoeira são atividades disponíveis na Casa da Capoeira de Campo Belo, inaugurada pela Prefeitura de São Paulo em dezembro do ano passado, no Parque Invernada, na zona sul. No espaço também há aulas de maculelê e de artesanato afrobrasileiro, além de festas. Todas as atividades são gratuitas. A inscrição pode ser feita na hora.A Casa da Capoeira, administrada pela Secretaria Municipal de Esportes e Lazer, é um galpão com um palco, cadeiras e, principalmente, muito espaço para as atividades. Na frente, fica um pátio onde também se pode jogar capoeira. A entrada chama a atenção por homenagear o berimbau, instrumento musical muito usado para dar ritmo aos movimentos.“A mãe Capoeira precisava de um local, ela é a mãe de todos nós”, diz Adenilson Silva Alves, o mestre Tico, coordenador da Casa. “Agora os capoeiristas podem ir embora, mas a Casa da Capoeira fica”, comemora. Alves pretende organizar no local encontros com capoeiristas do mundo todo. “Isto aqui já é um sucesso”, garante.A Casa da Capoeira foi criada para divulgar e valorizar a prática da dança, com o objetivo de “formar indivíduos aptos a disseminar a importância histórica dessa expressão cultural que mistura luta, dança, cultura popular e a música”, segundo a lei 17.588, aprovada em 2021 pela Câmara Municipal de São Paulo (CMSP).Na lei, também consta que “o acervo da Casa da Capoeira será composto dos mais diversos materiais relativos à produção de peças, pesquisas, criação e produção de objetos relativos à modalidade, objetos históricos, artísticos, fotográficos, gastronômicos, e qualquer forma de expressão que contribua para a preservação da capoeira”.Na justificativa do projeto que deu origem ao espaço, os vereadores Dr. Sidney Cruz (Solidariedade), Elaine do Quilombo Periférico (PSOL), Faria de Sá (PP), Felipe Becari (PSD) e Marcelo Messias (MDB) afirmam que “diante de uma história de resistência e luta e do importante reconhecimento que a modalidade alcançou, faz-se necessária a criação da Casa que abrigará e imortalizará todo um legado deste povo guerreiro e vencedor”.Messias conta que apoiou a ideia da Casa por causa da importância da capoeira, principalmente para os jovens. “Ensina disciplina e respeito aos mais velhos, além de fazer parte da cultura brasileira”, diz o vereador à Apartes. Ele se lembra que na juventude, quando morava na Capela do Socorro, zona sul da cidade, via os vizinhos jogando capoeira, queria participar do jogo, mas não podia porque tinha de trabalhar. “Agora a juventude tem um local para praticar a capoeira”, comemora.O projeto foi apresentado inicialmente em 2020 pelo então vereador Ricardo Nunes (MDB), atual prefeito de São Paulo. No ano seguinte, os cinco parlamentares reapresentaram a proposta.LUTA HISTÓRICAA capoeira foi criada pelos negros escravizados como uma forma de resistência. O mestre capoeirista Anande das Areias, em seu livro O que é capoeira, definiu a atividade como “música, poesia, festa, brincadeira, diversão e, acima de tudo, uma forma de luta, manifestação do povo, do oprimido e do homem em geral para sobreviver e lutar contra qualquer tipo de opressão”.O mestre explica a origem da luta: os negros escravizados se inspiraram na natureza, nas brigas dos bichos, em que usavam cabeçadas, coices, saltos e botes. Além disso, foram utilizadas as estruturas das manifestações culturais (brincadeiras e competições) trazidas da região de Angola, no Oeste da África, onde eram praticadas em cerimônias religiosas. Assim, criaram a luta nos séculos 17 e 18.Segundo historiadores, provavelmente o nome originou-se porque a atividade era praticada na capoeira, palavra de origem tupi que designa a vegetação de arbustos surgida após a derrubada da mata original. Existe também a hipótese de que a origem da palavra tenha sido um cesto que os negros escravizados carregavam na cabeça.As primeiras imagens conhecidas da capoeira são do começo do século 19. Por volta de 1825, o inglês Augustus Earle pintou a aquarela Negros lutando. Na obra, um policial se aproxima para acabar com a briga. Na mesma época, o alemão Johann Moritz Rugendas fez a gravura Jogar capoeira – dança da guerra. Nela a cena é mais festiva, com homens e mulheres tocando instrumentos e batendo palmas enquanto observam os capoeiristas.Na cidade de São Paulo, desde o século 19 há registros da prática. E da repressão das autoridades aos capoeiristas. O historiador Pedro Figueiredo Alves da Cunha, em seu livro Capoeiras e valentões na história de São Paulo, conta que, em 1829, um estudante, que preferiu não se identificar, enviou uma carta ao jornal O Farol Paulistano acusando o professor de francês Augusto da Silveira Pinto de “jogar capoeira no Largo do Chafariz, servindo de espetáculo aos negros, que quando o veem dar bem uma cabeçada, o aplaudem com bastantes assobios, palmas e gargalhadas”.
Segundo Cunha, os conflitos entre os capoeiras (como também eram chamados os capoeiristas), muitas vezes com navalhas, e o receio de que os negros escravizados se rebelassem levaram o presidente da Província de São Paulo, Rafael Tobias de Aguiar, a solicitar que a Câmara de Vereadores da capital tomasse providências para coibir que os negros escravizados praticassem “o jogo vulgarmente chamado capoeira quando vão às fontes e a outros lugares em que se costumam ajuntar”. Segundo o presidente, isso dava origem a “muitas desordens entre gente tão bárbara e imorigerada” (devassa).
Assim, em 14 de janeiro de 1833, os parlamentares estabeleceram uma norma: “toda pessoa que, nas praças, ruas ou em qualquer lugar público, praticar o jogo denominado ‘de capoeiras’, ou de qualquer outro gênero de luta, sendo livre será presa por três dias e pagará a multa de 1 a 3 mil réis”. No caso de cativos, a determinação era prisão por 24 horas e pena de 25 a 50 açoites.
Apesar da perseguição, a capoeira ganhava praticantes em São Paulo. E não só entre os negros. Cunha relata que, na Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, estudantes que depois se tornariam políticos e juízes treinavam a luta, equiparando-a ao boxe inglês.“PERIGOSO ESPORTE”A chegada da República, em 1889, não mudou a perseguição aos capoeiristas. O primeiro Código Penal do Brasil republicano, de 1890, determinava a prisão de dois a seis meses para quem fizesse “nas ruas e praças públicas exercícios de agilidade e destreza corporal conhecidos pela denominação capoeiragem”. A lei ressaltava que era circunstância agravante pertencer o capoeira a alguma “banda ou malta” (quadrilha, na linguagem atual) e que para os chefes a pena seria em dobro.Mas a dança-luta continuava vencendo brigas. Em 1908, o jornal Correio Paulistano já considerava a capoeira “um esporte”, mas com uma ressalva: “um perigoso esporte”.Com o passar do tempo, a perseguição foi diminuindo. No Código Penal seguinte, de 1940, a capoeira não era mais considerada crime. Em 1953, o presidente do Brasil na época, Getúlio Vargas, assistiu em Salvador (BA) a uma apresentação do mestre Bimba, foi fotografado com os capoeiristas e declarou: “A capoeira é o único esporte verdadeiramente nacional”.Desde a década de 20, Manuel dos Reis Machado, o mestre Bimba, esforçava-se para tirar a capoeira da marginalidade. Em 1932, fundou em Salvador a primeira academia da luta no Brasil: a Academia-Escola de Cultura Regional. O nome capoeira ainda não podia aparecer. Com a foto de Vargas, o jogo ganhou mais força e prestígio.O reconhecimento da importância da capoeira veio no âmbito municipal, nacional e até internacional. Em 1985, a CMSP instituiu o Dia do Capoeirista, celebrado em 3 de agosto. Em 2008, o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) declarou a roda de capoeira um bem cultural. Seis anos depois, em 2014, foi a agência da ONU para Educação, Ciência e Cultura (Unesco) que estabeleceu a roda de capoeira como patrimônio imaterial da humanidade por representar “a resistência negra no Brasil durante a escravidão”.Atualmente, a capoeira é praticada nas rodas de São Paulo e de outras cidades em cerca de 150 países, dando rabos de arraia e rasteiras no preconceito. Salve, camarás!Edição: Sândor Vasconcelos sandor@saopaulo.sp.leg.br
O que é História?
Abraham Lincoln (1809-1865) dizia que "se não for verdade, não é História. Porém, é possível contar um monte de mentiras dizendo só a verdade.
Existiu um homem que pegou uma nação destruída, recuperou sua economia e devolveu o orgulho ao seu povo. Em seus quatro primeiros anos de governo, o número de desempregados caiu de 6 milhões para 900 mil pessoas. Este homem fez o produto interno bruto crescer 102% e a renda per capita dobrar, aumentou os lucros das empresas de 175 milhões para 5 bilhões de Marcos e reduziu uma hiperinflação, a no máximo 25% ao ano. Este homem adorava música e pintura e quando jovem imaginava a seguir a carreira artística. [28174] Você votaria neste homem Adolf Hitler (1889-1945)?
Quantos ou quais eventos são necessários para uma História? Segundo Aluf Alba, arquivista do Arquivo Naciona: o documento, ele começa a ser memória já no seu nascimento, e os documentos que chegam no Arquivo Nacional fazem parte de um processo, político e técnico de escolhas. O que vai virar arquivo histórico, na verdade é um processo político de escolhas, daquilo que vai constituir um acervo que vai ser perene e que vai representar, de alguma forma a História daquela empresa, daquele grupo social e também do Brasil, como é o caso do Arquivo Nacional.
É sempre um processo político de escolha, por isso que é tão importante termos servidores públicos posicionados, de pessoas preparadas para estarem atuando nesse aspecto.
Mary Del Priori, historiadora:
Nós temos leis aqui no Brasil, que são inclusive eu diria bastante rigorosas. Elas não são cumpridas, mas nós temos leis para arquivos municipais, estaduais e arquivos federais, que deveriam ser cobradas pela própria população, para manutenção desses acervos, acervos que estão desaparecendo, como vimos recentemente com o Museu Nacional e agora com a Cinemateca de São Paulo. E no caso dos arquivos municipais, esses são os mais fragilizados, porque eles tem a memória das pequenas cidades e dos seus prefeitos, que muitas vezes fazem queimar ou fazem simplesmente desaparecer a documentação que não os interessa para a sua posteridade. Então esse, eu diria que essa vigilância sobre o nosso passado, sobre o valor dos nossos arquivos, ainda está faltando na nossa população.
Lia Calabre, historiadora:
A memória de Josef Stálin inclusive, ela serve para que não se repitam os mesmos erros, ela serve para que se aprenda e se caminhe. Os processos constantes de apagamento. Existe um depósito obrigatório de documentação que não é feita, na verdade se a gente pensar, desde que a capital foi para Brasília, os documentos não vieram mais para o Arquivo Nacional. [4080]
Quantos registros?
Fernando Henrique Cardoso recupera a memória das mais influentes personalidades da história do país.
Uma das principais obras do barão chama-se "Efemérides Brasileiras". Foi publicada parcialmente em 1891 e mostra o serviço de um artesão. Ele colecionou os acontecimentos de cada dia da nossa história e enquanto viveu atualizou o manuscrito. Vejamos o que aconteceu no dia 8 de julho. Diz ele:
- Em 1691 o padre Samuel Fritz, missionário da província castelhana dos Omáguas, regressa a sua missão, depois de uma detenção de 22 meses na cidade de Belém do Pará (ver 11 de setembro de 1689).
- Em 1706 o rei de Portugal mandou fechar uma tipografia que funcionava no Recife.
- Em 1785 nasceu o pai do Duque de Caxias.
- Em 1827 um tenente repeliu um ataque argentino na Ilha de São Sebastião.
- Em 1869 o general Portinho obriga os paraguaios a abandonar o Piraporaru e atravessa esse rio.
- Em 1875 falece no Rio Grande do Sul o doutor Manuel Pereira da Silva Ubatuba, a quem se deve a preparação do extractum carnis, que se tornou um dos primeiros artigos de exportação daquela parte do Brasil.
Ainda bem que o barão estava morto em 2014 julho que a Alemanha fez seus 7 a 1 contra o Brasil.
(...) Quem já foi ministro das relações exteriores como eu trabalha numa mesa sobre a qual a um pequeno busto do barão. É como se ele continuasse lá vigiando seus sucessores.
Ele enfrentou as questões de fronteiras com habilidade de um advogado e a erudição de um historiador. Ele ganhava nas arbitragens porque de longe o Brasil levava a melhor documentação. Durante o litígio com a Argentina fez com que se localiza-se o mapa de 1749, que mostrava que a documentação adversária estava simplesmente errada.
Esse caso foi arbitrado pelo presidente Cleveland dos Estados Unidos e Rio Branco preparou a defesa do Brasil morando em uma pensão em Nova York. Conforme registrou passou quatro anos sem qualquer ida ao teatro ou a divertimento.
Vitorioso nas questões de fronteiras tornou-se um herói nacional. Poderia desembarcar entre um Rio, coisa que Nabuco provavelmente faria. O barão ouviu a sentença da arbitragem em Washington e quieto tomou o navio de volta para Liverpool. Preferia viver com seus livros e achava-se um desajeitado para a função de ministro.